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Opinião

E o desconto à vista?

Não gosto de fazer compras parceladas pelo cartão, mas tenho feito muitas. Não por que o crédito esteja fácil ou pelas comodidades oferecidas pelas empresas. Pelo contrário. Tenho comprado a prazo por insatisfação.

A lógica das relações comerciais prevê que, para o comerciante, sempre é melhor receber tudo de uma vez do que parcelar. E que, com a simplificação crescente dos instrumentos de compra parcelada, faz sentido conceder benefício para o cliente que está disposto a pagar à vista. Esse benefício é um preço menor – o famoso desconto para quem paga à vista, lembra dele? Pois é uma pena, mas esse benefício está em vias de extinção.

Sempre que possível, peço desconto para pagar minhas compras à vista. Mas tenho ouvido, inclusive em operações de valor baixo, cada vez mais respostas do tipo "Não é possível, senhor. Mas eu posso parcelar em até dez vezes!" Esse tipo de reação vem principalmente das redes de varejo. O tom de voz entusiasmado dos vendedores tenta transformar isso numa grande vantagem, mas não é bem assim.

Ninguém entra num negócio para perder dinheiro: se a loja oferece pagamento parcelado sem juros é porque o preço da etiqueta inclui o custo financeiro que ela está disposta a bancar. E por que é que eu, que me disponho a pagar tudo de uma vez, tenho de cobrir também esse custo? Quando isso acontece, me sinto forçado a parcelar. Se pagar à vista mesmo assim, estarei contribuindo para elevar a margem do comerciante. E vou me sentir um bobo.

Senhor comerciante, nem todo mundo está ansioso por pagar uma conta em dez prestações de R$ 3. Nem para, espontaneamente, colocar mais dinheiro no seu cofrinho. Dê desconto para quem paga à vista.

Franco Iacomini é editor-executivo de Economia.

Apesar de o pagamento parcelado no cartão de crédito ainda responder por menos da metade do faturamento da indústria de cartões do Paraná (40%), que movimentou R$ 3,93 bilhões até setembro, a modalidade ganha importância como forma de financiamento. Em todo o país, o brasileiro está aprendendo a usar o cartão – hoje acessível a praticamente todas as classes sociais – para obter um crédito sem juros. Nacionalmente, o porcentual de compras parceladas (50,5% das operações até setembro) já ultrapassou a fatia das compras à vista (49,5%). E quase 100% dos parcelamentos é feito sem o pagamento de juros.

"Em outra loja o preço é R$ 5 mais caro e ainda cobram juros. Claro que vou comprar aqui", disse Claudir Bastos, enquanto escolhia sapatos esta semana na Rua XV de Novembro, no centro de Curitiba. De cartão de crédito em mãos, ele parcelou a compra em quatro parcelas de R$ 24,90, sem juros.

Pesquisa sobre o mercado nacional de cartões bandeirados, realizada pela Itaucard, estima que, este ano, o mercado de cartões vai movimentar R$ 94 bilhões em parcelamentos sem juros, alta de 23,4% em relação a 2006. No total, o segmento deve faturar R$ 181 bilhões este ano, contra R$ 150,5 bilhões no ano passado.

Para parcelar sem juros, não é preciso fazer uma compra imensa. No Paraná, o tíquete médio das compras parceladas no cartão foi de R$ 272 de janeiro a setembro, contra R$ 59 do valor médio das compras à vista.

"Cada vez mais o pagamento parcelado é visto como uma forma de financiamento, e mesmo a alta renda tende a ampliar seu uso no ano que vem", diz o diretor de marketing de cartões do Itaú, Fernando Chacon.

Se antes cartão de crédito era coisa de "doutor", hoje quem mais usa o parcelamento é a baixa renda (responsável por 55% das compras nessa modalidade). Em compensação, a alta renda gasta mais. A baixa renda parcela em média R$ 181 por compra, ante R$ 336 da alta renda. À vista, os valores são bem menores: de R$ 40 e R$ 90, respectivamente.

"A baixa renda, que consome cada vez mais com o meio de pagamento eletrônico, é a grande responsável pela evolução da modalidade", diz Chacon. Os clientes de alta renda, que ainda consomem a maior parte de suas compras à vista, tendem a parcelar mais no próximo ano.

A relação entre renda e parcelamento é forte. As mulheres, que na média ganham salários menores que os homens, tendem a fazer uso com mais freqüência do parcelamento (56% das pessoas que parcelam são mulheres).

A liderança das regiões Norte e Nordeste como as que mais parcelam confirma a forte ligação entre modalidade de pagamento e a renda do consumidor. Na região Norte, as compras parceladas respondem por 65% do faturamento com cartões de crédito, e o tíquete médio é de R$ 229. No Nordeste, a modalidade representa 62% do faturamento, e o valor médio das compras é de R$ 189.

A Região Sul tem a menor participação no parcelamento, com 42%, e tíquete médio de R$ 258. As compras de maior valor são realizadas no Centro-Oeste, que tem tíquete médio de R$ 278.

No segmento de eletrônicos, em que o parcelamento responde por 86% das compras com cartão, o tíquete médio é de R$ 324. Mas não é difícil encontrar compras de valor inferior. Quando o celular de Alessandro Mazer "pifou", sua mãe, Sônia, decidiu aproveitar o barateamento dos aparelhos e trocar o seu também. A família de comerciantes gastou R$ 118 no total, divididos em três vezes sem juros. "Não tem por que não parcelar", opina Alessandro.

Em média brasileira é de 2,9 cartões por cidadão. "O controle é a grande questão em relação ao crédito. Os cartões beneficiam o mercado eliminando o cheque pré-datado", diz Chacon. Para ele, o consumidor tem aprendido a administrar sua capacidade de pagamento.

Para as instituições financeiras, ainda que o parcelamento sem juros signifique abrir mão de faturamento, a relação de longo prazo com o consumidor aumenta a chance de fidelização, o que representa um ganho maior.

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