Aeroporto de Ponta Grossa é um dos que esperavam investimento.| Foto: Josue Teixeira/Gazeta do Povo

Menos de dois anos após sua reinauguração, o aeroporto de São José dos Campos, no interior de São Paulo, está às moscas. O terminal recebeu obras de modernização que aumentaram em mais de cinco vezes a área destinada a passageiros, para 5 mil m². A reforma foi feita para atender a um tráfego esperado de 600 mil pessoas por ano.

CARREGANDO :)

Meses depois da reinauguração, a Azul suspendeu os voos no local. Em junho de 2016, foi a vez da Latam deixar o aeroporto. Hoje só os passageiros da aviação executiva embarcam em São José dos Campos. Os guichês de check in estão vazios, a lanchonete fechou e uma lona cobre o balcão de atendimento da Localiza.

Veja também
  • Reforma da Previdência deve “aposentar” o fator previdenciário
  • Preço mais baixo alimenta “boom” do mercado livre de energia
Publicidade

São José dos Campos foi uma das nove cidades brasileiras que saíram da malha das grandes empresas desde 2015. Em meio à crise econômica, elas deixaram para trás cidades como Pato de Minas (MG), Macaé (RJ), São Gabriel da Cachoeira (AM), Tucuruí e Porto Trombetas (ambas no Pará). Algumas ainda têm voos de empresas pequenas, que representam menos de 1% do mercado.

“A aviação brasileira está diminuindo”, resume o presidente da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz. O motivo, explica, é que o setor sofreu um choque de custos ao mesmo tempo em que a demanda caiu. “Diversos voos não se viabilizam mais. A solução foi cortar.”

Os cortes são nacionais. No caso da capitais, há redução de frequências de voos, mas as empresas áreas mantêm o serviço. No interior, as empresas abandonaram algumas praças, reduzindo a concorrência ou deixando a cidade sem oferta de transporte aéreo – no Paraná, cidades como Cascavel e Londrina perderam voos no último ano.

Em média, o número de decolagens de TAM, Gol, Azul e Avianca caiu 10% no primeiro semestre deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O movimento vai na contramão do que se prometia para a aviação regional.

Ajustes

A Azul é a única empresa entre as grandes que têm uma frota específica para a aviação regional - o turboélice ATR. A empresa voa hoje para cerca de 100 destinos e atua sozinha em cerca de 40 cidades. Nos últimos meses, no entanto, a Azul suspendeu voos no interior e se desfez de 18 ATRs. Foram 11 destinos cancelados, incluindo apenas uma capital, desde 2015.

Publicidade

A empresa iniciou operações em outras quatro cidades no interior no período, mas o saldo ficou negativo. “A aviação regional perdeu muitos voos porque não se fez nada para melhorar os aeroportos e reduzir o preço do combustível”, afirma o presidente da Azul, Antonoaldo Neves.

A maioria dos cortes foi feito por falta de viabilidade financeira. Mas a infraestrutura falha também pesou. São Gabriel da Cachoeira e Coari, no Amazonas, tiveram voos cancelados por isso, diz Neves. “São coisas pequenas. Equipamentos quebrados e licenças que venceram que inviabilizaram a operação.”

Mas, a seu ver, o maior problema é o preço do combustível. O querosene de aviação (QAV) no Brasil já é mais caro do que no exterior, mas no interior os valores são ainda maiores do que nas capitais. Um litro de QAV sai por R$ 1,36 nos EUA, R$ 2,25 em São Paulo e R$ 6,74 em Cacoal (RO).

Como 37% do custo de um voo é composto pelo combustível, a mesma distância pode custar o dobro se o voo partir de cidades do interior do que de São Paulo. Para ser viável, o preço da passagem teria de ser muito superior, o que muitas vezes não cabe no bolso do passageiro.

Menos aviões

A redução de voos para o interior reflete o que ocorre na malha aérea como um todo, explica Alberto Fajerman, diretor de relações institucionais da Gol. “Tiramos 20 aviões da frota este ano. O mesmo avião voa para cidades grandes e pequenas, como se estivesse em um trilho, então vários destinos foram afetados.” Ao todo, a Gol projeta um corte de até 18% nos voos nacionais em 2016. Na maioria das cidades, há redução de frequências.

Publicidade

A Latam também fechou bases no interior e colocou na gaveta planos de montar uma frota para voos regionais. “Estudamos seriamente esse projeto e chegamos a iniciar negociações com Embraer e Bombardier”, diz a presidente da Latam Brasil, Claudia Sender. Ela ressalta que a empresa ainda acredita que o crescimento do tráfego aéreo virá das cidades médias e tem interesse em novos destinos regionais.

A crise, no entanto, adiou os planos para este mercado. Para reverter o quadro, as empresas defendem uma desoneração de custos, em especial do QAV. A Abear estima que um teto para a alíquota do ICMS, em discussão no Senado, viabilizaria a criação de 200 voos em um ano, incluindo o interior.

União revê plano de expansão para o setor

O projeto de estimular à aviação regional continuará no governo de Michel Temer, mas será reduzido. Em vez de reformar 270 aeroportos do interior e investir R$ 7 bilhões, como anunciou a presidente afastada Dilma Rousseff em dezembro de 2012, serão 170 projetos e um investimento indefinido, mas certamente menor.

“Fizemos uma triagem para avaliar o que se justificava tecnicamente e economicamente e chegamos a 170 aeroportos”, disse Dario Lopes, secretário de Aviação Civil do Ministério dos Transportes.

A estimativa de levar voos comerciais para 270 aeroportos do interior era considerada exagerada no setor aéreo. “Não tem demanda e não vai ter”, diz uma fonte de mercado. O Paraná tinha 15 aeroportos na lista inicial do governo federal.

A ordem no governo é estabelecer prioridades, escolher cerca de 20 aeroportos e fazer as primeiras licitações das obras. Segundo Lopes, a equipe econômica autorizou investimentos de R$ 300 milhões em 2017 na reformas de aeroportos. A lista dos projetos prioritários ainda não foi divulgada.

Outro ponto que estava no programa de Dilma e deve ser rediscutido é a concessão de subsídios para empresas aéreas que fizerem voos regionais. A primeira estimativa do então ministro da Aviação Civil do governo Dilma, Moreira Franco, era liberar R$ 1 bilhão por ano para subsídios.