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  • Lance da partida que marcou oficialmente o adeus do Colorado. Empate com o Coritiba amenizou fim vergonhoso
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    No ritmo de uma marcha militar, típica do período de exceção, vinha a melodia: "Colorado a tua história é o orgulho do seu torcedor/ Três tradições do passado em um presente de garra e amor/ Tua torcida gigante vai do mais humilde até o doutor/ És a alegria do povo. É o time do trabalhador/ Colorado, Colorado, teu acervo não tem outro igual..."

    O hino boca-negra – só festejado uma única vez (no título dividido do polêmico Paranaense de 1980) – não deixa de ser um resumo da breve história do clube. A letra valoriza a tradição popular do Ferroviário, assim como possíveis virtudes de Palestra Itália e Britânia – agremiações que deram origem, em 1971, ao extinto Tricolor. Em tom profético, a estrofe ainda acerta ao afirmar que não existe acervo igual.

    Até o dia 8 de julho de 1989, data da última partida oficial do "Tricolaço da Vila Capanema", a agremiação foi uma grande fonte para o folclore esportivo. Protagonizou cenas tristes, como a morte do lateral Valtencir durante uma partida (em 1978); e ficou marcada por histórias pitorescas: foi três vezes consecutivas vice-campeã do estado (74-75-76); vencia por 4 a 0 o Atlético e viu o atacante Ziquita empatar com quatro bolas na rede em menos de 15 minutos (78); foi zombada quando sofreu gol de goleiro (80); formou o fracassado ‘seleboca’ (84)...

    Mas há exatamente duas décadas, completadas nesta semana, a trajetória inusitada chegava ao fim de forma melancólica. Com apenas 2.184 pagantes, a equipe vermelha, preta e branca empatou por 3 a 3 com o Coritiba para escapar do rebaixamento no regional. Em 24 jogos no certame local, apenas três vitórias. Terminou na penúltima posição entre 18 participantes. Foi um sufoco vexatório até o heroico duelo com o rival do Alto da Glória.

    Na rodada anterior, dia 2/7/89, o último triunfo – bateu o Cascavel por 1 a 0, gol do zagueiro Ariomar. Para evitar o vexame, seria preciso pelo menos um ponto contra o todo poderoso Coxa de Serginho, Tostão, Carlos Alberto Dias, Chicão e Kazu. Chegou a fazer 3 a 1, mas não resistiu ao talento do rival que viria depois a erguer a taça da temporada.

    Os fãs – tão exaltados no hino – já haviam abandonado o time antes mesmo dessa despedida sem aviso prévio. Diante da pífia campanha, chegou-se a registrar um público de 469 pessoas, com renda minguada de 1.528 cruzados novos (para se ter uma ideia, um Fusca 1.500, ano 73, custava à época 4.500).

    "Não lembro de muita coisa... Engraçado, tem coisas que a gente apaga da memória. Mas o Colorado sobreviveu naquele período graças aos bingos no fim de semana. O desfecho melancólico, sem apelo, com a torcida desmotivada, era inevitável. O clube nem deveria ter nascido, foi um erro estratégico. Não deixa saudades. Chegou aos 18, alcançou a maioridade, e se foi", atesta o publicitário Ernani Buchmann, um dos dirigentes do clube durante a fase de encerramento. "Ficou o folclore", fecha.

    Prova da precariedade foi a manobra para ajeitar o comando técnico. Ari Marques precisou deixar a lateral direita para assumir o posto de treinador. "Era o mais experiente dentro de um grupo jovem. Vários meninos subiram do júnior para evitar a queda. Sabia do burburinho em torno da fusão, mas a intenção era salvar o Colorado do fiasco", conta ele, símbolo maior dos boca-negras, com 17 anos envergando a camisa tricolor, apelidado até de "Coração da Vila".

    Quem estava no campo reforça o desespero final. "Era tudo no fio do bigode. Os jogadores passavam muita dificuldade financeira. Eu tinha 18 anos e estava feliz de jogar, mas sabia de muitas coisas erradas. Alguns atletas dormiam no alojamento do Durival Britto, sem estrutura", lembra Ednélson, um dos presentes no "jogo do adeus" frente ao Coritiba. "Não tinha noção que aquela partida seria a última. Foi um sufoco. Saímos ganhando, eles empataram e eu fui expulso ainda."

    Com o alívio dentro de campo, a diretoria bancou um churrasco nas dependências do estádio para o elenco. Prometeu dobrar o bicho de 50 mil cruzados – ninguém se lembra de ter recebido, apenas recordam da festa regada a carne e cerveja. Os cartolas, então, em busca de calendário, agendaram amistosos no interior e em Santa Catarina. Também faziam alguns negócios emergenciais.

    "Como ainda existia o passe, a gente emprestava 90% do elenco para outras equipes, fazia caixa e não deixava ninguém parado", explica Amilton Stival, então diretor de futebol.

    Exatamente cinco meses depois, o Colorado deixou de existir como personalidade jurídica – mantém-se vivo apenas pelos casos lendários que provocou e o saudosismo. Em dezembro, uniu-se com o Pinheiros e deu origem ao Paraná. Ainda hoje, há quem diga que boca-negra de verdade não senta em cadeira azul do Durival Britto.

    Último jogo do Colorado

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