Novo estudo focado em jovens que relataram miocardite vacinal mostra que metade deles têm ao menos um sintoma persistente após 90 dias.| Foto: Bigstock / digitalista
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Um novo estudo com primeira autoria de Ian Kracalik, cientista dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, considerou a evolução do quadro de inflamação do coração (miocardite) após a inoculação com as vacinas anti-Covid baseadas na nova tecnologia de nanopartículas contendo parte do material genético do vírus (mRNA). Publicado em 21 de setembro em revista do grupo Lancet, o estudou acompanhou quase 400 adolescentes e jovens adultos com o problema por mais de 90 dias e descobriu que 16% não se recuperaram da miocardite após esse tempo, e 1% não se sentiam melhor desde que os sintomas começaram. Metade de um subgrupo de 357 relataram ter ao menos um dos sintomas: dor ou desconforto no peito, fadiga, falta de ar ou palpitações. Estudiosos da miocardite vacinal acreditam que, para algumas faixas etárias, os danos da vacina podem pesar mais que os benefícios.

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A miocardite é um efeito colateral estabelecido dessas vacinas, especialmente entre adolescentes e jovens do sexo masculino. Ela é rara, mas sua frequência exata ainda está em debate. As estimativas mais recentes sugerem um caso a cada três mil vacinados com duas doses, e um caso a cada 10 mil que tomaram a dose de reforço da vacina de mRNA, na população entre 18 e 39 anos.

No estudo, entre os pacientes que não se recuperaram, 18% (12 pessoas nessa amostra) precisaram ser internados em unidade de tratamento intensivo (UTI). Uma pessoa precisou de oxigenação por membrana extracorporal, uma técnica usada para salvar vidas de pessoas com falência do coração ou dos pulmões. Dos casos que os cientistas caracterizaram como “completamente recuperados”, 40% ainda tinham restrições de atividade diária recomendadas pelos médicos, e cerca de 10% continuaram a tomar remédios diários para o coração.

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Entre dez pacientes detectados com alterações do ritmo cardíaco, oito tinham arritmia nos compartimentos do coração. Isso significa que a miocardite vacinal deve causar cicatrizes no músculo cardíaco que são em si fonte potencial de mais problemas no funcionamento do coração. Em 151 pacientes examinados com métodos específicos de detecção de continuidade da inflamação, 20 apresentaram miocardite persistente.

O estudo conclui que a maioria dos pacientes que relataram miocardite se recuperaram, segundo seus próprios médicos, porém, 90 dias ou mais após o início dos sintomas, “quase metade dos pacientes continuaram a relatar sintomas, inclusive dor no peito, e um quarto receberam prescrição diária para medicação cardíaca”.

Kracalik e colegas pegaram dados do sistema de relatos de eventos adversos das vacinas (VAERS), restringindo sua busca a jovens entre 12 e 29 anos de idade que relataram sintomas de miocardite. De quase mil casos relatados no VAERS, os pesquisadores conseguiram acompanhar por cinco meses ou mais 393 pacientes. A amostra não é grande, mas o que chama a atenção é que os detalhes discutidos foram achados por métodos passivos, ou seja, os próprios pacientes relataram o problema e receberam atenção médica e de pesquisa.

Um estudo que fez uma busca ativa de sinais de miocardite vacinal realizado na Tailândia encontrou sinais do problema em 3% de seus pacientes, que eram adolescentes do sexo masculino. As evidências iniciais do problema vieram de Israel, com as primeiras observações entre militares, em fevereiro de 2021.

O que muda na avaliação de custo-benefício

Em artigo de abril, os CDC sugeriram que garotos dos 12 aos 17 anos têm duas a seis vezes mais chances de complicações cardíacas depois de se infectarem com a Covid-19, em comparação ao risco após a vacinação. Seriam sete a oito vezes mais chances para o caso dos rapazes entre 18 e 29 anos.

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Neste ano, com a disseminação da variante ômicron, a avaliação de custo-benefício precisa ser atualizada para levar em conta que as imunidades natural e híbrida estão cada vez mais comuns. Dessa forma, não faz mais sentido comparar a imunidade adquirida apenas pela infecção com Covid com aquela obtida exclusivamente pela inoculação de vacina. Um estudo de junho, que levou em conta toda a população da Suécia, por exemplo, sugeriu que, após nove meses, o efeito de complemento da imunidade natural pelas duas doses fica indistinguível da imunidade natural sem a vacina, em se tratando da proteção contra reinfecção.

Para Tracy Beth Høeg, médica, pesquisadora da Universidade da Califórnia em Davis e líder de estudos da miocardite vacinal, o benefício da vacina de mRNA é claro em adultos mais velhos, mas não em crianças. “Não temos evidências de que a vacinação vai reduzir o risco de doença severa em crianças previamente infectadas”, diz ela em publicação própria. “Nas crianças saudáveis sem infecção prévia, o dano da segunda dose da vacinação advindo só da miocardite pode pesar mais que os benefícios”, completa.

Há também que se considerar o tipo de vacina, pois a vacina de mRNA da Moderna é mais concentrada na dose de nanopartículas de gordura contendo o material genético que a vacina da Pfizer. No Brasil, somente a da Pfizer foi utilizada.

Para a cardiologista Ellen Guimarães, que atua em Goiânia, a vacina da Moderna não deve ser oferecida para homens entre 12 e 24 anos que são saudáveis, bem como doses de reforço, que aumentam a chance da inflamação no coração e não têm evidências suficientes de benefício. “Nessa faixa etária tem mais miocardite por vacina que por Covid”, afirma Ellen. Para ela, precauções poderiam ter sido tomadas, como permitir a liberdade de não se vacinar, usar somente uma dose ou aumentar o intervalo entre as duas doses principais.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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