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Felipe Tezelli , do Big Bear, cansou da estrada e assumiu loja física enquanto seu food  truck roda o Brasil. | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Felipe Tezelli , do Big Bear, cansou da estrada e assumiu loja física enquanto seu food truck roda o Brasil.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

No auge do movimento dos food trucks nas cidades brasileiras, em 2015, o empresário Murilo Bizinelli, de Curitiba, inaugurou o Hot Bizinelli, especializado em sanduíches artesanais com foco na carne de porco. O veículo circulava por eventos privados, festas, bares e casas noturnas de Curitiba, além do interior do Paraná e litoral de Santa Catarina. Chegava a comercializar 5 mil refeições por mês, alcançando um faturamento de R$ 500 mil no período. Assim foi por um ano, até Bizinelli perceber um mercado em baixa, com uma queda no faturamento que chegou a 40%, atropelado pelas dificuldades de regulamentação. Foi preciso repensar a estratégia para manter a viabilidade do negócio.

Após deixar os eventos, em março de 2016, o negócio passou por oito meses de estudos. O nome mudou para Hot Bizi e foi fechada parceria com a loja Templo da Cerveja, no Shopping Hauer, ponto que reúne diversos bares de rua na capital paranaense. O cardápio gastronômico se somou ao comércio de cervejas especiais. “Aproveitamos o movimento da comida de rua, do consumo na calçada” para remodelar o negócio, afirma Bizinelli.

O empresário gostou do modelo de ponto fixo, mas percebeu que o perfil de público mais jovem não era exatamente o esperado e a parceria durou apenas dez meses. “Desistimos porque nosso público é de pessoas mais velhas e famílias, que prezam por mais aconchego. Não conseguíamos ter a mesma saída do food truck, porque sofríamos a concorrência de preço.” Enquanto o Hot Bizi vendia sanduíches a R$ 20, em média, vizinhos ofereciam opções por R$ 10.

Migração para o restaurante tradicional

Depois da experiência com o bar de rua, surgiu a oportunidade de abrir um restaurante com um formato mais tradicional. O nome Hot Bizi foi aposentado e o negócio passou a se chamar Pururuka. Bizinelli uniu a experiência da gastronomia com o sonho dos sócios – a mulher, Taiza Espolador, e o sogro, Antonio Espolador –, de ter um restaurante especializado em carne suína e inaugurou a casa em abril de 2018. Em seis meses de funcionamento, o estabelecimento de 100 lugares tem um faturamento médio mensal de R$ 100 mil, com a meta de crescer até 60% nos próximos seis meses e mais 100% no final de 2019.

Trabalhar com ponto fixo é mais fácil, porque tanto legislação como tributação são mais claras, não há problemas com regulamentação e o custo é mais baixo, afirma Bizinelli. “Se escuta muito que food truck não paga aluguel, mas na verdade paga ‘vários aluguéis’, porque precisa de uma cozinha de base, investir na cozinha do próprio caminhão, provavelmente a parcela do veículo, sem contar que para participar de qualquer evento pede-se uma taxa de participação mais um percentual sobre as vendas, geralmente de 20%.”

O perfil mudou e os sanduíches não são mais o carro-chefe. “O que sai mais é uma receita exclusiva de torresmo em tiras com lemon pepper, nossa entrada mais famosa, e o prato campeão é a barriga de porco.” O tíquete médio é de R$ 60.

Murilo Bizinelli, sócio-proprietário do restaurante Pururuka.Divulgação

Enquanto loja física, o Pururuka tem pretensões de expandir. Há previsão de abertura de duas unidades para o ano que vem, uma no litoral de Santa Catarina e outra no interior Paraná. Em 2020, a ideia é lançar a marca no modelo de franquia.

Falta de regulamentação foi definidora

A queda nos resultados do food truck , embora intensa, não foi o principal motivo para a Hot Bizi rever o posicionamento. Foi a legislação. “Eu liderava a Associação Paranaense de Food Truck na época e estávamos em conversa com o poder público para aprovar uma lei que ainda não existia, que atendesse a demanda dos empresários. Como tem protecionismo de mercado, entidades como Abrasel e Sindihoteis fizeram pressão e deram uma engessada na legislação”, diz.

As normas fugiam muito ao conceito do food truck , avalia Bizinelli. “A ideia é ser itinerante e rodar, mas os locais seriam licitados, em pontos ruins, que tapavam buraco da cidade e não atendiam ao segmento. Era um modelo promissor e hoje quase não tem food truck nas ruas por conta disso”. A regulamentação em Curitiba foi aprovada em junho de 2017. Mas nesta época o empresário já estava em outra.

