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Plenário do STF
André Mendonça (primeiro à dir.) é o relator da ação do Novo contra o aumento no fundo eleitoral| Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgará nesta quarta-feira (22) uma ação do partido Novo que contesta uma nova fórmula de cálculo que permitiu elevar para quase R$ 5 bilhões o fundo eleitoral destinado a abastecer as campanhas deste ano.

Se houver tempo, os ministros analisarão ainda nesta quarta-feira, ou na quinta, uma ação do PDT que pode reduzir o prazo de inelegibilidade da Ficha Limpa imposto a políticos condenados (entenda mais abaixo).

Em relação ao fundo eleitoral, o pedido do Novo é para que a Corte considere inconstitucional uma mudança feita pelo Congresso na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que possibilitou destinar aos partidos um total de R$ 5,7 bilhões. O presidente Jair Bolsonaro chegou a vetar a alteração, mas o veto foi derrubado pelo Congresso.

Depois, por meio de um acordo, o Executivo conseguiu reduzir um pouco o valor na aprovação da lei orçamentária de 2022, na qual foi fixado o montante de R$ 4,9 bilhões. Ainda assim, o Novo entende que o cálculo é inconstitucional e defende que a União destine apenas R$ 2,1 bilhões para as campanhas, como Bolsonaro havia proposto inicialmente.

A tendência, segundo apurou a Gazeta do Povo, é que a maioria dos ministros mantenha a elevação do fundo eleitoral, permitindo o montante de R$ 4,9 bilhões no orçamento, como sancionado por Bolsonaro.

No julgamento, todas as atenções estarão voltadas para o ministro André Mendonça, indicado pelo presidente e aprovado pelo Senado após longa campanha para vencer resistências no mundo político. Ele é o relator da ação e o primeiro a votar.

O aumento gradativo no fundo eleitoral

Desde que, em 2015, o STF proibiu o financiamento empresarial das campanhas, o Congresso vem gradativamente aumentando a destinação de recursos públicos a serem gastos em propaganda, viagens e eventos para promover os candidatos.

Em 2018, um ano após a criação do fundo eleitoral, os partidos receberam R$ 1,7 bilhão. Em 2020, foram destinados às campanhas R$ 2 bilhões. No ano passado, porém, o Congresso, na discussão da LDO, catapultou o valor para R$ 5,7 bilhões.

A manobra consistiu em transferir para as campanhas parte da receita reservada para a Justiça Eleitoral em 2021 e 2022 e também em possibilitar que emendas parlamentares de bancadas estaduais, originalmente destinadas a projetos de saúde e educação, alimentassem o fundo.

Para o Novo, há um claro desvio de finalidade e um descumprimento do dever de moralidade na gestão dos recursos públicos.

“Há um aumento expressivo e ad hoc de despesas, sem indicação da fonte de recursos, sem prévia autorização legislativa, que não foi proposta pelo Poder Executivo e que se destina para uma finalidade que não é exatamente coletiva, mas se objetiva custear com recursos públicos interesses eleitorais de somente algumas forças políticas, que são hegemônicas e que, por isso, sentiram-se confiantes para fazê-lo”, diz o partido.

Entidades se mobilizam contra aumento do fundo eleitoral

O pedido do partido atraiu a atenção de dezenas de associações comerciais e empresariais pelo Brasil, que pediram para participar do julgamento opinando contra o aumento do fundo. Em síntese, elas criticam como “imoral” a elevação do fundo, especialmente em momento de déficit nas contas públicas e de gastos necessários para conter efeitos da pandemia. Entidades que defendem maior transparência e menos gastos públicos também se mobilizaram junto ao STF.

“Triplicar o valor do Fundo Eleitoral, enquanto mais de 500 mil cidadãos brasileiros morreram pelo coronavírus, não foi só inconstitucional, como foi imoral e cruel. Tendo em vista que hoje já são mais de 621 mil mortes, que poderiam ter sido evitadas, se fossem usadas essa verbas em combate ao vírus, vale ressaltar que, o valor de R$ 5,7 bilhões seria suficiente para adquirir todas as vacinas que o país precisava à data da votação ilegítima – mais de 350 milhões de doses”, diz a manifestação da associação Livres.

“Recursos são finitos por natureza e não podem fazer com que as forças políticas sejam totalmente dependentes deles para existir, pois assim apenas se verifica que, se antes os partidos eram dependentes das doações privadas de pessoas jurídicas, agora podem estar dependentes dos recursos públicos, e nenhuma destas situações é saudável para a liberdade partidária, para a igualdade de oportunidades, nem para a democracia como um todo”, afirmou, em manifestação, a Transparência Eleitoral.

Demais poderes defendem aumento do fundo eleitoral

Nada disso sensibilizou os demais poderes e órgãos envolvidos no assunto. Em pareceres enviados à Corte, a Presidência da República, a Advocacia-Geral da União, o Congresso e a Procuradoria-Geral da República defenderam a manutenção da nova forma de cálculo.

