Dida, diretor do sindicato paranaense, cobra participação| Foto: Andre Rodrigues/ Gazeta do Povo

O calendário caótico do futebol brasileiro despertou, nos últimos dias, a irritação de alguns dos principais jogadores do país, como Alex e Juninho Pernambucano, e deixou evidente uma realidade política dos gramados: o distanciamento entre os boleiros e as suas entidades de classe. Embora apontem para a mesma direção, a reivindicação dos atletas e a atuação sindical caminham separadamente, o que deixa mais distante uma solução para este e outros problemas da profissão.

CARREGANDO :)

"As manifestações públi­cas são importantes para dar visibilidade ao problema e como forma de pressão, mas entre a manifestação pública e o efetivo envolvimento, tem uma certa distância. O ambiente político é sempre desfavorável", diz Rinaldo Martorelli, presidente da Federação Nacional de Atletas Profissionais de Futebol (Fenapaf). "Por isso não creio em medida extrema. Quando a coisa começa a engrossar, não há uma paralisação, que seria ideal. Até mesmo os mais consagrados, com condição profissional e financeira que possibilite isso, recuam", complementa.

Ex-goleiro, Martorelli atua no meio sindical desde 1993, dois anos antes de encerrar a carreira. Participou ativamente da elaboração da Lei Pelé e da expansão de entidades de classe pelos gramados brasileiros. Hoje, a Fenapaf tem debaixo do seu guarda-chuva 18 associações estaduais. Em todas, o cenário é semelhante: muitos problemas e pouco engajamento.

Publicidade

"A maioria dos contatos da capital é por causa do dinheiro da televisão. Do interior é para procurar ajuda e orientação na parte jurídica após o rompimento do contrato", explica o ex-jogador Dida, diretor do sindicato local.

Em funcionamento desde 2003, sempre sob a presidência de Nivaldo Carneiro, o Sindicato dos Atletas Pro­fissionais do Paraná só foi regularizado no ano passado, quando obteve seu registro sindical. A primeira grande demanda foi garantir o repasse, previsto por lei, dos 5% dos contratos de televisão para os jogadores. Uma tarefa relativamente fácil no Campeonato Brasileiro, mas árdua no Paranaense.

"Os clubes não repassa­ram o dinheiro de 2012. Con­­seguimos parcelar em oito vezes, agora estão pagando. Combinamos com a Federação de já no arbitral ser feito o pagamento de 2013", explica Dida, que vê em Alex e Lúcio Flávio dois expoentes da articulação de jogadores no estado. "Falamos bastante com o Lúcio, ele sempre está aqui. No caso dos salários atrasados, prestamos apoio, mas a ação do sindicato é limitada."

Brigar para receber dinheiro de TV e encampar reivindicações são apenas parte das atribuições de sindicatos mais antigos e consolidados no exterior. Fundada em 1907, a Associação dos Jogadores Profissionais da Inglaterra (PFA, na sigla em inglês) conseguiu, no início da década passada, o apoio de mais de 90% dos boleiros britânicos na renegociação do repasse dos direitos de transmissão da Premier League para a classe.

A entidade ainda mantém parcerias e programas de ajuda a jogadores em atividade e aposentados. Com o apoio de duas faculdades, a PFA paga curso superior de fisioterapia e ciência do esporte de ex-atletas. Também financia tratamento para jogadores machucados.

Publicidade

Na Argentina, o Sindicato de Jogadores de Futebol tem no seu currículo paralisações dos torneios no país por causa de atrasos salariais e violência. No Uruguai, o não pagamento a jogadores de Nacional e Peñarol, os dois maiores clubes do país, desencadeou uma convocação de greve em 2009. A paralisação só não se concretizou graças à intervenção de um empresário, que emprestou dinheiro aos times.

Situações que dificilmente serão vistas no Brasil. Menos pela pouca tradição de mobilização dos jogadores. Mais pela cultura sindical do país.

"É algo que não pode ficar restrito somente aos atletas. Na Argentina os caras fazem panelaço a todo momento. Também sou advogado e não consigo mobilizar a classe para melhorar as condições de trabalho. Os médicos só se levantaram [contra o programa Mais Médicos, do governo federal] porque mexeu no bolso deles", compara Martorelli. "O brasileiro não vai na assembleia do condomínio, mas depois xinga o síndico. Nossa independência é a única do mundo em que não se derramou uma gota de sangue", finaliza.