Food truck “fixo”

O empresário Felipe Tezelli encontrou, também no Shopping Hauer, a oportunidade de instalar um ponto fixo do Big Bear, que vende chopps e hambúrgueres. Mas ele não estacionou a ideia do caminhão. O food truck da marca continua circulando com uma equipe específica para as viagens e até o final do ano estará no Norte e Centro-Oeste do país. Nos últimos três anos, o veíuclo passou por mais de 150 cidades brasileiras, em um total de dez estados.

Tezelli estava cansado dos deslocamentos e apostou na moda da gastronomia de rua em Curitiba. “Queria bar de rua com conceito do food truck, com um pouco mais de conforto. Percebi ali um nicho de mercado que foi muito bem aceito.”

O Big Bear fixo vende em torno de 4 mil hambúrgueres por mês, a mesma quantidade do food truck. M as o faturamento é um pouco maior, na comparação com a loja itinerante. “No caminhão comercializamos somente os hambúrgueres por R$ 20 a R$ 25 (com 180 gramas de carne) e faturamos de R$ 100 mil a R$ 140 mil por mês. No bar, tem os sanduíches de R$ 12 a R$ 15 (130 gramas), além de chopes, e fazemos de R$ 150 mil a R$ 170 mil.”

Tezelli não pensa em expandir com mais trucks, apesar de receber muitas propostas para participar de eventos. “É muita burocracia e nenhum apoio da prefeitura, além de uma legislação ruim. Outra dificuldade é a logística. É difícil manter o padrão dos ingredientes, pois é preciso buscar fornecedores diferentes em cada local, para ter produtos frescos e sempre com a mesma qualidade.”

Modismo e crise contribuem para mudanças

Mesmo movimento vem acontecendo pelo país há alguns anos. O mesmo aconteceu com marcas como Nebraska e My Way (Curitiba), La Peruana (São Paulo), Meatz Burger (Brasília), Cadê Meu Brigadeiro (Belo Horizonte) e The Marley´s Burguer (Rio de Janeiro), assim como tantos outros. Alguns fatores contribuem para a mudança de estratégia, explica a consultora gastronômica Fernanda Cestari. A especialista destaca os hábitos do brasileiro em primeiro lugar e faz uma comparação com uma cidade como Nova York, onde os moradores são acostumados a comprar seu alimento e sair pela rua comendo.

“É um costume da população de lá. O brasileiro quer sentar, ser servido, comer e ir embora. Aconteceu muito de estacionarem em lugares que permitissem cadeira e mesa e isso limitou a função do food truck, que deveria ser simplesmente de conveniência, além de custos. É um hábito difícil de mudar e implicou diretamente no funcionamento deles. As pessoas foram muito pela moda e depois começaram a perceber que queriam mais conforto e praticidade”, avalia.

Fernanda aponta ainda outros três fatores, como o custo com aluguel, equipamentos e funcionários, para manter uma cozinha de base, para o pré-preparo dos alimentos; a crise, fazendo com que diminuísse a saída do brasileiro para comer, assim como aumento dos preços para a produção dos caminhões devido à alta demanda; e o modismo, criando a ilusão de que poderia ser um negócio fácil de manter. “Os food trucks sem consistência de conceito e de produto fecharam. Passar a ter uma loja física une o útil ao agradável e muitos que sobreviveram estão migrando.”

A tendência de mudar a estratégia do negócio não significa tachar a morte dos food trucks. Como todo mercado, no início os empreendedores entendem que é uma forma fácil de ganhar dinheiro, mas sem ter muita noção do que será o trabalho, analisa a consultora Alessandra Simões, do Sebrae de Minas Gerais. “Não é fácil, é exaustivo. Quem trabalhou bem, com boa estrutura e contatos, boa mídia social, permanece e cresceu. Muitas vezes o negócio não vinga porque não tem capacidade de gestão de produção e envolvimento com o público, nem bom relacionamento com promotores de evento para ser chamado.”

Segundo Alessandra, é possível encontrar outras possibilidades, mesmo que encontre alguma dificuldade, se esse for um propósito de vida. “O empresário pode testar novos formatos, como modelos menores que não somente o tradicional, como uma bicicleta, que caiba em qualquer evento e não somente visualizar ambiente de praça, onde se tem problema de chuva, de estacionar.”

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