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Dino suspende “jabuti” em projeto de benefícios fiscais; ministro vê risco de orçamento secreto

Flávio Dinosuspende "jabuti"
Flávio Dino, ministro do STF, concede liminar para suspender "jabuti" de projeto de benefícios fiscais. (Foto: Bruno Peres/Agência Brasil)

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Atendendo a pedidos de parlamentares de esquerda e da Rede Sustentabilidade, o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar para suspender preventivamente os efeitos de um artigo do projeto de lei que reduz benefícios fiscais, por enxergar indícios de que o dispositivo tenta reabrir espaço para a execução de recursos do chamado orçamento secreto. A liminar determina a suspensão dos efeitos do artigo caso a lei venha a ser sancionada e ainda será submetida ao plenário do STF.

Segundo estimativas, o artigo abre brecha para o pagamento de cerca de R$ 1 bilhão desse tipo de verba parlamentar, considerada inconstitucional pelo STF em 2022 por falta de transparência, critérios objetivos e controle público. No total, o dispositivo pode permitir a liberação de até R$ 1,9 bilhão em emendas de anos anteriores.

O projeto, considerado crucial para a execução do Orçamento de 2026, foi aprovado nesta semana pelo Congresso Nacional e aguarda sanção presidencial. O artigo questionado, no entanto, foi incluído como um “jabuti” durante a tramitação na Câmara dos Deputados e teve papel relevante para vencer resistências parlamentares à proposta.

O trecho suspenso autoriza a revalidação de restos a pagar não processados inscritos desde 2019, inclusive valores já cancelados, permitindo sua liquidação até o fim de 2026. Na avaliação preliminar de Flávio Dino, o dispositivo viabiliza o pagamento de “montantes expressivos” remanescentes das emendas de relator (RP-9), denominação técnica do que ficou conhecido como orçamento secreto.

Ao analisar o pedido, Dino afirmou que restos a pagar regularmente cancelados deixam de existir no plano jurídico e que sua revalidação não configura simples retomada de situação anterior, mas, na prática, cria nova autorização de gasto sem respaldo em lei orçamentária vigente.

“A mesma lógica constitucional de contenção deve incidir, com rigor, sobre tentativas de reativação de recursos oriundos de emendas parlamentares à margem do ciclo orçamentário regular. Vale dizer: os 3 Poderes estão diante do inadiável dever de cumprir os ditames constitucionais da Responsabilidade Fiscal, para que haja fidelidade à ética no exercício dos cargos mais elevados da República”, disse Dino na decisão.

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Para o ministro, o expediente rompe a lógica do sistema constitucional das finanças públicas, viola o princípio da anualidade orçamentária e compromete a segurança jurídica, ao tornar imprevisível o encerramento das obrigações do Estado.

“É importante sublinhar que restos a pagar regularmente cancelados deixam de existir no plano jurídico. A sua revalidação não implica o simples restabelecimento de situação pretérita, mas equivale, na prática, à criação de nova autorização de gasto, desprovida de lastro em lei orçamentária vigente”, afirmou Dino.

O ministro identificou no "jabuti" possível vício formal de iniciativa, por entender que o dispositivo trata de execução orçamentária e gestão financeira, temas cuja iniciativa legislativa é reservada ao chefe do Poder Executivo.

Está em curso no STF um plano de trabalho aprovado no âmbito da ADPF 854 para enfrentar distorções do orçamento secreto, sem qualquer previsão de “ressuscitação” de restos a pagar. Segundo Dino, isso evidencia o descompasso do projeto com os parâmetros já pactuados entre os Três Poderes.

Jabuti integra projeto fundamental para superávit primário

O projeto de lei em questão reduz benefícios fiscais e aumenta a tributação de apostas eletrônicas (bets), fintechs e da distribuição de Juros sobre Capital Próprio (JCP). A proposta é considerada essencial para fechar as contas públicas de 2026, ano em que o governo terá de perseguir uma meta de superávit primário de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), o equivalente a R$ 34,3 bilhões. A expectativa inicial é de arrecadação em torno de R$ 20 bilhões.

O corte linear de 10% sobre incentivos tributários começará a valer já no próximo ano. Ficam fora da redução os benefícios previstos na Constituição, como a Zona Franca de Manaus e o Simples Nacional.

Durante a tramitação, a Câmara alterou a proposta original para empresas do regime de lucro presumido, prevendo que a redução dos incentivos só se aplique às companhias com faturamento superior a R$ 5 milhões por ano, em vez do limite de R$ 1,2 milhão defendido pelo governo.

Os deputados também retiraram do texto as mudanças relativas à desoneração da folha de pagamento, que segue um calendário próprio, e os benefícios voltados a políticas industriais dos setores de tecnologia da informação e semicondutores.

Com essas alterações, a expectativa de arrecadação caiu de R$ 19,9 bilhões para R$ 17,5 bilhões, perda que, segundo o governo, deverá ser compensada pelo aumento da tributação sobre bets, fintechs e JCP.

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