No primeiro semestre, foram movimentados R$ 11,2 bilhões em oferta secundária de ações na bolsa| Foto: Divulgação/B3
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O cenário internacional mais adverso, as turbulências políticas e econômicas no Brasil e a alta nos juros para conter a inflação frearam os negócios entre empresas no primeiro semestre. Operações como fusões e aquisições, venture capital, private equity e aquisição de ativos vinham em crescimento desde 2017 e ganharam velocidade em 2021, mas pararam de crescer neste ano. Mesmo assim, o volume continuou elevado: foram 1.610 transações de janeiro a junho, uma queda de apenas 1% em relação ao mesmo período de 2021.

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“O que mudou de lá para cá foi o cenário de menor liquidez mundial. Há menos dinheiro circulando por causa do combate à inflação”, diz o diretor de finanças corporativas da consultoria Kroll, Alexandre Pierantoni. Estados Unidos e Europa estão com recordes históricos de inflação. “O volume de operações foi afetado no mundo todo.”

Uma série de fatores contribuiu para esse cenário: começou com a pandemia da Covid-19 e foi impactada negativamente pela guerra provocada pela invasão russa na Ucrânia e as quebras nas cadeias globais de suprimentos.

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O executivo avalia que as expectativas são de que o cenário melhore a partir da virada do ano, quando houver definições na esfera política e esteja mais clara como será a condução da política econômica e o comportamento da taxa de juros. “O Brasil é extremamente atrativo para investidores estratégicos.”

As projeções atuais de mercado sinalizam que a taxa básica (Selic) vai encerrar 2023 em 10,75% ao ano, segundo o relatório Focus, do Banco Central. Atualmente, a taxa está em 13,25% ao ano e espera-se uma alta de 0,5 ponto percentual na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que começou nesta terça-feira (2) e termina no dia seguinte.

“O que o investidor, seja ele estratégico ou financeiro, está buscando ao realizar uma transação corporativa é previsibilidade e estabilidade”, diz.

Outro fator que favorece as transações no Brasil, segundo Pierantoni, são suas dimensões quase continentais e a abrangência de sua economia. “É a espinha dorsal de muitos negócios, principalmente no que se refere ao agronegócio.”

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É uma situação completamente diferente da segunda maior economia da América do Sul, a Argentina. Por lá, as transações estão concentradas principalmente no setor de óleo e gás. E, apesar de a economia brasileira ser quatro vezes maior que a argentina, o volume de transações corporativas no Brasil foi dez vezes maior que no país vizinho na primeira metade do ano, aponta estudo da TTR.

Fusões e aquisições

As operações de fusão e aquisição de empresas tiveram uma queda de 2,3% no primeiro semestre, comparativamente ao mesmo período de 2021. Segundo a Kroll, foram registradas 735 transações. Somente em junho, foram 94 operações, o quarto mês seguido de queda.

Os setores de maior atividade continuam sendo associados, direta ou indiretamente, a tecnologia, serviços financeiros (onde tecnologia também está fortemente presente), serviços (B2B e B2C), logística, energia e produtos de consumo. Destaque também aos setores de educação e saúde, que continuam apresentando movimento de consolidação.

A consultoria aponta que, olhando para 2023, os dados demonstram que os investidores nacionais continuarão – junto com os estrangeiros que já conheçam o Brasil – ativos em processos de fusões e aquisições. “Novos entrantes irão aguardar um cenário mais claro para definir uma estratégia de investimentos de longo prazo”, diz a Kroll.

IPOs e follow-ons

A situação é bem menos animadora no mercado acionário. Desde 1º de abril, quando atingiu o pico de 121.570 pontos, até esta terça-feira (2), o Ibovespa – principal índice da B3 – acumula perdas de 17,4%. Esse desempenho se refletiu nas operações de IPO (oferta inicial de ações, na sigla em inglês). Pela primeira vez desde 2015 não foi registrada uma operação do gênero na primeira metade do ano.

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Mesmo os chamados "follow-ons" (ofertas subsequentes de ações, de empresas que já têm capital aberto) tiveram menos operações no início deste ano. Ao todo, segundo a Kroll, foram 11 operações, que movimentaram R$ 13,5 bilhões, 10,1% de toda a movimentação no mercado de capitais registrada no ano passado. Os valores não incluem a operação de privatização da Eletrobras, que elevaria o patamar para 36%. A maior operação de oferta subsequente de ações envolveu o frigorífico BRF, com a emissão de R$ 5,4 bilhões em ações.

“Foi algo mais restrito e seletivo”, comenta Pierantoni. Ele destaca que houve uma “mudança de ventos”, tanto no Brasil quanto lá fora.

“Incertezas globais e menor previsibilidade de recuperação de demandas continuam incomodando os investidores. O Brasil tem seus desafios internos em mais um ano marcado por interferências e ruídos criados em período de eleição presidencial”, aponta relatório da Kroll.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

Investidores financeiros

Um cenário um pouco melhor foi registrado entre os investidores financeiros. Após o recorde de investimentos no país em 2021, com a aplicação de R$ 53,8 bilhões em operações de venture capital e private equity, no primeiro trimestre elas permaneceram estáveis em relação a igual período de 2021, atingindo R$ 11,5 bilhões.

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Também conhecido como capital de risco, venture capital é o investimento em empresas novas com grande potencial de crescimento; por isso, em geral é mais voltado às pequenas e médias. Private equity, por sua vez, é a compra de participação em empresas mais maduras e de maior porte.

Segundo a Kroll, conservadorismo e preservação de caixa voltaram à pauta principal dos investidores, em um contexto de maior seleção de investimentos com a taxa básica de juros no Brasil em patamares elevados e sem viés de redução no médio prazo.