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Figuras de esquerda têm espalhado uma informação falsa sobre a cabeleireira Débora Rodrigues, conhecida por ter escrito a frase “Perdeu, Mané” na estátua da Justiça que fica em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal: a de que ela só se tornou ré porque havia recusado um acordo que a livraria da prisão.
A afirmação usa uma verdade para construir uma mentira.
A verdade: muitos réus do 8 de janeiro rejeitaram um acordo que envolveria o pagamento de uma multa e o não-uso de redes sociais por dois anos, além de uma confissão de culpa. Em troca, eles não se tornariam réus.
A mentira: Débora Rodrigues, para quem Alexandre de Moraes pediu uma pena de 14 anos de prisão, estaria nesse grupo.
14 anos por pichar estátua
Em 17 de março, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso afirmou que, de aproximadamente mil investigados a quem o acordo de não-persecução penal foi oferecido, 527 recusaram a proposta.
Nos últimos dias, depois que o ministro Alexandre de Moraes votou por condenar a cabeleireira Débora Rodrigues a 14 anos de prisão, a fala de Barroso foi usada por figuras de esquerda para afirmar que Debora Rodrigues poderia estar livre se tivesse aceitado o acordo.
Com 92 mil seguidores na rede social X, o perfil "Senhora Rivotril" escreveu em 21 de março: “O que leva uma mulher, que é mãe, a não aceitar a transação penal oferecido para todos: o que é 2 anos sem redes sociais? (fácil), R$ 5 mil de multa (família faz uma vaquinha na internet) e fazer curso sobre democracia (super fácil)? Só uma fanática não aceitaria”.
A mensagem teve 2,6 milhões de visualizações e ultrapassou os 4 mil compartilhamentos, muitos deles com comentários jocosos sobre Débora.
O jornalista Xico Sá, do ICL Notícias, comentou a publicação: "O staff bolsonarista trabalha para que as pessoas não aceitem", ele escreveu. Sá tem 1,6 milhão de seguidores no X.
Outro comentário, com mais de duas mil curtidas, um usuário do X comemorou: “Bem feito! Gente burra tem que se ferrar pra aprender”.
Fake news na TV do PT
Durante a transmissão do julgamento que tornou Jair Bolsonaro réu por arquitetar um golpe de Estado, uma comentarista da TV PT (mantida pelo partido com recursos do fundo partidário) também repetiu a informação falsa.
Entrevistada ao vivo, a cientista política e militante petista Gisele Citadino replicou a mentira. Ela disse que quem rejeitou a oferta foram pessoas que "depredaram o patrimônio público", o que não é verdade.
Gisele também afirmou especificamente que Débora Rodrigues recusou o acordo.
“‘A ela foi oferecida a possibilidade de abandonar as redes sociais por dois anos, assinar o documento dizendo que ela em alguma medida se arrependia (...), acho que no caso dela ela usaria uma tornozeleira eletrônica (...). Ela se recusou a assinar. Ela podia estar em casa cuidando das crianças”, afirmou, sem ser corrigida pelos apresentadores.
PGR não ofereceu acordo a Débora
Em nota à imprensa, a Procuradoria-Geral da República esclareceu que não houve proposta de não-persecução penal no caso de Débora Rodrigues.
A oferta foi feita sobretudo a pessoas que estavam acampadas em frente ao quartel-general do Exército e que não participaram dos atos de depredação na Esplanada dos Ministérios. Eles haviam sido enquadrados nos crimes de incitação e associação criminosa.
Débora, que foi fotografada do lado de fora do STF durante a invasão aos prédios da Esplanada dos Ministérios, responde por crimes mais sérios: abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de estado, associação criminosa armada (além de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado).
Reação da OAB
O voto de Alexandre de Moraes provocou críticas até mesmo de setores da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) — geralmente cautelosa em suas críticas ao STF.
A presidente da OAB do Rio de Janeiro, Ana Tereza Basílio, assinou uma nota em que demonstra preocupação com uma possível pena excessiva a Débora Rodrigues.
Para ela, o caso é “preocupante”: “”O entendimento compartilhado pela denúncia e pelo voto do ministro Moraes é, sob o aspecto técnico-jurídico, preocupante: não individualiza condutas e responsabiliza a todos, indistintamente, pelas condutas alheias de violência e ataque às instituições. Com relação a dosimetria da condenação, não parece seguir qualquer critério aferível”, diz a nota.
“Espera-se que esse julgamento não represente um retrocesso histórico no âmbito do processo penal, que deve ser justo e técnico para todos, seja qual for a inclinação política”, afirma ainda o comunicado.
Colunista da Folha de S. Paulo e crítico de Jair Bolsonaro, o jornalista Elio Gaspari também afirmou que Moraes se excedeu ao votar por uma pena de 14 anos para Débora Rodrigues.
Após o voto de Moraes (acompanhado por Flávio Dino) o ministro Luiz Fux pediu vistas e interrompeu a análise do caso. O caso tramita na Primeira Turma do STF, composta por cinco ministros.




