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Bernardo Quintão: de volta para a casa dos pais até  a turbulênciaeconômica passar. | Priscila Forone/Gazeta do Povo
Bernardo Quintão: de volta para a casa dos pais até a turbulênciaeconômica passar.| Foto: Priscila Forone/Gazeta do Povo

Queda da bolsa levou empresário de volta para casa dos pais

A crise e seus efeitos no mercado de ações provocaram várias mudanças na vida do empresário Bernardo Reynaud Quintão, de 22 anos. Sócio de uma empresa de investimentos, ele trocou o flat temporariamente pela casa dos pais e adotou um programa de corte de despesas. "Vou ficar aqui até me mudar para um apartamento alugado quando as coisas melhorarem." De acordo com ele, vários clientes reduziram o ritmo de investimentos por causa das turbulências, o que obrigou a empresa – que conta com outros dois sócios – a demitir dois funcionários (um estagiário e uma secretária) e a replanejar gastos.

Segundo Bernardo, o movimento caiu, no auge da crise, cerca de 60%, principalmente com a fuga dos investimentos na bolsa de valores. "Também deixei de comprar bens de tecnologia para fazer uma poupança caso a crise piore. Deixei de adquirir uma televisão, que havia planejado e diminui minhas despesas com telefone fazendo um plano empresarial."

Contando o aluguel do flat e mais a redução de despesas com o estacionamento e o lazer dos fins de semana, ele calcula que conseguiu fazer uma economia de R$ 1 mil por mês. "A crise foi uma lição que mudou drasticamente minha visão das coisas e me alertou como é importante gastar de maneira consciente, fazer uma poupança e não gerar expectativas acima do que é possível realizar."

Apesar de acreditar que a situação vai se agravar nos próximos meses, ele está otimista e vê chances de recuperação dos investimentos em bolsa no segundo semestre. Depois dos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, que são tradicionalmente fracos, março já deu sinais de melhora. "Vou voltar a investir na empresa, reformulando a política comercial, mas mantendo todos os gastos na ponta do lápis."

Contas em atraso e menos compras no supermercado

O taxista Vilmar Américo, de 57 anos, vem sentindo no bolso os efeitos do desaquecimento da economia. Ele viu sua renda encolher em 40% por conta da queda do movimento. "Estou pagando todas as contas com atraso, menos o aluguel. Não gosto de atrasar nenhuma, mas não consigo pagar todas em dia, principalmente as prestações das lojas."

Para driblar a queda na receita, ele teve de cortar gastos no supermercado, reduzir o consumo de energia e as idas aos restaurantes com a esposa. "Eu e minha mulher jantávamos fora às vezes. Agora não jantamos mais", diz. "Quando eu viajava, ela ia junto. Agora só vou eu, porque quando ela ia, gastava em média R$ 150. Sozinho, gasto R$ 50."

A situação financeira também obrigou Américo a adiar alguns exames médicos. "Não posso parar de trabalhar. Daí que eu vou ter menos dinheiro", diz. Um dos sonhos do taxista é poder fazer uma poupança. "Mas para economizar tem que sobrar. E hoje não sobra, falta", afirma. (CR)

  • Valmir viu a renda encolher 40% e só consegue pagar o aluguel em dia.

A crise econômica já provoca mudanças nos hábitos dos brasileiros, que estão cortando despesas e evitando contrair novas dívidas. Optar por marcas mais baratas no supermercado, adiar a compra da geladeira ou a reforma da casa, ou até mesmo cortar o curso de inglês das crianças entraram na pauta do dia das famílias para contornar os efeitos da retração da economia.

Uma pesquisa realizada pelo Ipsos, a pedido da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), mostra que mais da metade dos brasileiros não está disposta a adquirir dívidas em 2009. De acordo com o levantamento, cerca de 37% deles se declaram menos à vontade para contrair dívidas, enquanto 31% afirmam não haver nenhuma possibilidade de que isso aconteça.

Atualmente, o compromisso que está pesando mais no orçamento é a alimentação, para 73% dos entrevistados, a prestação em crediários de compra de bens de consumo é o mais pesado para 20% e o pagamento de impostos, para 18%.

O medo de perder o emprego e a pressão no orçamento fizeram o brasileiro frear principalmente as compras de produtos que dependem de crédito e financiamento, como eletrodomésticos, material de construção e automóveis. "A confiança na economia é um fator decisivo. Diante da crise e do anúncio de demissões, o consumidor prefere se precaver mais e evitar se endividar", diz o economista Reinaldo Pereira, da coordenação de serviços e comércio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O casal de empresários Eduardo Vieira, de 49 anos, e Márcia Eliane Vieira, de 46 anos, é um exemplo dessa tendência. Com uma renda mensal de cerca de R$ 5 mil e cinco filhos, eles resolveram reduzir gastos e adiar a reforma das casas de Curitiba e do Litoral. "Percebi que começou a ficar muito pesado administrar as contas e decidi mudar algumas coisas", diz Eduardo, que substituiu o celular pós-pago por um pré, dispensou os serviços do jardineiro e transferiu a filha de 16 anos para o período da tarde no colégio porque a mensalidade é mais barata.

Donos de um bar, o casal diz que a instabilidade da renda é um problema em épocas de crise. "Nunca sabemos quando o movimento (do comércio da família) será bom ou não. Assim é difícil fazer algum planejamento. Temos que nos precaver", diz.

A mudança no comportamento das famílias já tem reflexos no comércio, que amargou uma queda de 2,3% no último trimestre de 2008 na comparação com o terceiro trimestre, de acordo com o IBGE.

No supermercado, o consumidor está substituindo marcas mais caras por mais baratas e deixando no carrinho os itens supérfluos. Para a Associação Brasileira de Marcas Próprias (Abmapro), o setor se beneficia em épocas de crise. "Há uma tendência ainda maior de o consumidor experimentar itens com a marca do varejista e do atacadista, que geralmente são 20% mais baratas, e comprovar a relação custo-benefício" diz a presidente da entidade, Neide Montesano.

Educação

Os gastos com educação também estão na mira das famílias. Segundo o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Paraná (Sinepe/PR), Ademar Batista Pereira, as escolas de cursos complementares, como de idiomas e de capacitação técnica, já sentem uma diminuição no número de matrículas. "As famílias estão cortando esse tipo de gasto com os filhos, e as empresas, que subsidiavam cursos de capacitação, também estão reduzindo as despesas", diz. Outra preocupação do setor é com o aumento da inadimplência – hoje entre 3% e 10% ao ano–principalmente a partir do segundo semestre de 2009. "Todo mundo vai pagar um preço pela crise. Se houver um aumento do desemprego, a situação pode ficar complicada."

Para Marcos Pazzini, diretor da Target Marketing, consultoria especializada em consumo, a mudança de atitude das famílias não é definitiva e deve se alterar quando a economia voltar a decolar. "O comportamento atual é uma resposta ao momento de incertezas. Mas no momento em que sentir um pouco mais segurança, o consumidor volta a comprar e a tirar do papel os seus projetos", completa.

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