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Entraves

Recuperação da demanda interna não é suficiente para salvar setor

Nem mesmo uma recuperação repentina na demanda seria suficiente, por si só, para fazer o setor se recuperar. Segundo especialistas, o câmbio desfavorável e o baixo investimento em inovações fazem com que a retomada industrial dependa do ambiente externo e da mudança de humor dos investidores e empresários.

O maior exemplo disso, segundo o economista da Fiep Roberto Zurcher, foram os resultados da indústria e do varejo nos últimos anos. "Quando o consumo estava em alta, a oferta era suprida por produtos importados. Isso aconteceu por que o real estava muito valorizado perante o dólar e porque a indústria nacional não tinha condições de suprir esta demanda", afirma.

O descolamento fica evidente no comportamento do comércio. Até o início de 2013, a intenção de consumo das famílias batia recorde. O mesmo pode ser confirmado pela geração de empregos nos setores. Enquanto a indústria perde participação, o comércio cresceu em ritmo forte. Nem assim a indústria mostrou sinais de retomada. "Há quase que um incentivo para o consumo de produtos importados. Se a demanda voltar a crescer, as importações vão naturalmente suprir esta necessidade", afirma o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Sérgio Antunes Valle.

Opinião

Pode ser cedo para a indústria ficar para trás

Guido Orgis, editor executivo de Economia

A menor participação da indústria na geração de empregos formais poderia ser tomada como um sintoma normal da transição para o status de economia madura. Afinal, todos os países desenvolvidos cruzaram a fronteira da indústria para os serviços. Muitos economistas, no entanto, apontam que é cedo para uma nação com a nossa renda ver o peso da indústria cair com tanta velocidade. A tese fica mais consistente quando vemos que essa queda não é acompanhada por ganhos de produtividade na indústria. Ou seja, o setor não emprega menos porque é mais eficiente e automatizado, mas porque passa por um enxugamento em seus segmentos menos competitivos.

Para completar, a transição para o mundo dos serviços no Brasil ocorre na base e não no topo. Em outras palavras, são os serviços mais simples e com menores salários, bastante ineficientes, que estão gerando mais empregos. Não estamos criando um novo Vale do Silício, nem temos uma indústria de ponta. Os dados de emprego são só um efeito disso.

-0,5% é a previsão da Confederação Nacional da Indústria (CNI) para o PIB industrial deste ano. No fim de 2013, a CNI projetava um crescimento de 2%. Em abril, foi revisada para 1,7% e ontem a CNI passou a prever um cenário de recessão.

24% é a queda da participação do setor agropecuário na massa de emprego formal no país desde 2007. Passou de 5% para 3,8% do total de postos de trabalho. Por outro lado, a produção de grãos no período aumentou em quase 10 milhões de toneladas, atingindo 56,8 milhões em 2013/2014, segundo a Conab.

A estagnação econômica, a falta de competitividade e o arrefecimento da demanda interna fizeram a massa de trabalho industrial encolher em relação ao total de empregos formais no Brasil. De 2007 a 2014, a participação do setor caiu quase dois pontos porcentuais. Há sete anos, as vagas na indústria representavam 24,1% dos postos de trabalho no país. Hoje, não passam de 22,2%. Enquanto isso, comércio, serviços e construção civil registraram crescimento nesta proporção, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). No Paraná, a situação é parecida. A indústria também perdeu participação no bolo do emprego formal, com a proporção do setor caindo de 25% para 23,5%.

INFOGRÁFICO: Veja dados sobre a produção industrial

Nos números totais, de 2007 a 2014, a indústria saltou de 7,5 milhões de vagas para 9 milhões – um crescimento de 19%. No mesmo período, o total de empregos formais no país avançou em um patamar muito maior, a praticamente 30%.

No ano, a situação é ainda mais dramática. Segundo o IBGE, o emprego industrial caiu 2,2% nos cinco primeiros meses de 2014 – no Paraná, a queda foi ainda mais intensa, de 3,2%.

A situação é reflexo de um problema de longo prazo. Enquanto a oferta de crédito foi excessiva para o consumo, acabou sendo escassa para o investimento na indústria, que andou de lado desde a crise econômica de 2008. "É um processo antigo, que se agravou com o recente enfraquecimento da demanda", afirma o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos do Paraná (Dieese-PR), Fabiano Camargo de Souza.

Produtividade

A queda na proporção de empregos industriais não seria tão preocupante se viesse acompanhada de ganho de produtividade e, consequentemente, de competitividade das empresas brasileiras do setor. Não é o caso. "A produtividade não evolui. Junto com a desaceleração no emprego, vem a perda de dinamismo na produção industrial e na margem de lucro das empresas", afirma o economista de macroeconomia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Sérgio Antunes Valle.

O resultado é uma queda na qualidade do emprego no Brasil. "O emprego industrial exige maior qualificação e paga mais. Uma queda nesta proporção é prejudicial para a massa trabalhadora como um todo", completa Valle.

Mais do que isso, a crise industrial é suficiente para abalar os demais setores. Se, por exemplo, uma montadora está com dificuldade de baixar seus estoques, a produção será reduzida, trabalhadores serão dispensados e contratos com fornecedores podem ser suspensos. Por sua vez, estes fornecedores também perdem mercado, reduzem produção e podem dispensar mão de obra. "E assim a cadeia se estende por toda a economia, incluindo varejo e serviços", conclui o economista da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) Roberto Zurcher.

Pessimismo do empresário paranaense bate recorde

A perspectiva de recuperação não é das melhores, segundo a sondagem mensal de confiança do empresário da indústria de transformação do Paraná feita pela Fiep. Segundo a pesquisa, realizada desde julho de 2012, a margem de lucro operacional e o volume de produção chegam aos seus menores índices e os estoques, ao segundo maior patamar do período. Com isso, as perspectivas quanto ao número de empregados chega ao seu pior patamar para os próximos seis meses. No mês passado, o indicador do emprego para o futuro chegava a 49,1 pontos. Neste mês, o índice teve sua maior queda e chegou aos 45,3.

O primeiro semestre já deu sinais deste pessimismo. Segundo o secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba, Jamil Dávila, os seis primeiros meses de 2013 registraram 5,4 mil desligamentos nas fábricas deste segmento no estado. No mesmo período de 2014, o número de homologações saltou para 6,5 mil.

Esforço

Além disso, algumas montadoras se movimentam para não ter de desligar funcionários. A Volkswagen promoveu o layoff de mais de 500 colaboradores e, apesar do período do afastamento se encerrar nos próximos dois meses, a empresa ainda não informou aos trabalhadores o que será feito.

A Renault suspendeu o terceiro turno da sua fábrica de veículos de passeio – e remanejou os funcionários para outros turnos. A empresa justifica que a produção foi afetada, sobretudo, pelo endurecimento nas regras de exportações para a Argentina.

O economista da Fiep Roberto Zurcher explica que, mesmo com um cenário pessimista, os empregos são os últimos a serem cortados da planilha de custos dos empresários. "Como o trabalho na indústria exige uma capacitação maior, o patrão reluta a demitir para não ter que gastar mais com treinamento no ciclo seguinte de contratações", explica.

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