Debate
Ressarcimento divide especialistas
Para o médico Benno Kreisel, presidente da Associação dos Hospitais do Paraná, o ressarcimento dos planos ao SUS "é uma aberração". "Ele só servirá para onerar o plano, que, mais cedo ou mais tarde, vai passar a conta para o cliente. Se eu sou um cidadão que pago impostos, eu tenho direito de usar o SUS, mesmo tendo plano de saúde", opina.
O promotor Clayton de Albuquerque Maranhão, da Promotoria de Defesa do Consumidor, discorda, mesmo quando o atendimento em questão não faz parte do rol de procedimentos obrigatórios dos planos. "A operadora cobra do usuário, mas terceiriza o custo de atendimento ao SUS, mantido com impostos pagos pelo povo." Para Maranhão, o problema do ressarcimento é uma questão de erário, de dinheiro público gasto por quem tem condições de pagar plano, prejudicando os cidadãos da classe D e E que só têm ao SUS para recorrer. (FZM)
O Sistema Único de Saúde (SUS) e os planos de saúde vivem um embate na esfera federal em torno do valor pago pelas operadoras para ressarcir o governo depois que um cliente delas usa a rede pública. O ressarcimento está previsto no artigo 32 da Lei dos Planos (9.656/1998), mas está tendo sua constitucionalidade questionada pelas operadoras por diversos motivos um deles é que, segundo elas, seria obrigação do Estado o provimento universal da saúde aos cidadãos.
O órgão responsável por fazer o cruzamento de dados dos atendimentos na rede pública com a lista de usuários de planos de saúde e, mais tarde, enviar a cobrança às operadoras é a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mas o serviço tem falhas e já foi alvo de várias auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU).
Pelos dados da ANS, há uma defasagem de quase R$ 200 milhões entre os valores cobrados e os pagos entre 2006 e 2010, considerando apenas os atendimentos que envolvem Autorização de Internação Hospitalar (AIH) a ANS cobrou R$ 232 milhões nesse período, mas os planos só pagaram R$ 39 milhões. Fora isso, o TCU ainda aponta a possibilidade de se passar a cobrar também pelas Autorizações de Procedimentos Ambulatoriais (Apacs), cujo potencial de recolhimento, entre 2003 e 2007, seria de R$ 3,9 bilhões.
Essa conta de mais de R$ 4 bilhões pode acabar caindo, em doses homeopáticas, no boleto do consumidor. A avaliação é de especialistas da área de Direito do Consumidor, como o promotor Clayton de Albuquerque Maranhão, da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor do Paraná, e da área da saúde como o coordenador do Centro Paulista de Economia da Saúde (CPES/Unifesp), Marcos Bosi Ferraz, e o médico Benno Kreisel, presidente da Associação dos Hospitais do Paraná e pesquisador da remuneração da saúde suplementar.
Entraves
Desde 2010, por exigência do TCU, a ANS tomou providências para tentar agilizar o trabalho de cruzamento de dados. Contratou mais 89 servidores antes eram 30 para tratar o passivo pendente com o objetivo de saná-lo em um prazo máximo de quatro anos, e criou a Gerência-Geral de Ressarcimento ao SUS, além de iniciar um estudo preliminar para a futura operacionalização das Apacs.
Ao mesmo tempo, as operadoras vêm usando todos os prazos administrativos de recursos que podem, alegando contradições como a diferença entre o que a ANS estabelece para pagamento de determinado procedimento em uma tabela, chamada de Tunep, e o valor efetivamente pago pelo SUS ao hospital.
"O valor é geralmente superior ao que foi realmente gasto pelo sistema público, o que achamos um absurdo", avalia o diretor-presidente da Unimed Curitiba, o médico Sérgio Ioshii. A cooperativa acompanha de perto uma ação envolvendo a questão da constitucionalidade e que está na fila do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda sem data para apreciação. É o julgamento dessa ação, que envolve um hospital de Ponte Nova, em Minas Gerais, e a Unimed Minas, que definirá a questão da constitucionalidade.
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