Feministas protestam em Madri, setembro de 2014| Foto: EFE
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Quem se beneficiou com a revolução sexual? Brandida como uma vitória da causa feminista, resulta que, anos depois, as mulheres saíram perdendo.

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É o que defende Louise Perry, escritora e ativista, em seu livro 'The Case Against the Sexual Revolution' [A acusação contra a revolução sexual], no qual assegura que a promessa de liberdade e autonomia que as mudanças da revolução sexual traziam não foi cumprida para a grande maioria das mulheres.

A tese não é nova. Já em seu ensaio de 1982, 'Rumo a uma revolução sexual feminista', Ellen Willis (1941-2006) denunciou o modo como o libertinagem sexual onipresente na contracultura não fazia bem às mulheres. Tal como Perry, Willis lamentava que se houvesse equiparado o desejo de amor e compromisso à repressão, e que se houvesse exaltado o sexo sem emoção nem apego como o ideal ao qual aspirar, com um lema do tipo "faça como os homens".

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Onde está a novidade, então? Talvez no fato de vir de uma voz que nem sempre pensou como agora. A própria Perry diz em tom de mea culpa que ela costumava acreditar no discurso do feminismo liberal.

Perry identifica o feminismo liberal como aquele que "se centra sobretudo no direito das mulheres a escolher ou consentir". O mesmo que, segundo a escritora, criou um tabu em torno da discussão pública dos custos que a revolução sexual teve.

A autora trabalhou durante anos em um centro de atenção de crise para vítimas de estupro. Foi lá que deixou de acreditar nessa narrativa e cresceu sua frustração ao comprovar que esse feminismo não aportava soluções aos problemas reais das mulheres.

Segundo Perry, criou-se um tabu em torno da discusssão pública dos custos da revolução sexual

A própria Perry assegura que não é religiosa nem pró-vida. Tampouco tem nostalgia pelo mundo anterior à revolução sexual, mas quer, mesmo, responder de verdade a uma pergunta: o que as mulheres querem de fato, e o que é o melhor para o seu bem-estar?

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Uma realidade simples e polêmica: homens e mulheres são diferentes

Perry fundamenta sua argumentação em uma realidade tão evidente quanto provocativa nos dias de hoje: os homens e as mulheres são diferentes. E não só biologicamente, como também em sua psicologia, de uma maneira que marca sua forma de entender a sexualidade.

Embora reivindicar as diferenças não esteja na moda hoje em dia, Perry aponta que negá-las não é "coerente intelectualmente" e denuncia que o construtivismo (que alega que as diferenças não são inatas, senão culturalmente ensinadas) é uma teoria que prejudica as mulheres no longo prazo.

Não está sozinha em sua percepção. Camille Paglia, escritora e ícone feminista, também entrou em guerra com o feminismo hegemônico por essa mesma questão. "A igualdade política das mulheres, totalmente desejável e necessária, não vai remediar a separação radical entre os sexos, que começa e termina no corpo”, defende a intelectual.

Por isso, para Perry, se queremos criar uma sociedade que respeite as mulheres, a pergunta deveria ser: "O que tende a desejar uma mulher, dado o tipo de animal feminino que ela é, com as capacidades reprodutivas específicas que costuma ter?"

Erika Bachiochi, pesquisadora do Ethics and Public Policy Center e do Abigail Adams Institute, chega à mesma conclusão em sua obra 'The Rights of Women: Reclaiming a Lost Vision' [Os direitos das mulheres, reivindicando uma visão perdida, em tradução livre]: para atender de verdade às necessidades reais das mulheres, é preciso conhecer suas especificidades.

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Essas feministas, portanto, não veem a biologia feminina como um obstáculo a superar para alcançar a igualdade, senão como uma realidade que é preciso reconhecer e conhecer para assim poder fazer "inferências informadas sobre o bem-estar feminino em particular".

De reprimidas sexuais a reprimidas emocionais

O que esperam e querem as mulheres com o sexo? Perry não nega que existam mulheres que queiram sexo casual e sem compromisso. Simplesmente assinala que não são a maioria.

A conclusão da escritora é que as mulheres em geral preferem relações estáveis, comprometidas, nas quais o sexo tenha também um significado emocional e afetivo.

No entanto, a revolução sexual popularizou a ideia de que a única coisa que impedia as mulheres de terem uma sexualidade tão livre quanto a masculina era o medo de engravidar.

"Assim, no final dos anos 60, veio ao mundo uma criatura totalmente nova: a jovem aparentemente fértil, cuja fertilidade havia ficado em suspenso. Ela mudou tudo", explica Perry, falando da chegada da contracepção.

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Isso não é uma emenda à totalidade das consequências da revolução sexual por parte de Perry, que reconhece o potencial que o movimento teve para as mulheres se incorporarem plenamente ao mundo profissional e para acabar com a naturalização da maternidade. De fato, ao contrário de Bachiochi, Perry está a favor do aborto, embora considere que suas consequências não são levadas suficientemente em conta.

No entanto, a banalização do sexo trouxe consequências nefastas, defende a escritora. Ela diz que el sexo foi vendido como um ato que só tem importância que a pessoa queira dar e cujos limites só são marcados pelo desejo. O que quer dizer, segundo Perry, que se vendeu uma mentira. De fato, o primeiro capítulo traz no título toda uma advertência: "O sexo deve ser levado a sério".

Perry defende que, com um pouco de senso comum, é possível dar-se conta de que o sexo não é como qualquer outra atividade que se pode realizar por prazer; e que agir ignorando isso prejudica as pessoas, especialmente as mulheres, que esperam mais do sexo e que sofrem mais as suas consequências.

