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Raros troféus sobraram de um passado reluzente. Guardados na casa de um dos cinco filhos, escaparam da ruína, como o restante do patrimônio do ex-ponta-esquerda Evanir Martinho Otacílio, o Golê. O tempo e a falta de dinheiro não levaram apenas a casa, os carros, o luxo de ter até duas empregadas. Esquecido, sem emprego e sem família, um dos integrantes do último time campeão paranaense do Grêmio Maringá tornou-se indigente nas ruas de São José dos Campos (SP). Hoje, aos 56 anos, além das lembranças só lhe resta tentar manter um pouco de dignidade.

Jogador de várzea no interior paulista, Golê chamou atenção no fim da década de 60. Seu padrinho nos gramados foi Mário Ottoboni, à época presidente do São José e responsável também por revelar craques como Emerson Leão. O hoje todo poderoso técnico do Corinthians está em uma das fotos guardadas por Golê.

Com pouco valor financeiro, o retrato não foi usado por ele como moeda de troca, lamentável fim de outras recordações. "Não vendia. Não teria coragem de ganhar dinheiro com isso. Mas troquei várias coisas por um prato de comida", conta, numa "encenação" real já usada até como tema de cinema. A primeira filmagem de Boleiros (98) conta a história de Paulinho Majestade, ex-craque que sobrevivia do comércio de seus troféus. Roteiro comum na vida de alguns ex-atletas.

Refém da fome, um prato-feito custou a Golê preciosidades como a camisa de Rivellino, com quem conviveu no Corinthians. Até mesmo lembranças históricas, como peças do uniforme da campanha do Grêmio Maringá no Estadual de 77, viraram ninharia.

"Não esqueço daquele título. Ganhamos em casa e depois fizemos 1 a 0, lá no Couto Pereira, com um gol do Itamar. Foi uma festa muito linda", recorda ele. A façanha interrompeu seis anos de hegemonia alviverde no Paranaense, retomada nas duas temporadas seguintes.

Além do Grêmio, o ex-ponta jogou no Londrina. A passagem pelo Paraná lhe rendeu um novo casamento (do primeiro tem um filho e duas filhas) cujas filhas, Francieli e Jocelaine, ainda residem na Cidade Canção. Golê diz falar com as moças por telefone, mas não sabe se elastêm noção da sua realidade. "Não gosto de pedir nada a ninguém. Hoje meus filhos têm família e eu seria um estorvo. Tento levar minha vidinha", explica.

A vida inclui ter como endereço a rodoviária de São José dos Campos, onde dorme com freqüência em um dos bancos. Nas ruas, garante ter fugido da "maior praga", o crack. Mas, mesmo sem confessar, não escapou do vício do álcool.

Golê se orgulha de ser popular e amigo de outros sem-teto como ele e de gastar, muitas vezes, o que ganha com alguns bicos para tomar banho e deixar as roupas limpas.

"Tive fama. Mas ela é muito perigosa. Te leva a lugares desconhecidos. Por isso digo que o futebol me deu tudo. Mas quando acabou, levou tudo embora. Penso que se fosse um simples operário, hoje teria uma vida melhor", afirma.

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