Com planos de franquias, clientes podem ter a velocidade reduzida ou a conexão interrompida| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Além da votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff, uma outra polêmica tem conseguido encontrar espaço nos debates em redes sociais: a adoção, pelas operadoras, de franquia para os planos de banda larga fixa, aos moldes do que já ocorre na internet móvel. Revoltados com o regime - anunciado pela operadora Vivo em fevereiro e que já estava previsto em contratos da Oi e da Net -, entidades de defesa do consumidor e movimentos populares têm feito manifestações online contra a medida, pelas limitações que ela pode trazer ao uso da internet no País.

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Apesar de tanta discussão, até agora pouco se sabe sobre os motivos por trás da decisão das operadoras. Procuradas pelo reportagem, Oi, Net e Vivo não comentam o assunto. A falta de explicações levou o Procon-RJ a notificar ontem as três operadoras para que elas expliquem, em até 15 dias, o funcionamento do modelo de franquias. A Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) entraram com ações na Justiça.

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A principal crítica é sobre como as operadoras vão restringir o acesso à internet após o fim da franquia, isto é, o limite de dados que o consumidor pode enviar e receber por meio da rede da operadora. O cliente pode ter a velocidade reduzida ou a conexão interrompida - em desacordo com o Marco Civil da Internet, que só permite o corte em caso de inadimplência.

Para o pesquisador de telecomunicações do Idec, Rafael Zanatta, as franquias são pequenas, principalmente em planos populares, o que limita o conteúdo que pode ser consumido (veja quadro ao lado). Nos pacotes mais baratos, o limite varia entre 10 GB e 30 GB. Para ele, a imposição de contratos com desvantagens excessivas infringe o Código de Defesa do Consumidor. “As empresas não apresentaram estudo que embase o modelo de franquias. É abuso de poder econômico”, afirma.

Infraestrutura

Para especialistas, a adoção da franquia na banda larga fixa é fundamental para a ampliação do acesso à internet. “É uma solução dolorida, mas necessária”, diz o professor de computação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Eduardo Morgado. Com um limite de uso, as operadoras poderão prever o crescimento da demanda, o que favorece a gestão. “A quantidade de dados utilizados afeta diretamente o congestionamento da rede”, diz o presidente da consultoria Teleco, Eduardo Tude. “Faz sentido cobrar mais caro do usuário que usa mais banda.”

Apesar de causar estranheza por aqui, o modelo de franquia já é adotado em outros países. Nos EUA, duas das maiores operadoras - a AT&T e a Comcast - estabelecem limites. Mas, ao contrário do que deve acontecer no Brasil, elas adicionam um pacote de dados de 50 GB quando os clientes ultrapassam a franquia. Por aqui, a operadora vai oferecer planos adicionais - ainda sem preços.

Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), Lisandro Granville, o argumento da infraestrutura é uma “desculpa nobre” das operadoras. “O valor arrecadado sempre financiou a infraestrutura”, diz ele.

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Concorrência

A mudança, na visão de Granville, deve ser creditada ao crescimento dos serviços de streaming de vídeo, como o Netflix. Em fevereiro, a empresa alcançou 70 milhões de usuários no mundo. Essas plataformas consomem grandes volumes de dados. “O novo modelo é uma maneira de as empresas se beneficiarem do crescimento dos serviços sob demanda”, diz.

Há outro aspecto relevante. Serviços como o Netflix concorrem com a TV por assinatura, negócio em que Oi, Net e Vivo atuam. Este segmento tem sofrido nos últimos meses: segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), as empresas perderam 500 mil assinaturas ou 2,3% em 2015. Para a Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), a culpa não é do Netflix, mas da crise.

A banda larga fixa e móvel são reguladas pela Anatel. A agência exige que as empresas avisem sobre o fim do plano de dados e que ofereçam ferramenta para verificar o consumo, mas diz que a questão da franquia não está sob sua tutela.

Em nota, a Oi informou que “atualmente não pratica redução de velocidade ou interrupção da navegação após o fim da franquia”, embora o dispositivo esteja previsto no contrato. Já a Vivo esclareceu que o novo modelo valerá para novos contratos a partir de 2017. A Net não respondeu aos contatos da reportagem. Segundo Rodrigo Abreu, presidente da TIM, a operadora - que é a única a não adotar a franquia - “não planeja mudar as regras do jogo”.