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Um dos 54 tribunais especiais montados para a Copa do Mundo, em Johannesburgo: julgamentos contra estrangeiros | Albari Rosa/Gazeta do Povo – enviado especial
Um dos 54 tribunais especiais montados para a Copa do Mundo, em Johannesburgo: julgamentos contra estrangeiros| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo – enviado especial

Estrutura das Fifa Court

Custo – 45 milhões de rands ou R$ 11,2 milhões

Magistrados – 110

Procuradores do MP – 260

Advogados – 110

Intérpretes – 200

Oficiais de Justiça – 1.140

Policiais – 327

Atendentes – 290

Brasil pode adotar sistema

Por se tratar de uma exigência da Fifa, é muito provável que se tente implantar no Brasil, em 2014, o modelo de julgamento adotado na África do Sul. Juristas ouvidos pela reportagem afirmam que seria uma boa ideia. "O modelo teria de se adequar ao sistema constitucional brasileiro. Uma boa opção seria ter juizados especiais só para crimes relativos à Copa, claro que a lei específica deve ser respeitada", explica o professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Egon Bockmann Moreira.

Uma delas, de acordo com a lei, é a de que apenas infrações de menor potencial ofensivo podem ser apreciados por esses juizados (crimes cuja pena privativa de liberdade não exceda dois anos e contravenções penais). "Nesses casos, o que pode ser feito é uma tentativa de conciliação entre o acusado e a vítima. Caso não haja acordo, o MP [Ministério Público] pode oferecer transação penal, que seria a aplicação de uma pela alternativa, consistente na aplicação de pena restritiva de direitos [prestação de serviços à comunidade, por exemplo] ou de multa. Tudo isso pode ser feito no mesmo dia", explica o advogado Guilherme Rodolfo Rittel.

Os entraves aparecem no caso de o acusado não aceitar nem a conciliação nem a transação e a pena privativa de liberdade ter de ser aplicada. "A pena privativa de liberdade não seria possível de ser aplicada no Brasil se o julgamento ocorresse no mesmo dia. Imagine o sujeito condenado quando teve de apresentar a defesa no mesmo dia. Restringiria o princípio da ampla defesa", ressalta.

Fim determinado

As cortes da Fifa têm data de validade aqui na África do Sul. Foram inaugurados duas semanas antes de a Copa começar e serão fechados duas semanas depois do fim do Mundial. Pela agilidade (e pelo que foi investido em sua instalação), começa a ser esboçado uma espécie de campanha para que os tribunais sejam mantidos e, até, expandidos.Mesmo que não sejam mantidos pela Justiça comum, o Ministro da Justiça, Jeff Radebe, espera que a experiência possa ser a contribuição do país africano para os próximos mundiais. Ao menos foi o que ele disse ao lançar o instrumento judiciário. "Quando o torneio acabar, estou certo de que a Fifa e outras organizações globais irão utilizar alguns dos procedimentos de segurança que temos usado aqui para garantir a justiça em eventos futuros. Gostaria de comunicar e compartilhar o conhecimento sobre esta questão, assim como fizemos depois da experiência com os organizadores dos Mundiais da Alemanha e da Coreia do Sul e Japão", disse Radebe.

Além das mudanças econômicas e sociais que todo país sede de uma Copa do Mundo enfrenta antes, durante e após o evento, a Justiça sul-africana está vivendo um momento sem precedentes. Com o intuito de reforçar a segurança do país, conhecido pela grande violência existente em suas principais cidades, a Fifa exigiu a criação de tribunais especiais para julgar crimes ocorridos durante a Copa do Mundo.

Agora qualquer crime praticado dentro ou fora de um estádio, mas que esteja minimamente ligado à competição, tem sido julgado sumariamente em até cinco dias. Para um país acostumado à morosidade dos julgamentos, que podem levar até dois anos no caso de uma simples multa de trânsito, por exemplo, isso parece um grande avanço jurídico. A aceleração do processo, contudo, infringe diversos direitos garantidos pela legislação internacional como o direito à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal.

"São tribunais sui generis, montados para tentar inibir os problemas que surjam na Copa. Mas têm sérios problemas com relação ao exercício de direito de defesa, produção de provas e de recursos. Quero crer que esses juizados apenas julguem crimes ocorridos durante a Copa e que os tipos penais e os ilícitos civis do país não tenham sido alterados", afirma o professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Egon Bockmann Moreira.

Celeridade

Com os novos tribunais, após a denúncia e a prisão do suspeito, em uma média de cinco dias o caso tem sido solucionado. "Essa é a média desde a detenção, mas quando chega aqui normalmente não demora mais do que dois dias", afirma a auxiliar jurídica Cecil Kakol, da corte central de Johanesburgo.Quando a reportagem chegou a esse tribunal, acabara de ser interrompido o julgamento de roubo, em que dois homens naturais do Zimbábue teriam assaltado um vendedor ambulante sul-africano próximo ao estádio Ellis Park. O caso continuaria à tarde, pois, até àquela hora (meio-dia), o intérprete não havia aparecido. "Os acusados não entendem os procedimentos", justificou Kakol.

Enquanto o magistrado analisava outro caso, ela explicava ao repórter da Gazeta do Povo as linhas gerais da nova ferramenta e, principalmente, sobre a sua corte. Por ser em Johanesburgo e estar localizada dentro do "Tribunal de Justiça" (Magistrate’s Court), a corte especial onde trabalha já havia julgado um número recorde de casos: 26. A maioria relativos a assalto ou roubo. "Cerca de 50% ficam nessas categorias. Mas há casos mais complicados", conta Kakol.

Cerveja

Nesse tribunal, o caso mais conhecido foi o de duas torcedoras holandesas detidas no Estádio Soccer City por estarem usando vestidos curtos de cor laranja, com o símbolo de uma cervejaria do país. Como a patrocinadora oficial da Copa é a Budweiser, a Fifa denunciou as duas por fazerem propaganda ilegal. Esse caso foi um pouco mais demorado: as garotas, detidas no dia 14, durante a partida entre Holanda e Dinamarca, só foram soltas no dia 22, após o julgamento. Lá, especula-se, a própria Fifa teria retirado a acusação porque o episódio estaria, ao contrário do desejado, aumentando a divulgação da cervejaria holandesa.

Nas nove sedes da Copa do Mundo, foram criados 54 tribunais especiais – chamados de Fifa Court, que tratam normalmente de delitos menores. Em Pretória, por exemplo, um peruano teve seu notebook furtado, mas o suspeito foi solto por falta de provas. Em Durban, um torcedor francês foi detido por dirigir embriagado. E, na mesma cidade, um fotógrafo indiano acusou um colega de trabalho de roubar seus equipamentos. A queixa foi retirada e a empresa para a qual a dupla trabalha chamou o acusado de volta à Índia. Segundo notícias divulgadas pela imprensa local, já houve até julgamentos por ameaça de bomba em Northern Cape.

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