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Propostas de redução de parlamentares esbarram na eficácia e relevância da medida, que ameaça a representatividade e não reduz gastos significativos.
Propostas de redução de parlamentares esbarram na eficácia e relevância da medida, que ameaça a representatividade e não reduz gastos significativos.| Foto: Pillar Pedreira / Agencia Senado

Um levantamento do Paraná Pesquisas apontou que 90,8% dos brasileiros acreditam que a quantidade de deputados federais e senadores deveria ser menor do que os atuais 594 parlamentares.

O resultado da pesquisa reflete a baixa confiança que a população deposita no legislativo federal. Outra pesquisa, essa do Datafolha e realizada em 2019, indicou que o Congresso Nacional é considerado “muito confiável” apenas por 8% dos brasileiros e “pouco confiável” por 49%. Já para 41% da população o Congresso não é “nada confiável”. Os partidos políticos, por sua vez, despertam a confiança de apenas 5% das pessoas; 39% confiam pouco e 54% não confiam nos partidos.

E, segundo uma pesquisa do Instituto Ipsos feita em 2017, apenas 6% dos eleitores se sentem representados pelos políticos em quem votaram.

Não à toa, a Câmara teve 243 deputados novos e renovação de 47,3% nas eleições de 2018. Já no Senado, das 54 cadeiras em disputa, 46 foram ocupadas por nomes novos.

Falta apoio da classe política

Alguns integrantes da classe política já defenderam publicamente a proposta de redução dos deputados e senadores como forma de solucionar a crise de credibilidade do Parlamento e diminuir gastos.

A ideia de reduzir parlamentares é a campeã na consulta popular do Senado. Mais de 1,8 milhão de pessoas se manifestaram a favor da proposta do então senador Jorge Viana (PT-AC) de reduzir o número de deputados de 513 para 385 e o de senadores de 81 para 54. A proposta não foi adiante porque não interessa aos parlamentares. Viana se reelegeu em 2018.

Antes dele, em 2008, o ex-deputado Clodovil Hernandes (PTC-SP) propôs uma para reduzir o número de deputados para menos da metade: restariam somente 250. Na justificativa do projeto, que não avançou na Câmara, Hernandes escreveu:

"O atual número de deputados nos parece excessivo, mormente em um momento em que a sociedade se volta contra a classe política e exige a depuração de seus quadros. Entendemos que uma Câmara com 250 deputados já possuirá amplas condições de representar a diversidade da sociedade brasileira, e possibilitará um enxugamento de estruturas administrativas".

No fim da legislatura passada, o líder do PSDB na Câmara, Nilson Leitão (MT) começou um movimento de coleta de assinaturas para uma proposta no mesmo sentido. Segundo sua proposta, no caso de deputados federais, o número mínimo por Estado cairia de 8 para 4; o máximo, de 70 para 65. Assim, o Senado Federal passaria de 81 para 54 cadeiras e a Câmara, de 513 para 395. A medida permitiria uma redução de R$ 1,3 bilhão em gastos ao longo de 4 anos. O então candidato à presidência Geraldo Alckmin abraçou a proposta e prometeu reduzir o número de parlamentares se fosse eleito.

Outro político que, durante a campanha em 2018, disse que pretendia reduzir o Parlamento foi o Senador Álvaro Dias (Podemos-PR). Ele prometeu uma "Refundação da República" que incluiria a redução no número de congressistas.

Logo depois das eleições presidenciais, em novembro de 2018, o presidente Jair Bolsonaro falou em eliminar as vagas de 113 deputados, mas desde então não tocou no assunto novamente.

O problema é mesmo o número de parlamentares?

Quem defende um Congresso mais enxuto acredita que a medida melhoraria a qualidade do debate e da representação e que ela conta com o apoio popular. Mas as raízes da sensação de falta de representação e de credibilidade do Parlamento estão mesmo associados ao número de congressistas?

Para o cientista político e autor de Dinheiro, Eleições e Poder, Bruno Carazza, o problema de baixa credibilidade do Congresso não tem relação com o número de parlamentares. “Pelo contrário! Num país de 200 milhões de habitantes, temos menos parlamentares per capita do que a maioria dos países desenvolvidos”, afirma. “Acredito que a população se sentiria mais bem representada se diminuíssemos as barreiras de entrada na política, para que o Legislativo se tornasse mais plural, como é nossa sociedade”, complementa.

