• Carregando...
Manifestantes deitaram de mãos dadas no calçadão por cerca de meia hora | LUISA DE PAOLA/ AFP PHOTO
Manifestantes deitaram de mãos dadas no calçadão por cerca de meia hora| Foto: LUISA DE PAOLA/ AFP PHOTO

Rio – Os olhos do ajudante de construção Cláudio Luiz Filho brilham quando o assunto é a quais competições dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro ele pretende assistir. "Vôlei, natação, judô... Agora bonito mesmo vai ser a abertura no Maracanã. Vai ser lindo", sonha.

Paraibano de Campina Grande, Cláudio mudou-se para o Rio em 2004 com a mulher e a cunhada para trabalhar na construção civil. Seis meses depois, começou a trabalhar na obra da Vila Pan-Americana, em Jacarepaguá. Fica no canteiro das 7 horas da manhã às 8 horas da noite, sem contar um trajeto de 60 minutos de ônibus. Ainda assim, não se arrepende. "Vale a pena. Lá na Paraíba não tem trabalho", afirma.

Hoje, o Brasil depende dele e de um batalhão de operários – a maioria também oriunda do Nordeste, moradora de bairros afastados da Cidade Maravilhosa, como Rio Comprido e Rio das Pedras – para evitar um vexame retumbante na organização da maior competição esportiva já realizada no país.

A 96 dias da abertura dos Jogos, o Comitê Organizador do Pan e a prefeitura do Rio ainda correm contra o tempo para entregar as obras antes do primeiro atleta colocar os pés nos locais de competição. Os prazos iniciais, que previam a finalização das instalações com antecedência de até dois anos em alguns casos, se perderam no pó das construções. O mesmo vale para os eventos-teste, esquecidos ou remarcados para datas próximas ao Pan – o Maracanãzinho, por exemplo, será experimentado em 1.° de julho.

Na correria contra os atrasos, até o conceito de obra concluída foi adaptado. "Você quer mesmo ir lá? A obra já está pronta", foi a resposta da assessoria da Agenco, empresa responsável por erguer a Vila Pan-Americana, ao pedido de autorização para visitar e fotografar o condomínio que irá abrigar os atletas em julho.

Basta entrar na Vila, porém, para perceber que "quase pronta" definiria com mais realidade a obra. Os 17 prédios estão em pé, os apartamentos já foram finalizados. E só. As moradias ainda precisam de acabamento interno. Nas áreas de circulação ainda há muito a ser feito. No lugar onde ficarão as ruas e áreas de circulação, apenas uma areia muito fina, parecida com talco – que sobe e gruda na calça a qualquer passo. O restaurante projetado para receber 4 mil atletas é, por enquanto, apenas uma área pavimentada. O mais provável é que se repita o que aconteceu na Vila Olímpica dos Jogos de Atenas, em 2004, quando a poucos dias da abertura – com algumas delegações já hospedadas – operários faziam os últimos ajustes de paisagismo.

Madrugada adentro

O "pronto" usado para definir uma obra que ainda precisa de muitos ajustes é facilmente compreendido com uma olhada no Complexo do Autódromo de Jacarepaguá, sede do velódromo, patinação, basquete, ginástica, natação, pólo aquático e saltos ornamentais. Prejudicada por uma briga jurídica entre a Confederação Brasileira de Automobilismo e a prefeitura do Rio, a construção de R$ 300 milhões só foi deslanchar no fim de 2006. Neste ano, duas paralisações de funcionários conturbaram um pouco mais os trabalhos, que têm avançado até 4 horas da manhã. Em virtude dos manifestos, os operários não estão autorizados a dar entrevista.

O estágio atual das obras assusta. É difícil para quem vê de fora ter a mesma certeza dos engenheiros e fiscais de obra de que tudo estará pronto para os Jogos. O velódromo, embora já coberto, é, hoje, apenas uma grande base de concreto, onde serão colocadas a pista e a arquibancada.

A arena esportiva, casa do basquete e da ginástica, está em um ponto mais avançado. O enorme galpão já tem boa parte das cadeiras colocadas. Do início da manhã até o meio da madrugada, os quase 500 operários (divididos em dois turnos) convivem diariamente com um forte cheiro de pó, tinta e cimento para instalar a parte elétrica, pintar as paredes e, já na reta final, montar o piso da quadra.

Nas piscinas a situação é semelhante. O local de competição está pronto. Até água já foi colocada no enorme tanque de 50 metros de comprimento por 25 metros de largura, com capacidade para 3,6 milhões de litros. A água verde claro que será retirada nos próximos dias é um convite tentador aos operários. Muitos se jogaram na piscina para se refrescar do calor, o que obrigou a prefeitura a colocar seguranças no local.

Última hora

Apesar do sentimento geral entre os responsáveis pelas obras do Pan de que tudo ficará pronto em tempo, há a idéia velada de que toda a correria poderia ter sido evitada. "Tem de terminar no prazo. Estamos com mil homens trabalhando 24 horas por dia. Deveria ter começado antes. Agora teremos de fazer em um mês e meio o que deveria ser feito em três meses", afirmou um engenheiro responsável pela obra do Maracanãzinho, que pediu para não ser identificado por temer alguma represália da direção da Superintendência de Desportos do Rio de Janeiro (Suderj). Somente o presidente da agência municipal, Eduardo Paes, está autorizado a dar entrevista sobre o ginásio.

Enquanto as fontes oficiais dão a conclusão das obras em tempo como algo certo, cabe ao exército de operários – Cláudio Luiz Filho entre eles – tornar a promessa dos dirigentes possível.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]