Amor incondicional pelo futebol americano

Coritiba Crocodiles e Curitiba Guardian Saints se enfrentaram no sábado (26/3), e apesar do choque de realidade dos dois clubes, os atletas de ambos os times deram mostras de um amor incondicional pelo futebol americano. Nós acompanhamos a preparação das equipes para este jogo, e com o mesmo amor que eles sentem dentro de campo, relatamos o que vimos a vocês neste texto especial. (VEJA galeria de fotos do jogo)
O que te faz sair de casa às sete horas da manhã de um sábado de feriado? Deixar esposa e filhos em casa na véspera da Páscoa, vestir seu equipamento, entrar em campo, e por pouco mais de duas horas “trombar” com desconhecidos. Para um leigo é loucura, afinal, um esporte em que homens lutam ferozmente para conquistar território, e levar uma bola oval até a zona final do campo do adversário parece algo insano. Parece, mas não é!

No embate entre dois times de Curitiba, pela segunda rodada do Campeonato Paranaense de 2016, um turbilhão de sentimentos envolveu os participantes desde o início da semana. Se de um lado havia o Coritiba Crocodiles, bicampeão brasileiro, e um dos maiores clubes do país, do outro o não menos admirável Curitiba Guardians Saints demostrava amor e dedicação singular pelo esporte. Mandante do jogo e responsável pela festa (pois um jogo de futebol americano sempre é uma festa) deu mostras que está no caminho certo, e com a organização, experiência e foco, que tornaram os Crocodiles grandes, tem tudo para chegar lá.

Exemplo de amor ao FA e ao próximo: o time dos Guardians Saints não tem esse nome à toa. Surgiram de um projeto social em uma região carente de Curitiba, foram até a Região Metropolitana, e hoje atuam em um bairro que demostra carinho pelo time. O amor e dedicação que os membros do time passam no dia a dia são emocionantes. O quarterback Carlos Xavier, por exemplo, além de lançar as bolas e cuidar da parte de mídia do time, nos confidenciou que até já pintou as linhas do campo. Maycon Ferreira, ex-atleta e hoje dirigente da equipe, nos dias de jogos acumula os cargos de segurança e “bilheteiro”, para garantir que o jogo ocorra de maneira tranquila. Todos fazem algo extracampo, assim como o Rafael no marketing e redes sociais, e tantos outros que fizeram a partida ser possível.

Segundo Xavier, o “amor pelo esporte supera qualquer ausência em casa”, e graças ao apoio da “comunidade Guardian Saints”, formada por namoradas, esposas e amigos, o clube ainda está na ativa. Vale ressaltar que após a chegada do paraibano Alberto Magno Filho, ex-técnico do Treze Roosters, o time cresceu e chegou a semifinal da Copa Sul de 2015. A evolução do time, que até 2013 só disputava torneios de Flag e Off Pads, é grande, e se depender do amor dos dirigentes, atletas e torcida (sim, eles tem uma torcida animada), o time ainda será muito maior.

Exemplo para o Brasil: do outro lado estava um dos maiores clubes de futebol americano do Brasil, o Coritiba Crocodiles. Fundado em 2003, e um dos pioneiros da modalidade full pad no país, o time é Penta campeão paranaense, e domina a Conferência Sul desde o início dos torneios nacionais. O Bi campeão brasileiro esteve presente em quase todas as finais dos maiores torneios do país, e é o favorito para a conquista do título brasileiro deste ano.

Na partida do último sábado, “apenas” três integrantes da seleção brasileira (pois o número de jogadores que o Crocodiles cede à seleção é bem maior) atuaram, dificultando ainda mais a vida do adversário, e dando mostras da potência que o time é.

Conversamos com eles, e além de muito simpáticos e humildes, demonstraram o mesmo “brilho nos olhos” dos adversários menos famosos, dando um show de fair play e amor ao esporte.

Adan Rodriguez, o popular “Ocho Nueve”, falou a respeito do início dele no futebol americano, na época em que ainda treinavam no Parque Barigui (como hoje os Guardians Saints fazem), e quando perguntado sobre o porquê de estar ali em um sábado de feriado, foi taxativo: “É o amor pelo esporte, o Crocodiles é minha família, e o futebol americano é minha religião!”

Já Fernando Alves, atual Coordenador de Linebackers da Seleção Brasileira, e jogador do Crocodiles, vai mais longe. Para ele o salário dos jogadores é o “tempo de jogo e as repetições das jogadas em campo”, pois o amor fala mais alto. Fernando ainda falou a respeito do crescimento do esporte, e de vislumbrar um “futuro remunerado” para seus atletas da categoria de base.

Outro jogador que disputou o mundial pelas Onças foi o atual vice-presidente do Clube, Delmer Zoschke, que além de ser muito solícito, demonstrou porque tanta gente ama esse esporte.

“O que nos torna menos amadores que os outros times são o treinamento e a seriedade. Tivemos a oportunidade de treinar com Johnny Mitchell, ex-jogador do New York Jets e do Dallas Cowboys, que nos conheceu vendendo rifas na Rua XV. Ele nos viu treinar, gostou e virou nosso técnico. Deu um “up” no time e fomos campeões brasileiros”, falou Zoschke.

Sobre a seleção foi ainda mais notório o orgulho do que sente pelo que faz, e perguntado sobre como é representar o país em um Campeonato Mundial, respondeu: “Ao contrário do que muitos pensam não é só um orgulho, mas é o prazer de colocar o nome do seu país na mídia, afinal ninguém dava atenção para o futebol americano brasileiro até vencermos o Chile, depois o Uruguai, até conquistarmos a vaga para o mundial vencendo o Panamá na casa deles. Por sermos amadores, é o máximo que podemos conquistar. Termos a honra de representar nosso país!”

O placar do jogo não é o mais importante (terminou 66-0 para os Crocodiles), afinal a disparidade dos times é enorme. Mas garanto a vocês, que pelo que vimos de ambos os times, desde os treinos, que começam as 22h30 de quarta-feira e não tem hora para acabar, com certeza no amor pelo esporte eles empatam. E não é um amor qualquer, é um amor incondicional, que ultrapassa vaidades, fazendo com que todos se tornem irmãos dentre de campo.