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Na semana passada, gregos fizeram várias manifestações contra o arrocho exigido por credores e pela União Europeia | Louisa Gouliamaki/AFP
Na semana passada, gregos fizeram várias manifestações contra o arrocho exigido por credores e pela União Europeia| Foto: Louisa Gouliamaki/AFP
  • Em 2002, argentinos saíram às ruas contra o bloqueio dos depósitos

A Grécia caminha para desbancar a Argentina e assumir o posto de maior calote soberano do mundo. Guardadas as diferenças entre as duas situações, a dívida grega a ser reestruturada ronda 200 bilhões de euros, bem mais que os 60 bilhões de euros (US$ 82 bilhões) do default argentino, em 2005. Além do volume maior na dívida total em reestruturação, os investidores também devem ter perda líquida mais expressiva no caso do país europeu, segundo projeções de analistas.

Ao contrário da Argentina, no entanto, a Grécia passou por um longo processo de renegociação com os credores privados. A Argentina partiu para um calote forçado da dívida logo no primeiro momento, em 2001, e só chamou os credores para uma renegociação seguida de reestruturação anos depois, em 2005 – o default mais longo da história mundial até o momento. Entretanto, as tratativas da Grécia com seus credores podem não ser suficientes para evitar o default formal.

Comparação

Os dois países ofereceram na operação de troca alguns títulos atrelados ao desempenho da economia. Isso significa que parte da remuneração dos investidores varia conforme o desempenho do PIB. De forma geral, se a atividade interna melhorar, os credores recebem mais, e vice-versa. O banco Barclays Capital avalia, entretanto, que as condições desses títulos são piores no caso grego.

Para calcular a perda líquida dos investidores, bancos como o Barclays Capital e o Credit Suisse usaram uma taxa de desconto de 12%, maior que a considerada pelo Instituto Internacional de Finanças (o IIF, que reúne os principais bancos do mundo), de 9%. O resultado é um desconto final de 74% no caso da Grécia, acima dos 73% impostos pela operação da Argentina.

"As perdas para os investidores no caso da Grécia, assumindo que nossa taxa de desconto estará próxima do nível pós-reestruturação, podem ser ainda mais penosas [que as da Argentina]", afirmam os analistas Cagdas Aksu e Donato Guarino, do Barclays Capital, em relatório enviado a clientes. Eles lembram que, até então, o calote argentino era considerado o mais grave já existente, com um dos índices de participação mais baixos do mundo emergente, de 76%.

O diretor da consultoria Exclusive Analysis para a Amé­rica Latina, Carlos Caicedo, acredita que a reestruturação imposta pela Argentina é o caso a ser comparado com o da Grécia, e não a reestruturação de dívidas latino-americanas trazidas pelo Plano Brady no fim da década de 1980. "A solução argentina foi mais radical que o Plano Brady, mas funcionou mais rápido porque um ano depois o país já estava crescendo", disse.

Entretanto, Caicedo lembra que a Argentina se beneficiou da desvalorização cambial trazida pela crise, pois tem uma base de exportação agrícola e produtiva, caso que não se aplica à Grécia – na zona do euro, o país não tem flexibilidade cambial e, mesmo que deixe a união monetária, importa produtos básicos, como alimentos.

Em compensação, a Argen­tina estava sozinha ao anunciar unilateralmente seu default, enquanto a Grécia conta com o apoio da União Europeia, que formula um segundo pacote de resgate, de 130 bilhões de euros. "O default da Grécia é maior que o da Argentina, mas a Grécia tem ajuda", disse Wilber Colme­raruer, sócio da consultoria Brazil Funding, em Londres.

País depende de 75% dos credores para não haver default desordenado

A Grécia precisa de adesão de pelo menos 90% do valor nominal da dívida privada para levar adiante sua reestruturação de forma voluntária. Analistas acreditam que o país não conseguirá esse patamar mínimo e partirá para um processo forçado ao usar as cláusulas de ação coletiva (CACs), que disparam os contratos de swaps de default de crédito (CDSs). Até então, acreditava-se que as CACs só seriam utilizadas com um patamar bem menor de adesão, inferior a 70%.

A nova visão vem da análise dos detalhes da oferta anunciados na sexta-feira. Analistas concluíram que o país forçará o default se a aceitação ficar entre 75% e 90%. Abaixo dos 75%, a reestruturação não acontece e, consequentemente, a Grécia não recebe o segundo pacote de resgate da União Europeia, de 130 bilhões de euros – a reorganização da dívida é pré-requisito para o socorro.

Nesse caso, o governo grego não teria como arcar com o vencimento de 14,5 bilhões de euros no próximo dia 20 de março e entraria num calote desordenado, ainda pior. "É uma forma de pressionar os investidores a aceitarem", diz Achilleas Georgolopoulos, estrategista de dívida do Lloyds Bank. "Não está escrito no comunicado, mas essa é a interpretação."

Apesar do otimismo demonstrado pelo diretor executivo do IIF e principal negociador, Charles Dallara, especialistas não contam com a adesão de 90%, mas avaliam que ela será superior a 75%, suficiente para que a reestruturação seja concluída, ainda que de maneira imposta – nesse caso, a Grécia acionará as CACs e forçará a reestruturação, configurando um default formal. Para os especialistas do Credit Suisse, haverá o chamado "evento de crédito", que irá disparar os CDS, no dia 9 de março, quando a Grécia anunciará os resultados da oferta. "O piso mínimo para o uso das CACs deve ser atingido", escrevem os analistas do banco.

A Grécia pretende emitir três tipos de títulos na oferta de troca: bônus de 30 anos sob a legislação inglesa, com juros de 2% até 2015, 3% até 2020 e 4,3% a partir daí; uma nota de 24 meses emitida pelo fundo de resgate europeu (EFSF, na sigla em inglês); e os títulos ligados ao desempenho da economia, que pagarão, a partir de 2015, rendimentos conforme os resultados do PIB. A existência desses papéis "variáveis" impede o cálculo exato da perda líquida aos credores, mas as projeções variam entre 70% e 75%.

Os credores têm até 8 de março para manifestar se querem trocar seus títulos pelos novos papéis a serem emitidos pelo país. No dia seguinte, a Grécia anuncia os resultados da operação que, se bem sucedida, será concluída em 12 de março.

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