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Cristiano Almeida e João Rodrigues ajudaram a preparar o mobiliário do Itaquerão para a estreia | Ana Luzia Mikos, enviada especial / Gazeta da Povo
Cristiano Almeida e João Rodrigues ajudaram a preparar o mobiliário do Itaquerão para a estreia| Foto: Ana Luzia Mikos, enviada especial / Gazeta da Povo

Interminável

O palco da abertura da Copa não está pronto. Mesmo com a presença das seleções estreantes no treino de hoje, o trabalho vai continuar. "Tem muita coisa para fazer ainda", garantiu o operário Evangelista Alves de Barros, 36 anos e há dois na obra. Ontem foi um entra e sai interminável de caminhões com diversas entregas, ajustes nos estandes dos patrocinadores, limpeza, decoração, instalações de divisórias. Até voluntários acabaram ajudando.

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"Eu sou morador da rua, andarilho, sou do trecho", explicou Cristiano Almeida enquanto colocava no pescoço um crachá de papel, preso por um barbante e com seu nome escrito à mão, diferente da cobiçada e moderna credencial da Fifa. Mas foi com essa identificação precária que ele e cerca de outros 100 moradores de uma casa de acolhida de São Paulo conseguiram o impensado acesso ao Itaquerão.

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E não foi um acesso qualquer. Os 14 mil convidados vips talvez nem saibam que Cristiano ajudou a montar o luxuoso espaço do jogo inaugural entre Brasil e Croácia, amanhã, às 17 horas. Só a "família Fifa" contará com cartolas das mais de 200 federações de futebol de todo o mundo que estão em São Paulo para o congresso anual da entidade.

A presidente Dilma Rousseff e outros chefes de Estado, políticos, estrelas internacionais e incontáveis subcelebridades devem brindar a estreia da Copa com alguma das dezenas de caixas de bebidas que chegaram aos montes – e às pressas – e que foram descarregadas ontem com a ajuda de um temporário necessitado.

"Eles passaram lá no nosso abrigo e nos chamaram. Tavam [sic] precisando de gente para trabalhar. Falaram que vamos montar o mobiliário vip, a decoração", explicou Cristiano, nascido em Pernambuco e que "faz tempo que saiu por aí".

O albergue se chama Arsenal da Esperança e atende 1,2 mil pessoas de vulnerabilidade social por dia. O pedreiro João Rodrigues já morou lá. "Agora arrumei a minha casinha, mas a gente fica lá na frente e sempre aparece alguém oferecendo trabalho", contou.

"Estão procurando muitas pessoas para trabalhar nesse período de Copa", explicou Simon Bernardi, um dos missionários da entidade que funciona há 18 anos. "Atendemos todos os tipos de necessitados, pessoas com dependência química, transtornos, doenças. Eles podem ficar até cinco meses. Oferecemos cursos, alimentação", completou.

"Acho que vieram quase uns 100 [homens] de lá para trabalhar. Nem acredito que vou entrar no estádio", disse o curitibano Reginaldo Almeida, que encontrou um "canto" para ficar no Arsenal. "Melhor do que na rua, né?", disse, enquanto pedia emprestada a caneta para corrigir seu nome. "Tá [escrito] Reinaldo", explicou.

O nome pouco importava para quem contratou a mão de obra de última hora por cerca de R$ 100 a diária – que pode chegar a 12 h – para compensar imenso atraso na preparação para estreia.

A funcionária responsável por direcionar os sem-teto não quis conversar com a reportagem. "Tá tudo atrasado. Preciso agilizar aqui, eles precisam entrar e comer ainda antes de trabalhar", afirmou, virando a sua credencial, também de papel, para não mostrar o nome.

Paulo Oliveira, como fez questão de frisar, era "controlador de acesso" (conhecido como porteiro), antes de ir para as ruas. "Entrei numas roubadas", admitiu, mas logo mudou o foco perguntando-se a seleção estaria no estádio ontem. Resignou-se com a resposta negativa. "Tudo bem, mas posso dizer que participei da Copa, mesmo assim, não posso?", perguntou. "Claro", respondeu outro colega batendo-lhe no ombro.

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