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Surfista no amanhecer de Matinhos, um dos principais picos do país.Ondas levam o esporte contra a tendência antidoping | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Surfista no amanhecer de Matinhos, um dos principais picos do país.Ondas levam o esporte contra a tendência antidoping| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Contra estereótipo, surfistas exaltam o profissionalismo

O exame antidoping no circuito mundial já nasceu com uma po­­lêmica: a possibilidade de liberação das drogas sociais, como por exemplo da maconha.

Embora o uso da substância se­­ja defendido por alguns atletas por não melhorar o desempenho atlético do surfista, a decisão so­­bre como será tratado o assunto ainda está envolto em dúvidas.

Os próprios dirigentes da As­­sociação de Surfistas Profis­­sio­nais (ASP) divergem em suas de­­clarações. Contudo, para os pra­­ticantes do país, o ponto não deveria mais ser uma preocupação – apesar do estereótipo de "liberal" da mo­­dalidade.

"Hoje os surfistas viajam com personal trainer, tem uma imagem para zelar com seu patrocinador. Não dá para você brincar de ser profissional. Tem de ser mesmo", afirma Pe­­ter­­­­son Rosa, que não acredita que os surfistas da elite usem dro­­gas consideradas recreativas. "A maconha não traz benefício nenhum no surfe, mas não acredito que usem, pois o esporte está muito mais profissional", completa ele, o maior campeão brasileiro.

A opinião é semelhante à do curitibano Peterson Crisanto, de 20 anos, também conhecido co­­mo Petersinho."O surfista profissional de hoje deixou de ser doidão ou chapado, como as pessoas enxergavam, há muito tempo. Se você passar um tempo com os atletas que disputam o world tour [circuito mundial] você ficará es­­pantado com a organização e comprometimento deles", diz.

Baseado nesse histórico é que a divergência sobre o uso da ma­­conha continua, inclusive dentro da ASP. Recentemente o ge­­ren­­te da entidade, Renato Hi­­ckel, declarou à revista IstoÉ que o surfista pego no exame com a toxina só deverá ser punido na terceira vez. Renato Perdigão, di­­retor regional da entidade não concorda. Afinal, se um dos objetivos do antidoping é ajudar o surfe a ser esporte olímpico, a liberação da maconha põe por terra o sonho.

"Não vou ser hipócrita de dizer que não tem [estigma do surfe com as drogas] e se você abre esse precedente bota o dedo na ferida. O su­­jeito vai falar: conta essa história di­­reito. É que nem se a sua filha chegar em casa com uma barriga enorme e diz que comeu demais no almoço. Pô, peraí, tem alguma coisa por trás disso", exemplifica Perdigão, com uma dose de bom humor.

Enquanto o circuito mundial de surfe começou a realizar o exame antidoping nesta temporada, desde o ano passado os testes deixaram de ser feitos nas competições ocorridas no Brasil.

Um dos precursores do controle ao uso de substâncias proibidas – nas praias brasileiras os testes entraram na lei em 2004 –, o país pegou a contramão da história por falta de estrutura. E dinheiro.

De acordo com a As­­sociação Bra­­sileira de Surfe Pro­­fis­­sional (Abrasp ), a decisão foi tomada pela inexistência de um tribunal de justiça específico. Dessa forma, se o atleta fosse punido, não tinha co­­mo garantir a ampla defesa – preceito básico do direito.

"A gente pediu que a Confe­­de­­ração Brasileira de Surfe [CBS] fi­­zesse um tribunal, pois ela é a única que pode instalar isso. Como ain­­da não avançou, foi uma ma­­neira de pressão [não realizar o exa­­me em 2011]", diz Marce­­lo An­­drade, executivo da Abrasp.

A única punição por doping aplicada pela associação foi dada a Jihad Kohdr, que em 2007 perdeu o título brasileiro por se negar a par­­ticipar da coleta para averiguação clínica. A discussão acabou na esfera cível, as partes chegaram a um acordo, mas o troféu não voltou ao atleta de Matinhos.

"O Jihad buscou seus direitos alegando que a questão toda tinha de ser julgada pelo tribunal [desportivo]. Então não adianta fazer o exame no cara, pois não tem quem decidir pela punição ao atleta, ele não tem instância para recorrer... Como funciona isso? Daí o cara entra na justiça e a gente tem um des­­gaste grande", fala Andrade.

Jihad foi punido tendo como base o livro de regras da entidade. O caso acabou levado ao Su­­pe­­rior Tribunal de Justiça Desportiva, que rejeitou a pauta por ser "apenas de futebol". "Essa é a minha maior bronca, não havia um tribunal para decidir isso e mesmo assim ele perdeu o título", afirma Rodrigo Tusca, na época o empresário da promessa das ondas.

A versão da CBS é de que o problema não seria a falta de um colegiado – mas sim de dinheiro, já que os testes custam caro, e quando o patrocinador não banca, a prática se torna inviável.

"Nós continuamos fazendo o exame nas competições de base", assegura o presidente da entidade, Adalvo Argolo. Ele aponta esse fa­­tor como um dos motivos para que não se tenha tido nenhum caso de doping confirmado entre os profissionais nos anos em que os testes foram realizados. "No Filipe To­­le­do, campeão mundial mirim, por exemplo, a agência internacional antidoping [Wada] fez um exame surpresa na casa dele."

Uma das razões para a implantação dos testes no surfe mundial seria possibilitar que a modalidade se torne olímpica. No caso do Bra­­sil, isso garantiria uma verba extra do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). Mas, mesmo sem a verba, a Abrasp garante que este ano retomará a vigilância nos atletas. "Es­­tão tentando ver isso, pois não é muito barato. O surfe não é olím­pico, não tem dinheiro, vive fazendo torneios com apoio de prefeituras ou marcas do próprio surfe. Mas vamos voltar a fazer o exa­­me neste ano", promete Andrade.

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