O cientista político Murilo Medeiros endossa essa opinião. Para ele a solução está na diminuição no número de parlamentares. “Para além da discussão em torno da quantidade de parlamentares, devemos pensar em mecanismos que aproximem representantes e representados. Mudar o sistema eleitoral, por exemplo, é um passo indispensável”, diz.

Carazza também acredita na possibilidade de uma melhora institucional com uma maior identificação entre sociedade, partidos e deputados. “Para isso, temos que mudar a forma de disputa (com distritos eleitorais menores, que aproximariam o deputado do eleitor), aumentar os requisitos para os partidos terem acesso aos fundos públicos e ao horário gratuito de TV, diminuir a dependência dos partidos de dinheiro público e aumentar a democracia interna e a transparência dos partidos”, diz.

Outro ponto a ser melhorado para Carazza está no peso da representatividade dos Estados na Câmara dos Deputados, em virtude das distorções. Isso porque, em um estado mais populoso, um candidato precisa ser mais votado para que ele seja eleito, em comparação com estados com menos eleitores.

"O voto de um cidadão com domicílio eleitoral no Acre vale proporcionalmente mais do que em São Paulo. No Acre, temos menos de 800 mil habitantes. Em São Paulo, só na capital, são 10 milhões. Proporcionalmente, esses 8 deputados no Acre precisam de menos votos para serem eleitos e esse cidadão tem uma representatividade maior, proporcionalmente, do que os milhões de eleitores de São Paulo têm na Câmara dos Deputados”, explica o cientista político Alessandro Rodrigues Costa.

Ele calcula que São Paulo deveria ter mais de cem deputados para alcançar uma representatividade semelhante à do Acre. Mas a própria Constituição proíbe que um estado tenha mais de 70 representantes na Câmara.

Altas despesas e baixa transparência

Outra preocupação para a baixa credibilidade dos parlamentares está relacionada às despesas de cada parlamentar. Entre subsídios, verbas e auxílios, cada deputado ou senador custa cerca de R$ 2 milhões por ano.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), por exemplo, entrou na Justiça para que os senadores mantenham em sigilo as notas fiscais que justificam seus gastos com a chamada cota parlamentar. Destinada a cobrir despesas relativas ao exercício do mandato, a cota varia entre R$ 30 mil e R$ 45 mil.

Desde que assumiu a presidência do Senado, em fevereiro de 2019, ele vem se recusando a atender pedidos feitos pela Lei de Acesso à Informação (LAI) para que seu gabinete informe gastos com a verba parlamentar. Com o dinheiro, é possível pagar despesas com passagens, serviços postais, manutenção de escritórios de apoio à atividade parlamentar, hospedagem e combustível.

O setor de Transparência do Senado se negou a responder 45 pedidos de informações nos seis primeiros meses de 2019.

A postura da Câmara dos Deputados é diferente da que vem sendo adotada pelo Senado sob a presidência de Alcolumbre. A casa divulga cópias das notas fiscais desde 2014 e fornece dados retroativos quando solicitados por meio da Lei de Acesso à Informação, independentemente da vontade do deputado.

Apesar disso, o cientista político Murilo Medeiros afirma que é um erro associar a atuação do parlamentar apenas ao gasto público. “Essa discussão precisa ser mais ampla, pois temo que a redução do número de deputados possa implicar em diminuição da representatividade, levando a uma concentração de poder nas mãos de poucos caciques, sobretudo em pequenos estados”, diz.

Ele argumenta ainda que, do ponto de vista das finanças públicas, o impacto da redução no número de parlamentares seria modesto. “Cada deputado federal custa, em média, R$ 2,1 milhões por ano. A título de comparação, o governo federal deve fechar o próximo ano com um déficit de quase R$ 125 bilhões nas contas públicas, segundo o Tesouro Nacional”, diz.

Para ele, a discussão deve estar centrada na racionalização de custos, com cortes de privilégios e regalias. “Foi esse o modelo adotado nos parlamentos da Dinamarca, Suécia e Noruega”.

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