“O Poder Legislativo, na condição de representante da vontade popular, dimensionou as necessidades de financiamento para a campanha eleitoral das eleições gerais de 2022. Fê-lo no exercício regular de seu poder de deliberação”, diz o parecer da Câmara enviado ao STF.

“O financiamento das campanhas eleitorais é tema de suma importância para a democracia brasileira. Uma democracia que se pretenda substancial (e não meramente procedimental) há de conter regras que permitam a todos os espectros político-ideológicos da sociedade alçar as instâncias decisórias do Estado”, afirmou a PGR.

Ministros analisam redução no prazo de inelegibilidade da Ficha Limpa

Após a decisão sobre o fundo eleitoral, os ministros passam a analisar se políticos condenados na Justiça podem ficar, na prática, inelegíveis por mais de oito anos, que é o prazo fixado na Lei da Ficha Limpa. A decisão do STF terá o poder de mexer nas candidaturas daqueles que foram condenados no passado.

A lei diz que uma condenação por um tribunal colegiado (de segunda instância ou superior) deixa a pessoa inelegível por oito anos “após o cumprimento da pena”. Boa parte do mundo político, no entanto, contesta a forma como a regra tem sido aplicada pela Justiça Eleitoral, que acaba por acarretar um prazo efetivo de inelegibilidade maior.

Muitos juízes eleitorais entendem que o prazo começa a contar a partir do momento em que a decisão colegiada condenatória é proferida, perdura todo o período em que a pessoa recorre para derrubar a condenação, perpassa ainda o tempo em que ela cumpre a pena e, só após o fim desta, somam-se os 8 anos previstos na lei.

Uma ação apresentada pelo PDT em dezembro de 2020 pediu que o STF descontasse dos 8 anos de inelegibilidade após o cumprimento da pena justamente o período anterior, em que a pessoa ficou impedida de se candidatar porque estava recorrendo e cumprindo a pena.

Um exemplo hipotético: o político foi condenado por um órgão colegiado em 2012, passou 10 anos recorrendo, até 2022, e logo em seguida passou a cumprir a pena, que durou mais 10 anos, até 2032. Nessa hipótese, a lei diz que ele deveria ficar inelegível mais oito anos “após o cumprimento da pena”, o que permitiria uma nova candidatura dele só em 2040.

Na prática, se a Justiça Eleitoral, como vem fazendo, declarar que ele fica inelegível desde a sentença condenatória, esse político terá ficado fora das eleições por 28 anos. Para o PDT, é um tempo desproporcional, que viola direitos fundamentais da pessoa à vida política.

Os ministros vão decidir agora se deve haver esse desconto no tempo de inelegibilidade, para retirar dos oito anos “após o cumprimento da pena” o período anterior em que ele também ficou fora das eleições, como consequência imediata da condenação e do cumprimento da pena.

No ano passado, o relator da ação no Supremo, Kassio Nunes Marques, acolheu essa tese durante um julgamento virtual (realizado de forma remota, com votos escritos). Luís Roberto Barroso, porém, divergiu e propôs um desconto menor, que abrangeria apenas o tempo consumido enquanto o político recorria (ou seja, entre a condenação colegiada e o trânsito em julgado).

O ministro Alexandre de Moraes pediu para levar a discussão ao plenário, para um julgamento presencial, no qual a votação agora recomeçará do zero. Dessa maneira, Nunes Marques e Barroso deverão apresentar novamente suas posições, de forma oral, e chegar a uma deliberação final com todos os outros nove ministros.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) defendeu a aplicação mais rígida da lei, sem desconto no tempo de inelegibilidade. Argumentou que, em 2010, quando o STF analisou a constitucionalidade da Ficha Limpa, essa hipótese foi descartada.

Gazeta do Povo apurou que a maioria tende a seguir Kassio Nunes Marques, que defende um desconto maior no tempo de inelegibilidade. No exemplo hipotético apresentado acima, essa solução implicaria na permissão de que o político condenado em 2012 concorresse em 2020. Caso eleito e depois condenado em definitivo, ele cumpriria a pena. Mas, enquanto ela durasse, não poderia mais disputar eleições – nesse caso, não por causa da Ficha Limpa, mas pela regra da Constituição que suspende os direitos políticos de pessoas que cumprem pena.

Há ministros, no entanto, que já defenderam não dar desconto nenhum no prazo de inelegibilidade. É o caso de Alexandre de Moraes, que defendeu uma aplicação mais rígida da lei em um julgamento recente no TSE.

O placar tende a ser apertado e, novamente, todos os olhos estarão voltados para André Mendonça, que prometeu aos políticos, durante sua campanha para chegar ao STF, que seria um juiz “garantista” – ou seja, mais brando na aplicação de punições.

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