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Na liderança de uma das quatro maiores auditorias e consultorias do mundo, o executivo Luiz Sérgio Vieira acredita que o momento de crise é uma boa oportunidade para inovar. | Antônio More/Gazeta do Povo
Na liderança de uma das quatro maiores auditorias e consultorias do mundo, o executivo Luiz Sérgio Vieira acredita que o momento de crise é uma boa oportunidade para inovar.| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Se pudesse voltar no tempo e dar um conselho a si mesmo 24 anos atrás, Luiz Sérgio Vieira, que à época entrava como trainee na Ernst & Young, em Fortaleza, orientaria o novato a permanecer curioso e a ter muita paciência. “Nem sempre as coisas vão acontecer da forma e no ritmo que você espera”.

Hoje, tendo chegado ao posto de CEO da companhia no Brasil, o executivo mostra que, de alguma forma, já sabia o caminho do sucesso que o trouxe até aqui, embora talvez não imaginasse que o mundo um dia pudesse avançar sob o ritmo frenético do momento atual.

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Desde que pisou na empresa, sempre buscou se destacar. De missão em missão, sua carreira foi crescendo aos poucos, mas com o fôlego ligeiro de quem tinha urgência em aprender mais. Seu primeiro desafio foi integrar um escritório ainda pequeno, recém aberto em Fortaleza. Começou na área de auditoria, depois foi para a consultoria tributária e, com oito anos de casa, recebeu um convite para trabalhar na unidade da EY de Nova Iorque, onde aperfeiçoou seus conhecimentos em tributação internacional. Após voltar ao Brasil, foi treinado para ser o novo presidente da organização no país. Em julho de 2016, assumiu o cargo, aos 45 anos.

A nova fase do executivo traz horizontes ainda mais amplos, sob um pano de fundo intrigante: enquanto a revolução digital tem transformado o modus operandi das empresas, uma geração de profissionais inquietos ocupa o mercado de trabalho e o Brasil vive uma das piores crises político-econômicas de sua história. Na liderança de uma das quatro maiores auditorias e consultorias do mundo, Luiz Sérgio vive uma empreitada diversa, marcada por aspectos que vão definir o rumo das companhias nos próximos anos.

Em visita à Gazeta do Povo, ele falou sobre esse período e ponderou os impactos desse contexto no presente e no futuro.

É comum ouvir dizer que as novas gerações não gostam de passar muito tempo em uma mesma empresa. O que as organizações podem fazer para reter estes talentos?

Quando a gente diz que as gerações Y ou milennium ficam pouco tempo na empresa, a gente precisa entender que empresa estamos oferecendo. Se é uma companhia moldada para uma geração antiga ou para a nova. Falamos de gerações mais preparadas, com mais informação do que as passadas e que querem, não apenas ser bem-sucedidas, como também ter um impacto na sociedade, ter uma razão pela qual estão fazendo o que fazem. É muito importante que as organizações trabalhem bem seus propósitos, mostrando não só como algo é feito, mas também o porquê é feito. Isso atrai esses jovens, que são movidos por desafios e têm muita pressa. Outra coisa: mais do que incentivo financeiro, é importante dar flexibilidade. E é mito dizer que estas gerações são pouco fieis. Esse perfil é capaz de comparar mais facilmente as empresas em diversos rankings que existem e há uma guerra maior de talentos. Mas, a lealdade, eu creio,vem muito da capacidade que cada companhia tem de encantar e fazer o profissional ver que vai conseguir desenvolver seus talentos ali. É preciso trabalhar para manter o engajamento.

Outra questão relacionada a perfis no mercado de trabalho se diz respeito aos profissionais mais velhos. As pessoas têm trabalhado mais anos, por vários fatores, como o aumento da expectativa de vida. Isso impacta a oferta de mão de obra. Por outro lado, ainda há preconceito com os veteranos. Como as empresas devem se adaptar a esse novo cenário?

