Magic Paula, um dos principais nomes do basquete brasileiro, toca um projeto esportivo com caráter social: exceção à regra| Foto: Rubens Chaves/Folhapress

Política

Projeto de cotas nos comitês olímpicos não atinge meta

Para tentar minimizar o abismo entre a quantidade de dirigentes do sexo masculino e do feminino nas entidades esportivas, o Comitê Olímpico Internacional (COI) estipulou, em 1995, que os comitês olímpicos nacionais teriam até o ano 2000 para chegarem a pelo menos 10% de mulheres em postos diretivos. A proporção deveria subir para 20% em 2005.

Longe de cumprir essa meta, ainda se discute se criar cotas mínimas ao gênero feminino são a solução. "Acho isso uma besteira. Colocar mulheres em cargos de gestão para preencher cotas é tapar os olhos. Tem de colocar uma mulher em um cargo porque ela está preparada para isso", diz Paula. Já Vicélia Florenzano se diz favorável. "Se não tivesse sido assim na política, não teríamos mulheres no Senado [atualmente, sete exercem o cargo. Desde 1997, os partidos têm de compor seus quadros com 30% de mulheres]. Senão teríamos de esperar muito mais para vê-las nesses postos", defende.

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A população feminina no mercado de trabalho brasileiro aumentou 10,2% nos últimos 12 anos. Elas têm, atualmente, maior taxa de escolarização em nível superior do que os homens (19,2% das mulheres têm um diploma, contra 11,5% deles). Mas o aumento da participação delas quando o assunto é a gestão esportiva está longe de acompanhar o mesmo ritmo, especialmente se tratando dos mais altos postos das instituições do esporte nacional.

INFOGRÁFICO: Veja o perfil das mulheres que ocupam cargos de dirigentes no esportes

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Nas 30 confederações es­­­­por­­tivas de modalidades olím­­­­picas, apenas a de ginás­­tica (CBG) tem uma mulher na presidência, Luciene Resende. Entre confederações e federações esportivas nacionais, só 7,8% têm mulheres no comando. Mandatária da CBG entre 1991 e 2008, a curitibana Vicélia Florenzano, 63 anos, diz acreditar que as mulheres precisam de um incentivo a mais para assumir postos de gerência esportiva, sem que isso se torne uma tripla jornada (trabalho formal, ocupação no esporte e cuidados com a família). "Ainda há um tabu muito grande em pagar dirigentes. Se houvesse remuneração, a mulher poderia tomar essa atividade como seu trabalho", diz a professora universitária aposentada e que há 42 anos atua na gestão da Federação Paranaense, conciliando por um período com a CBG.

A professora do mestrado em Gestão do Esporte da Uninove (SP), Euza Maria de Paiva Gomes, autora de pesquisas sobre a mulher nas instituições esportivas explica que uma das principais causas para a baixa taxa do gênero feminino no esporte é o fato de a estrutura ter nascido masculinizada (vale lembrar que quando o Barão de Coubertin criou os Jogos Olímpicos da Era Moderna, em 1896, vetou a participação feminina nas competições) e ainda manter muitos traços patriarcais. "Ainda pesa a escolha da construção da família, o cuidado com os filhos. Em cargos diretivos no esporte, precisam viajar muito."

As que enfrentam o desafio em geral são ex-atletas. É o caso de Paula, 50 anos, a Magic do basquete. Depois de deixar as quadras em 2000, o plano era se desligar do esporte. "Mas passou seis meses e não aguentei. Fui me especializar. Sempre fui muito crítica aos dirigentes, à falta de evolução e fui ver como é tudo isso. A lógica ainda é muito feudal. Tem muita gente se formando bons gestores, mas o mercado não absorve porque falta essa consciência de renovação. Também falta às mulheres terem mais arrojo", diz a ex-campeã mundial.

Atualmente, ela comanda o Instituto Passe de Mágica, que nasceu como um projeto de esporte social e hoje coordena o investimento de R$ 20 milhões anuais que a Petrobras aplica no boxe, esgrima, tae kwon do, levantamento de peso e remo. Em 2003, foi secretária de Esporte de Rendimento no Ministério de Esporte por seis meses. "Era política demais", reclama. De atleta a dirigente, conseguiu estabelecer uma rotina em que pode se dedicar mais às suas vontades pessoais. "A meta é focar mais no projeto social", fala.

Já Vicélia diz pensar em deixar o posto para poder olhar mais para a família. "Minha mãe está com 90 anos, quero ficar mais perto dela. Há pessoas na federação que vejo prontas para assumir meu posto. Mas, na última eleição, nenhuma se candidatou. Uma delas cheguei a convidar. Recusou porque quer ter o primeiro filho", diz.

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Futebol tem por regra virar as costas para o sexo feminino

Com a derrota de Patrícia Amorim na eleição para a presidência do Flamengo, em dezembro do ano passado, as mulheres perderam representatividade na principal competição do futebol brasileiro: nenhum dos 20 clubes da Série A do Brasileirão tem dirigentes do sexo feminino nos principais cargos diretivos.

Além dela, apenas Mar­lene Matheus havia comandado um time de Série A, o Corinthians entre 1991 e 1993. "No futebol, mais do que em outras modalidades, as mulheres vivem ainda sob o chamado teto de vidro [termo que ilustra a barreira invisível que impede o acesso de mulheres a cargos de liderança], em que elas muitas vezes se limitam a ocupar cargos da base hierárquica das organizações", explica a pesquisadora Euza Maria de Paiva Gomes.

Ao contrário de Marlene, que ascendeu à presidência pelo alinhavo político do marido, Vicente Matheus, seu antecessor no cargo, Patrícia rompeu essa barreira invisível com articulações políticas de engajamento. A ex-mandatária flamenguista foi vice-presidente dos departamentos de remo e de esportes olímpicos e atleta de renome do clube – como nadadora, competiu nos Jogos Olím­­pi­­cos de Seul, em 1988.

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