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A alfabetizadora Marilene e a turma de funcionários do Minas Brasília Tênis Clube: trabalho inclui até a oferta de hidratante para que alunos consigam segurar o lápis | Ailton de Freitas/ Agência O Globo
A alfabetizadora Marilene e a turma de funcionários do Minas Brasília Tênis Clube: trabalho inclui até a oferta de hidratante para que alunos consigam segurar o lápis| Foto: Ailton de Freitas/ Agência O Globo

Paraná - 44 cidades livres do problema

O Paraná teve neste ano 44 municípios declarados territórios livres do analfabetismo. Uma cidade é assim declarada quando tem menos que 4% de analfabetos. O índice é estabelecido pela Unesco e pelo Ministério da Educação.

Curiosamente, a taxa de analfabetismo em todo o estado em 2009 subiu 0,1 ponto porcentual. É de 6,7% de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE. O pequeno acréscimo vem sendo demonstrado ano a ano desde a Pnad 2007, quando a taxa de analfabetismo no estado era de 6,5%.

A Pnad 2009 mostra que em todo o estado do Paraná, 551 mil pessoas com mais de 15 anos não sabem ler nem escrever. A Secretaria de Estado da Educação informa que desde o ano 2003 realiza o programa Paraná Alfabetizado, responsável por alfabetizar 154.042 pessoas até o ano passado. A taxa de analfabetismo em 2003, segundo a Secretaria, era de 7,8%.

(Tatiana Duarte)

O ensino que vai além das letras

Passar creme hidratante nas mãos faz parte da lição numa turma do Brasil Alfabetizado, em Brasília.

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BRASÍLIA - O faxineiro Edvaldo Félix Bezerra limpa banheiros no setor de transporte e garagem da Câmara dos Deputados. Entra às 7 horas e começa o dia sujando o polegar de tinta. Aos 53 anos, Edvaldo é analfabeto e preenche a folha de ponto com a impressão digital. Principal meta do Ministério da Educação (MEC) no início do governo Lula, a erradicação do analfabetismo está longe de virar realidade. Em seu oitavo ano, o programa Brasil Alfabetizado já gastou R$ 2 bilhões, em valores atualizados, e matriculou milhões de jovens e adultos. Mas o índice de iletrados, na faixa de 15 anos ou mais, caiu menos de dois pontos porcentuais: de 11,6%, em 2003, para 9,7%, em 2009, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE.

O número absoluto de analfabetos está na casa de 14 milhões desde 2006, segundo a Pnad. No ano passado, eram 14,1 milhões. Até o fim de 2010, o Brasil Alfabetizado deverá atingir a marca de 14 milhões de matrículas, considerando-se a quantidade de alunos atendidos a cada ano. Em 2010, a previsão é atingir 2,2 milhões de jovens e adultos. A maioria das turmas, porém, só começará nos próximos meses, avançando sobre 2011.

Eficácia

Coincidentemente, o total de vagas oferecidas pelo Brasil Alfabetizado (14 milhões) está perto de igualar o número absoluto de iletrados. Ou seja, pode-se afirmar que o programa do MEC criou condições de atender um número equivalente ao de jovens e adultos analfabetos no país. Os dados da Pnad sugerem, porém, que a iniciativa não surtiu o efeito desejado.

Outro problema é que o MEC desconhece a eficácia do Brasil Alfabetizado. Só em 2009 o ministério instituiu um teste para aferir a aprendizagem ao final do curso. Como o programa é realizado em parceria com governos estaduais e prefeituras, não é o MEC que aplica a avaliação. Além disso, cabe aos parceiros informar os resultados. E muitos deixam de fazer isso.

No ano passado, ao renovar as parcerias, o MEC cobrou informações sobre o desempenho das turmas de 2007, quando ainda não havia um teste padronizado. De 1,3 milhão de alunos supostamente atendidos naquele ano, pelo menos 927 mil teriam concluído o curso e 666 mil teriam sido alfabetizados, segundo as informações que chegaram ao MEC. Como nem todos os parceiros continuaram no programa, os resultados desses alunos não foram enviados.

O secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, André Lázaro, diz que a evasão no Brasil Alfabetizado gira em torno de 30%. Embora a Pnad informe que a idade média do analfabeto brasileiro era de 54 anos, o país tinha 5,4 milhões de iletrados com menos de 50 anos, em 2009. A maioria vivendo em áreas urbanas: 3,2 millhões nas cidades e 1,8 milhão no campo.

Até no MEC

O faxineiro Edvaldo não é o único analfabeto no setor de transporte e garagem da Câmara. Raimundo Oliveira, de 53 anos, também usa o dedo para "assinar" o ponto. Ele abandonou a escola para servidores da Câmara. Edvaldo, que nasceu em Pesqueira (PE), conta que abandonou a escola ainda criança, pois não gostava de estudar e só queria trabalhar na roça: "Me arrependi muito porque não estudei quando era novo. A pessoa que sabe ler conhece muita coisa e pode arrumar um serviço melhor", diz Edvaldo, que recebe R$ 600 por mês, somando salário e benefícios.

Até no MEC há analfabetos. Embora seja capaz de assinar o nome e, com algum esforço, ler até frases, Almir Alves Rodrigues, de 37 anos, está no limiar entre o analfabeto absoluto e o funcional, aquele que lê, mas não entende. Almir é faxineiro terceirizado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), agência do MEC responsável pela pós-graduação. Nascido no Distrito Federal, ele diz que terminou a 4.ª série do ensino fundamental, mas largou a escola para ajudar a mãe, trabalhando como vendedor de balas e engraxate. "Sei ler muito pouco. O mais difícil são aquelas letras enganchadas", diz Almir.

Reformulado

O Brasil Alfabetizado não apareceu na propaganda eleitoral da candidata do PT à presidência, Dilma Rousseff. O motivo é simples: o programa, que já foi reformulado uma vez, ainda não consegue funcionar direito. Até 2006, os convênios eram celebrados também com organizações não-governamentais. O MEC acabou com a parceria com ONGs, passando a firmar convênios apenas com prefeituras e governos estaduais.

Um dos objetivos era atrair professores da rede pública para atuarem como alfabetizadores. A meta era que, pelo menos 75% dos alfabetizadores fossem docentes. Segundo André Lázaro, porém, o porcentual de professores gira em torno de 15%. Eles recebem R$ 250 por mês para dar quatro aulas por semana.

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) foi ministro da Educação no primeiro ano do governo Lula e lançou o Brasil Alfabetizado. Ele critica a mudança de prioridade no MEC. No início de 2004, logo após a demissão de Cristovam, erradicar o analfabetismo deixou de ser meta do governo: "O nível de analfabetismo no Brasil é uma dívida que continua depois dos governos de Fernando Henrique, de Lula e de 25 anos de democracia. Uma vergonha nacional", diz.

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