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Rio de Janeiro, Fortaleza e Recife estão entre as cinco capitais brasileiras com maior população negra. Aparecem nesta ordem atrás de Salvador e São Paulo. Estive nas três durante a disputa da Copa das Confederações e vi, nas arenas modernas, uma demografia bem diferente. Era preciso andar vários metros para encontrar um torcedor negro. Com otimismo, chuto 1% de pre­­sença. Um índice que, como bem constatou o colega Edson Militão, aumenta se você incluir na conta quem está a serviço, especialmente nos banheiros e lanchonetes.

O padrão Fifa dos novos estádios deixa claro que a igualdade racial ainda é uma realidade distante no país. Vivemos até hoje uma relação direta entre distribuição de renda e cor da pele. As arenas da Copa só vieram jogar isso na nossa cara e, por mais que a elitização dos ingressos seja um problema, não será barateando o tíquete que as arquibancadas cobertas de cadeiras terão uma miscigenação correspondente à vista nas ruas.

15 dias

Na genial biografia de Tim Maia, Nelson Motta destaca uma frase lendária do músico após duas semanas de abstinência: "Passei duas semanas sem beber, sem fumar e sem cheirar. Em duas semanas, perdi 15 dias". Há duas maneiras de medir o tempo. Pela folhinha e pela sensação do dia a dia. Pelo segundo critério, as duas semanas da Copa das Confederações duraram muito mais do que 15 dias.

Tempo suficiente para ficar maravilhado com o primeiro tempo da Espanha contra o Uruguai. Para penar nos buracos da BR-101. Para saborear cada declaração do Maestro Tabárez. Para reencontrar velhos parceiros de outras jornadas e conhecer novos colegas. Para se encantar com o idealismo dos jovens das manifestações de rua. Para conhecer o cheiro do spray de pimenta e do gás lacrimogêneo. Para torrar no sol. Para ver a luta por construir uma nova Itália. Para se decepcionar por não ver Balotelli jogar. Para esquecer o que é frio. Para se irritar com a imprensa espanhola. Para ver que é possível parar a Espanha. Para ver que é possível massacrar a Espanha. Para se arrepiar com o Hino Nacional cantado à capela, algo de fazer a Marselhesa parecer canção de ninar.

E para esquecer de qualquer sinal de cansaço ao saber que se está no mesmo barco de um time de craques espalhados pelo país – Nícolas, Ana, Albari e os Andrés. E mais uma fenomenal estrutura de retaguarda. Rodrigo, Carlos, Sandro, Bona, Simpson, Fernandão, Marcão, Adriano, Gustavo, Rafael, Adri, Senechal, Malu, Paty, Fabiano, Renatas, Babalú, Marleth... Gente que fez essa cobertura ser possível a cada dia. E quando parecia que nada mais seria capaz de me surpreender, eis que a 20 minutos da decisão, do outro lado da linha, aquele voz que ainda se define desanda a falar "Papai" pela primeira vez. Para encher de lágrimas esses olhos que, pela primeira vez em 20 dias, esqueceram do que acontecia no gramado e nas ruas para viajar até Curitiba. Valeu, Copa das Confederações. Quero ver na Copa.

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