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Aquecimento econômico é uma das causas

O governo Kirchner tenta abafar as preocupações com a inflação apresentando dados de crescimento da economia, que avança num ritmo chinês – alavancada, principalmente, pelo alto preço da soja. A Casa Rosada também afirma que o país vive uma explosão de consumo, e aponta o volume recorde de vendas de automóveis no mercado doméstico, além de demonstrar que protege o país com a manutenção de grandes reservas internacionais.

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Manipulação começou há 4 anos

No início de 2007, o governo de Néstor Kirchner – que morreu no ano passado e foi o antecessor de sua esposa, Cristina, na Casa Rosada – começou a manipular dados da agência oficial de estatísticas. Quem faz a acusação é Martín Redrado, ocupante, na época, do cargo de presidente do Banco Central da Argentina.

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Buenos Aires - Damian Vásquez costumava atualizar o preço dos produtos de limpeza na placa em frente à sua loja, em Buenos Aires. Atual­mente ele não se dá a esse trabalho. A inflação tem feito os preços subirem tão depressa que o comerciante se cansou do esforço para mantê-los em dia. "Quando os preços se estabilizam um pouco, eu até volto a escrevê-los. Mas ultimamente eles variam quase toda semana", explica Vásquez, 27 anos.

A inflação – que durante décadas foi um ponto fraco da economia argentina – está novamente em alta no país. Econo­mistas independentes estimam que ela tenha atingido entre 25% e 30% em 2010, o nível mais alto desde a catastrófica desvalorização cambial de 2002, quando a economia da Argentina entrou em parafuso.

O problema começa a ser sentido pelos mais pobres. A alta no preço dos alimentos já ultrapassou reajustes salariais do ano passado, levando os argentinos a comprar menos alimentos, dizem analistas. Além disso, parte da classe média e dos mais ricos passou a depender mais do cartão de crédito, o que fez subir o endividamento pessoal.

Quase ninguém acredita em um retorno da hiperinflação que corroeu a Argentina nos anos 1970 e 1980 – uma época em que, muitas vezes, os lojistas tinham de remarcar os preços a cada hora –, mas ainda assim a atual inflação não dá sinais de trégua e levanta dúvidas sobre a eficácia da "inclusão social" alardeada pela presidente Cristina Kirchner, que deve tentar a reeleição em outubro.

O bicho da inflação voltou a erguer a cabeça em toda a América Latina. O Brasil, que foi assolado com uma hiperinflação de mais de 2.000% no recente ano de 1994, vê suas autoridades cada vez mais preocupadas com uma taxa que pode ultrapassar os 5,5% neste ano. Na Venezuela, a inflação está em 27,2%, de acordo com o banco central do país – o índice mais elevado do subcontinente – e o presidente Hugo Chávez culpa os "especuladores" pela alta nos preços.

Barulho político

Na Argentina, a questão entrou com força no debate político. Cristina Kirchner insiste que a inflação não é um problema, mesmo com as fortes evidências, apresentadas por economistas do setor privado e por autoridades locais, de que a agência nacional de estatísticas do governo vem maquiando os índices de preços e de pobreza há quatro anos.

A inflação de 10,9% divulgada pelo governo é menos da metade daquela calculada por empresas como a Ecolatina, que estimou a taxa anual em 26,6% num relatório do início do ano. Os 12% oficiais de índice de pobreza também estão muito abaixo das estimativas independentes, que apontam para algo em torno dos 30%.

O ministro da Economia, Amado Boudou, declarou em novembro que a inflação era um problema "da classe média alta" e culpou as companhias pelo reajuste nos preços. "A inflação não é um tema de grandes proporções para uma grande parcela da população argentina", disse Boudou em entrevista a uma rádio. Para vários analistas e pesquisadores, no entanto, a elevação no preço de alimentos e roupas afeta os pobres com mais força, especialmente aqueles que vivem na informalidade – segmento em que 40% dos argentinos levam a sua vida profissional. "É óbvio que a inflação pesa mais sobre os argentinos que têm uma renda fixa, ainda mais aqueles que atuam na economia informal, que não têm um sindicato para defender seus interesses", diz Sergio Berensztein, cientista político da consultoria Poliarquia.

Mesmo com o governo argentino exibindo a taxa de 9,5% de crescimento da economia em 2010, os economistas apontam que a pobreza ultrapassou os 30% da população do país, nível mais alto desde a crise de 2001-02, quando o índice bateu em mais de 50%. "A quantidade de pobres é mais preocupante hoje do que nos piores momentos dos anos 1990. Sem dúvida, a inflação está fazendo a pobreza crescer na Argentina", conclui o ex-ministro da Economia Domingo Cavallo.

Tradução: João Paulo Pimentel

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