É uma questão interessante. No nosso negócio, por exemplo, a aposentadoria acontece aos sessenta e é mandatória. Porque no nosso modelo, que é piramidal, o profissional vai entrar aos vinte e poucos anos com oportunidades de crescimento e vai sempre ter gente saindo para dar chances a quem chega. Isso é essencial para reciclar a firma com novas ideias. Mas o fato de existir um ciclo da carreira não quer dizer que a pessoa aos sessenta esteja obsoleta. Talvez ela até esteja no auge da capacidade intelectual. E aí ela precisa identificar um negócio que tenha essa possibilidade de adaptação. A característica de solucionar problemas, por exemplo, tende a ser cada vez mais valorizada, principalmente com a revolução digital. No nosso caso, os profissionais que se aposentam ou vão para conselhos de empresas ou para o magistério e oferecem outro tipo de contribuição ao mercado. Esse é um tema importantíssimo dentro da sociedade. Vão ter modelos de negócios em que você vai poder manter as pessoas enquanto ela tiver essa vitalidade para trabalhar, mas a questão é como será possível manter essas pessoas e oferecer as mesmas oportunidades às novas gerações.

Um dos pontos que você mais defende é a inovação. De que maneira as companhias podem avançar nesse quesito em um período de crise?

Aquele chavão que diz que a crise deve ser vista como oportunidade é a mais pura realidade. Ela te obriga a olhar diferente para as coisas. E desafiar o status quo é o primeiro passo para inovar. Se você está satisfeito com o que tem e está acomodado naquela situação, não busca o novo. Mas, em meio a uma crise, posso olhar e questionar quais são as oportunidades que eu tenho naquele momento e como é que eu posso tornar o meu negócio mais eficiente. O momento cria esse senso de urgência para que você tome decisões. As empresas precisam fugir das reações das crises passadas. Houve companhias que quando entraram nessa situação já foram cortando pessoal. Talvez você possa até cortar algumas pessoas dentro da sua organização, mas, antes de tomar essa medida,devem haver várias outras discussões: quais são os novos modelos de negócio que eu posso ter com estas novas alavancas, que novos canais eu posso abrir para vender meu produto e que tipo de conhecimento ou competência eu preciso juntar? Nesse momento de crise, por exemplo na EY, resolvemos criar um centro de inovação, que é um catalisador da inovação dentro da minha organização. E a gente tomou essa decisão nesse momento difícil. Então, é preciso ter coragem e ser ousado.

Você chegou a dizer que o aumento das discussões sobre ética no país impulsionou a procura das empresas por programas de transparência. Em que medida isso aconteceu?

Houve, sim, um aumento e esse é um ponto favorável. Temos visto as empresas revisitando as suas práticas de governança, os seus programas de conformidade e estabelecendo canais de denúncia. Mas essa é apenas uma parte da equação. Você pode ter tudo isso e mesmo assim estar envolvido em sérios problemas éticos. Por isso, é importante trabalhar a questão da cultura e do propósito da organização. Não adianta ter um discurso que não se coaduna com a realidade.

Uma pesquisa divulgada pela EY mostrou que em 2025 muitas das funções que existem hoje serão substituídas por novas tecnologias. Como as organizações deverão absorver essa mão de obra excedente?

Várias profissões vão ser reinventadas, mas funções muito procedimentais serão substituídas por algoritmos, robótica ou inteligência artificial e o que vai acontecer é que as pessoas vão precisar mudar suas competências e qualificações para continuarem gerando valor aos negócios. Mas a capacidade de solucionar problemas e tomar decisões é o elemento humano que deverá seguir se desenvolvendo para continuar sendo relevante. O que a história nos tem dito é que toda vez que surge uma revolução, empregos são fechados e novos empregos surgem. É o que se espera também desta revolução digital. Algumas funções que vão surgir nós ainda nem conhecemos, porque é incerto. Mas uma pesquisa nossa, por exemplo, mostrou que 50% dos empreendedores acreditam que vão contratar mais pessoas do que demitir.

Como as empresas devem se preparar para esta transição?

A primeira coisa é se preocupar com o que está acontecendo. Depois, buscar conhecer estas tendências e o impacto delas sobre o negócio. É preciso perguntar: para onde vai o meu setor? Como posso continuar a gerar valor ao meu consumidor e estar próximo dos meus clientes? O que a gente chama de revolução digital não é uma tecnologia em si, é uma profusão de tecnologias. E as empresas não podem ignorar essa realidade.

“O que a história nos tem dito é que toda vez que surge uma revolução, empregos são fechados e novos empregos surgem. É o que se espera também desta revolução digital”.

Luiz Sérgio Vieira, CEO da EY para o Brasil
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