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Apesar da almejada liderança continental que o Brasil poderia assumir na América Latina, devido ao seu tamanho e recursos naturais, temos um vizinho que nos supera em quase tudo o que importa para um governo. Segundo os dados mais recentes disponíveis, o Chile tem índice de desenvolvimento humano (IDH) de 0,847, posicionando-se pouco acima da Hungria (0,845) e bem acima do Brasil (0,761). Os chilenos também vencem com folga na comparação do PIB per capita e obtêm melhores resultados no PISA, exame que mede o desempenho dos estudantes em leitura, matemática e ciências. A prova, aliás, é promovida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), grupo no qual o Brasil tenta ser aceito há anos, e no qual o Chile já está desde 2010.

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Relacionada a essa conquista, está a situação do homeschooling naquele país. Desde 1980, o ensino domiciliar é um direito garantido pela própria Constituição. No artigo 19, inciso 10, é dito que “os pais têm o direito preferencial e o dever de educar seus filhos. Corresponderá ao Estado outorgar especial proteção ao exercício desse direito”. No inciso seguinte, a carta magna chilena prossegue falando da liberdade de ensino e explicita que “os pais têm o direito de escolher o estabelecimento de ensino para seus filhos”, o que inclui o próprio lar.

O direito de educar os próprios filhos em casa já estaria suficientemente protegido por esses trechos, mas os chilenos dão tanto valor à liberdade que ainda incluíram em sua Lei Geral de Educação o “princípio da Flexibilidade”, segundo o qual “o sistema deve permitir a adequação do processo à diversidade de realidades e projetos educativos”.

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É a somatória desses textos o que permite ao Chile nem sequer precisar de uma lei específica para o ensino domiciliar. Trata-se de um direito absolutamente consolidado, reconhecido pela justiça e respeitado pelo Poder Executivo, responsável pela aplicação de exames periódicos e certificação aos estudantes dessa modalidade, que, na verdade, é a mesma dada aos estudantes escolares. A igualdade de tratamento é total.

A ausência de normas mais restritivas viabiliza também uma grande variedade de métodos e currículos. Algumas famílias escolhem usar os livros didáticos oferecidos pelo governo, mas há também as escolas online, as instituições de ensino que fornecem cursos livres e grupos de famílias que produzem e compartilham o próprio material de estudo. É aceita, inclusive, a opção de matricular os filhos numa umbrella school estrangeira. Comuns nos Estados Unidos, elas são instituições que oferecem currículo, suporte pedagógico e certificação às famílias adeptas do ensino domiciliar. Tudo à distância.

Ao completarem 18 anos, com muita naturalidade, todos os anos, alunos homeschoolers chilenos participam do processo seletivo de acesso ao ensino superior, da mesma forma como qualquer estudante da modalidade escolar.

O exercício de comparar essas condições de liberdade educacional com as que o Brasil oferece chega a ser desanimador. Também explica por que o Chile tem atraído o interesse de um número crescente de famílias educadoras brasileiras, cansadas de esperar pela insistente e cruel omissão do Poder Legislativo, que tarda em aprovar uma lei que as reconheça e proteja.

O Chile é signatário do acordo sobre visto de residência do Mercosul, o que facilita em muito a permissão para brasileiros que queiram morar no país. Essa, contudo, é uma decisão extrema, que exige muito planejamento.

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É evidente, também, que sair da terra natal não deveria ser uma decisão motivada pela ausência de um direito básico, como educar os próprios filhos em paz. Ao menos, não numa democracia que busque ser respeitada como tal.

Embora a nossa Constituição não permita o mesmo grau de liberdade que a chilena, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu no julgamento de 2018 que a modalidade do ensino domiciliar tem amparo constitucional, se praticado sob o princípio da solidariedade entre família e estado. Na mesma decisão, contudo, o tribunal determinou que é necessário haver legislação específica para que tal direito seja reconhecido.

É essa lei que precisa chegar logo. É essa lei que colocará fim no êxodo de famílias educadoras que se veem obrigadas a deixar o país.

* Jônatas Dias Lima é jornalista e assessor parlamentar na Câmara dos Deputados, onde atua junto à Frente Parlamentar em Defesa do Homeschooling.