Loja da Saraiva no Shopping Mueller, em Curitiba.| Foto: Priscila Forone/Arquivo/ Gazeta do Povo

Na última terça-feira (14), a Saraiva apresentou os resultados do segundo trimestre de 2018 aos acionistas e ao mercado. As operações da varejista resultaram em prejuízo de R$ 37,6 milhões (e R$ 33,9 milhões para o semestre) – fortalecendo a imagem de que o mercado brasileiro de livrarias passa por um período de forte crise, sem previsão de melhora.

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Por outro lado, as maiores redes de livrarias do país já parecem ter entendido que precisam apostar em inovação para conseguirem se adaptar à nova realidade do consumo. Esforços para escapar de uma era de Apocalipse do Varejo – conforme apelidado um movimento semelhante no comércio dos EUA – já começaram.

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Antes de apresentar os números consolidados, a Saraiva já vinha mostrando novos sintomas de fraqueza. Neste ano, a livraria não compareceu à Bienal do Livro, maior evento do setor no país. Justamente a companhia costumava ter um dos maiores estandes do evento – que funcionava até como abrigo às editoras que não levavam balcão próprio. Para piorar, os outros dois grandes nomes do setor de livrarias, Cultura e Fnac, também deixaram passar batida a data.

No balanço ao mercado da Saraiva, nota-se que o principal problema da rede é o endividamento. No total, o saldo devedor chega a R$ 296 milhões – sendo que R$ 96,4 milhões devem ser pagos este ano e outros R$ 127 milhões têm vencimento em 2019. No primeiro semestre deste ano, previu-se que a empresa levaria 12 anos para quitar seu endividamento líquido caso mantivesse fluxo de caixa constante e não tomasse novos empréstimos. O problema é que o Ebitda utilizado naquela conta variou mais de 500% e ficou negativo em R$ 29,4 milhões, destruindo qualquer previsão neste sentido.

Vale lembrar que a Saraiva corresponde a quase um terço das vendas de livros no país. No trimestre, a empresa aumentou levemente o market share nesta frente, em 0,1 ponto percentual. Cultura e Fnac, agora do mesmo grupo, possuem cerca de 16% deste mercado. Em outras palavras: as editoras têm muito a perder com as dificuldades da rede de livrarias – e já estão perdendo.

Na primeira quinzena de agosto, a editora especializada em histórias em quadrinhos Mythos foi a mais recente a anunciar a suspensão da distribuição de seus quadrinhos tanto para a Saraiva, como para Cultura e Fnac, alegando calote. Em julho, foi a vez da Bookwire, principal distribuidora de livros digitais do Brasil, fechar o canal com ambas as livrarias. Nenhuma delas pode acessar o seu catálogo de eBooks pelo mesmo motivo: a empresa teria ficado sem pagamento pelas redes desde janeiro.

Ainda há uma luz no fim do túnel para o setor

Seria errado dizer que o mercado editorial está parado frente às dificuldades. E-commerce e programas de fidelidade, estratégias que se mostram cada vez mais importantes para empresas, como a Amazon fora do país, são frentes em que as empresas vêm apostando cada vez mais.

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Nacionalmente, o varejo do mercado editorial brasileiro manteve o crescimento de 2017 no primeiro semestre de 2018. O acumulado deste ano mostra um crescimento de 5,2% em volume e quase 10% em faturamento em comparação ao mesmo período de 2017. Os números são do Painel das Vendas de Livros no Brasil, do Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel) e da Nielsen BookScan, que apura as vendas das principais livrarias e supermercados no país. Ou seja, o setor sobreviveu mesmo em meio à greve dos caminhoneiros e à Copa do Mundo.

No trimestre, o canal de comércio eletrônico da Saraiva cresceu 2,5% nas vendas brutas, alcançando 38,4% do total de vendas, contra 36,6% no mesmo período do ano passado. A empresa também comemorou uma melhora de seis dias no Prazo Médio de Recebimento de clientes e a criação do serviço Click & Collect, em que o cliente compra no E-commerce para retirar em uma das lojas – o famoso omnichannel. Também cresceu em 300% o Saraiva Entrega, no qual o cliente pode comprar produtos que não estejam disponíveis na loja para receber onde for mais conveniente.

Já o programa de fidelidade Saraiva Plus teve incremento de 11% na taxa de reativação de clientes quando comparado ao mesmo período do ano anterior. Já são 16,4 milhões de clientes cadastrados, que correspondem a cerca de 83% do faturamento.

Seguindo o exemplo de concorrentes com força em comércio eletrônico, como Magazine Luiza e Mercado Livre, além da própria Amazon, a Saraiva também iniciou, em junho, as operações de um marketplace próprio: parceiros podem vender produtos através do site da livraria. Também outros marketplaces são usados a favor da rede, já que a Saraiva possui lojas em plataformas como a do Walmart, Mercado Livre e B2W. Segundo a empresa, 65% das compras de produtos neste canal foram feitas por consumidores que não eram clientes anteriormente, expandindo o alcance.

Enquanto isso, além da compra da Fnac, a Cultura também tem suas próprias estratégias para lidar com a crise do setor. Após uma demissão em massa de estimados 140 funcionários no primeiro semestre, a empresa falou em reestruturação e previu que 80% da sua receita venha de canais digitais até 2020 – o que também implica em fechar algumas portas de lojas físicas. A aquisição do marketplace de livros usados Estante Virtual já foi um primeiro passo neste sentido.

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Executivos da companhia falaram em evento sobre a criação de um centro de inovações chamado EVA (nome em homenagem à fundadora da empresa, Eva Hertz), cujo objetivo é fazer da Cultura uma empresa digital. O laboratório tem desenvolvido apps, repensando as plataformas de e-commerce e marketplace e dedicando-se ao B.I (business intelligence).

Na manhã desta quarta-feira (15), a ação da Saraiva observava forte queda de 4,95%, enquanto o Ibovespa caía 1,26%. No ano, a rede de livrarias acumula desvalorização na bolsa de 29,22%, contra alta de 1,63% do benchmark.

Sobre os resultados, a empresa comentou ter “ciência que os resultados do segundo trimestre de 2018, fortemente impactados pela greve de caminhoneiros e período de Copa do Mundo, ficaram aquém do esperado”, mas acrescentou: “continuamos implementando um importante plano focado na melhoria da rentabilidade para que possamos reverter rapidamente esse cenário”. As experiências em frentes digitais e a maior eficiência operacional “contribuirão significativamente para a melhoria dos resultados da Companhia”, disse a nota dos resultados. 

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]