
Um prédio comercial de quatro andares e 15 salas, situado ao lado da prefeitura de Mandirituba, na região metropolitana de Curitiba (RMC), é um símbolo da guerra fiscal entre os municípios pela receita do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS). Para efeitos fiscais, o número 26 da Rua Augusto Dissenha abriga, em apenas 15 salas, um próspero centro de negócios, com mais de 200 empresas como madeireiras, agências de turismo, consultorias, escritórios de contabilidade, editoras, produtoras de vídeo, assessorias em comércio exterior e empreiteiras. Na prática, entretanto, apenas uma autoescola, um consultório de dentista e algumas outras poucas atividades comerciais funcionam normalmente no prédio, enquanto as outras salas permanecem fechadas durante o horário comercial.
Essa situação é resultado da proliferação de empresas e prestadores de serviços que transferem suas sedes fiscais da capital onde a alíquota média do ISS é de 5% para municípios vizinhos que praticam o índice mínimo permitido de 2%, utilizando-se de endereços de fachada, enquanto suas atividades permanecem sendo executadas em Curitiba.
Exemplo
Mandirituba é apenas um dos municípios da RMC alçados à condição de verdadeiros paraísos fiscais. Uma análise dos dados das finanças públicas das cidades do entorno de Curitiba mostra que, nos últimos 8 anos, a arrecadação de ISS desses municípios cresceu em um ritmo 2,5 vezes maior do que na capital. Entre 2002 e 2009 a receita tributária de Curitiba com serviços aumentou 121%, enquanto nos municípios vizinhos o crescimento foi de quase 300%. Um resultado disso é a forte dependência da receita do ISS em algumas cidades próximas à capital. Em Balsa Nova, por exemplo, 80% de toda a arrecadação de impostos e taxas provém do tributo cobrado sobre a prestação de serviços. Quatro Barras e Quitandinha também cobram o mínimo permitido na alíquota do ISS.
Por trás desses dados, há uma rede alimentada por alguns empresários dispostos a sonegar impostos. Há também o favorecimento à prática de crime contra a ordem tributária por parte de contadores que recomendam esse tipo de prática e, ainda, a omissão dos órgãos fiscalizadores de classe e do poder público municipal.
Desconhecimento
A síndica do prédio de Mandirituba, Lenita Gelenski Vonsosvicz, percebe que as empresas usam o endereço somente como fachada. "Alguns [empresários] alugam salas para provar que têm escritório na cidade. Uma única empresa alugou quatro salas e nem retirou as chaves. Outros só registram a empresa no endereço para emitir nota fiscal", conta. Ela própria diz desconhecer o número exato de empresas registradas no local, mas garante que são mais de duas centenas, atraídas pela facilidade em obter alvará na cidade.
Sob condição de anonimato, um contador que tem escritório em Mandirituba afirma que a prefeitura facilita esse tipo de prática. "Quanto a isso [fiscalização], não tem problemas, é tranquilo: Mandirituba é um dos poucos municípios em que ainda é possível fazer isso", revela. Segundo ele, todos os contadores que atuam na cidade têm os "canais abertos" para registrar empresas de fachada não apenas naquele endereço. "O prédio anda muito visado. Existem outros endereços em que é possível registrar uma empresa", garante. O contador revela que tem dois casos de empresas de fachada registradas no endereço do seu próprio escritório. "É lógico que isso é irregular. Mas, por uma questão de tributação, a prefeitura faz vistas grossas, já que isso ajuda o município também", justifica.