No entanto, num mundo pós-revolução onde a mensagem é "tenha todo o sexo que quiser, mas evite se apaixonar", as mulheres sentem a pressão de dizer "sim" a práticas sexuais com as quais não se sentem bem e das quais não desfrutam; e os sentimentos são uma doença a ser evitada a todo custo. As mulheres que desejam um maior compromisso são tachadas de "tóxicas" e de querer "se apegar".

No fim das contas, alerta Perry, "a história da revolução sexual não é só uma história de mulheres liberadas do peso da castidade e da maternidade, embora seja isso também. E também é a história do triunfo do playboy, uma figura que, com demasiada frequência, é esquecida e perdoada, apesar de seu papel central nessa história ainda recente".

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De fato, nesse marco, Perry propõe uma releitura do movimento MeToo: "Essa avalanche de raiva e dor era a prova de uma cultura sexual que não funcionava para as mulheres. As histórias que surgiram do MeToo incluíam muitos comportamentos inequivocamente delituosos, mas também havia muitas mulheres que descreviam encontros sexuais que eram tecnicamente consentidos, mas que, contudo, deixavam-nas se sentindo terrivelmente mal porque lhes era pedido que tratassem como sem significado algo que para elas era importante".

"Quando pretendemos desencantar o sexo, há então outro tipo de custo, que recai de forma desproporcional sobre as mulheres"

Conquanto contrária a Perry em muitos aspectos, a colunista Jessica Valentini adotou a mesma ideia no jornal inglês The Guardian num artigo publicado à luz do MeToo: "É certo que as mulheres estão fartas da violência e do assédio sexual; mas também é certo que o que essa cultura considera um comportamento sexual 'normal' é amiúde prejudicial às mulheres".

Nos anos 80, algumas feministas já tinham se dado conta de que a liberação sexual e a liberação da mulher não são a mesma coisa. Sheila MacLeod escreveu sobre a descoberta de sua geração de que "o mundo das fantasias masculinas cumpridas não trazia nada à soma de sua própria felicidade".

Michelle Goldberg, jornalista e escritora, reflete no New York Times sobre o impacto real da liberação sexual: "Supõe-se que o feminismo alivia a dissonância entre o que as mulheres querem e o que creem que devem querer. O feminismo sex positive foi capaz de fazer isso pelas mulheres que se sentiam oprimidas pelos tabus sexuais e pressionadas para negarem seus próprios desejos. Mas hoje isso parece menos relevante para as mulheres que se sentem embrutecidas pela expectativa de que estarão abertas a tudo".

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O consentimento, a (insuficiente) solução do feminismo atual

Perry aponta que o ponto em que o feminismo liberal fracassou com as mulheres foi a ideia de pôr o consentimento como único critério de liberdade em uma decisão.

Segundo esse princípio, "uma mulher deve poder fazer o que quiser, seja vender sexo ou convidar à violência sexual consentida, já que todos os seus desejos e escolhas devem ser necessariamente bons, sem importar de onde venham e aonde levem."

A ideia de que não existe uma moral sexual além da capacidade de os envolvidos consentirem não convence Perry: "Sou crítica de qualquer ideologia que não equilibre a liberdade com outros valores, e também sou crítica do fracasso do feminismo liberal na hora de questionar de onde vem nosso desejo por um determinado tipo de liberdade".

A autora se volta à indústria da pornografia para sublinhar que, se algo se pode ser aprender com as antigas trabalhadoras do mercado sexual aposentadas, é que "o consentimento é frágil". Por isso critica que o movimento não seja capaz de assumir que havia algo de errôneo em suas afirmações desde a origem: “Daí deriva a falsa crença de que as mulheres continuam sofrendo só porque o projeto de liberação sexual dos anos 60 está inacabado, e não porque sempre foi inerentemente defeituoso. Assim, receitam mais e mais liberdade e se surpreendem continuamente quando sua receita não cura a doença". Ao cabo, não há liberdade em tudo o que se consente.

O conselho final de Perry: "Ouça a sua mãe"

Sob o lema "Ouça a sua mãe", a autora termina o livro com alguns conselhos que asseguram que o senso comum é, no frigir dos ovos, mais sábio do que qualquer teoria.

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Conselhos como se casar, não engravidar de homens desconhecidos, esperar um pouco antes de transar quando começar uma relação, ou simplesmente não transar quando achar que o homem não dará um bom pai.

Naturalmente, Perry não saiu ilesa do livro e recebeu críticas por suas afirmações, de vários pontos de vista.

A escritora Emma Collins assinala que Perry "faz pouco favor às mulheres quando põe em dúvida repetidamente sua capacidade de resistência às forças culturais" e critica que Perry sustente a ideia de que "nossas opções estão muito limitadas porque somos criaturas impressionáveis que absorvem os valores e as ideias do nosso entorno".

Julie Bindel, jornalista e ativista feminista, assinala que concorda com Perry em muitas coisas, mas sublinha que ela "nunca recomendaria às mulheres investir num hipotético cinto de castidade e aceitar como inevitável que os homens estuprem a menos que os detenhamos".

De todo modo, a visão de Perry de que haverá uma contrarrevolução não está desencaminhada. Numa matéria do BuzzFeed, várias jovens comentam como a cultura sexual em que vivem as influenciou: "Parece que nos enganaram para explorarmos a nós mesmas e nos enganaram para que pensarmos que foi ideia nossa".

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Perry acredita que esse movimento venha acompanhado de um novo feminismo: "Uma feminista pós-liberal não é mais que uma feminista liberal que viu de perto a realidade da violência machista".

©2022 ACEPRENSA. Publicado com permissão. Original em espanhol.
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