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O jogador Paulo Rink e o cidadão Paulo Roberto são a mesma pessoa. Mesmo habitando profissionalmente por 18 anos o mundo da bola (cheio de peculiaridades) o homenageado da noite parece ter sido "ele mesmo" durante este tempo todo. Boleiro, líder, família, tudo misturado num camarada "gente boa". Mesmo assim, pendurando as chuteiras, a porção jogador vai saindo de cena aos 34 anos. Ficam somente as histórias.

"O Paulo era o nosso ‘boca de caçamba’. A gente brincava muito, cabe uma prancheta na boca dele", entrega Ricardo Pinto, mais de uma década depois, na brincadeira preferida entre os boleiros: apelidar os outros.

Parceiro do goleador no bem-sucedido Atlético de 1995/96, o ex-goleiro – atualmente treinador, aos 42 anos – enxerga o quase ex-camisa 11 como um agregador. Pendurar as chuteiras com uma festa em que fez questão de chamar os amigos de todas as épocas não deixa dúvidas do porquê da definição. "Isso é bem típico dele. Já reunia a turma nos churrascos".

Entre os convidados, alguém que dividiu o "pão rubro-negro que o diabo amassou" com Rink e que, naturalmente, na hora da mordomia não poderia ficar de fora.

"Eu lembro dos tempos em que a gente treinava no Pavoc, em São José dos Pinhais, lá o filho chorava e a mãe não via. Era complicado", recorda o ex-lateral do Atlético Gune, 36 anos, que viu subir dos juniores o garoto que servia o Exército no início dos anos 90.

Mas nem os conhecimentos militares poderiam salvar o menino de uma enrascada típica do futebol. "A gente tinha um zagueiro chamado Fião, um baita negrão forte. Quando rolava coletivo com os times de baixo, ele já esfregava as mãos de alegria e dizia ‘hoje tem carne fresca’. Começava o jogo e já ia ripando. E o Paulo era uma das vítimas preferidas", conta Gune.

Como sugeriu o ex-lateral – que agora cuida de 250 moleques da escolinha do Furacão em Guarapuava, interior do Paraná – as "chegadas" de Fião certamente aperfeiçoaram o estilo de Rink, que se tornou um atacante forte na área, um tanque sem medo dos botinudos. Sem perder o jeito bom moço, claro.

"Ele sempre foi muito respeitoso com a arbitragem e leal com os companheiros", declara Clésio Moreira dos Santos, o Margarida, árbitro profissional e showman que vai comandar o amistoso entre o Atlético e os amigos de Paulo Rink.

Deixar de lado essa vida e entrar para a história não abala Rink. "Para falar a verdade, acho que a ficha vai demorar a cair. No momento, só estou pensando em ajudar todo mundo, fazer uma festa boa para os meus amigos".

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Os preparativos para a festa de hoje, às 19h40, na Arena, consumiram tanto planejamento e esforço que o baque da despedida só começará a dar sinais amanhã. Um despertar sem a rotina dos treinos, a emoção dos jogos, a adrenalina dos gols. Terá acabado o combustível responsável por mover Paulo Rink nos últimos 18 anos como profissional.

"Eu não estou preparado. Mas se chorar, será nos ombros dos amigos", amenizou Paulo Rink.

Ele não chegou a sentar, pôr o pé no chão e se dar conta que está parando. É o que conta a esposa Raquel, apenas uma das partes da família Rink também atingida pelo adeus. Um clã apaixonado pelo Atlético que viu a vida transformar-se pelo talento do Paulo Roberto. Assim Jilcy Mara chama o filho famoso, orgulho dos parentes, querido das irmãs, herói do avô que levou para campo a disciplina e a dedicação precoces.

Os atributos desenharam o perfil do garoto correto, do bom moço. Paulo Roberto sempre foi tão certinho que o avô Cyro Joly vasculhou a memória e só foi encontrar uma travessura há mais de três décadas, quando Rink tinha menos de três anos.

"Morávamos no 21.º andar e ele sumiu. Ficamos desesperados e depois de uma hora o encontramos debaixo da cama, só que segurando no estrado, por isso quando procurávamos antes não achávamos", lembra o grande incentivador.

Foi graças a seu Cyro que Paulo Rink assistiu a um jogo pela primeira vez. Segurando a mão do avô de um lado e uma bandeirinha do Atlético do outro, o impacto inicial foi justamente num Atletiba, nos anos 80. "Ele ficou eufórico, sempre adorou as cores rubro-negras. Na nossa família todo mundo é atleticano, à exceção de um cunhado do Paulo", conta, envaidecido da linhagem. Anos mais tarde, ele veria o neto marcando dois gols contra o maior rival. Um êxtase.

Foram 80 gols no total, a sétima melhor artilharia rubro-negra, suficientes para despertar as lágrimas fáceis do vô coruja. Para o pai, Gérson Rink, o ápice foi assistir ao filho defendendo a seleção alemã na Eurocopa, em 2000.

Em casa os gols eram disputados pelos filhos, especialmente os marcados na Alemanha, onde nasceram. Um era dedicado para Gustavo (9 anos), outro para Guilherme (6). E esse foi um dos motivos para Paulo Rink adiar a aposentadoria.

"Ele queria que os filhos curtissem tudo isso. Eu estou até meio triste por um lado, por não vê-lo mais entrar em campo, por toda aquela preparação. Parece que a gente se concentrava junto, vivia o nervosismo em todos os jogos", conta Raquel.

Ela, que se acostumou a torcer, agora prepara o escritório do marido à nova função de executivo. Reforça o guarda-roupa com camisas e ternos enquanto acha espaço para guardar definitivamente as chuteiras.

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