No filme “15h17 – Trem para Paris”, três jovens americanos se esforçam por imobilizar um extremista, armado com um fuzil AK-47| Foto: Divulgação/

Assisti ao filme “15h17 – Trem para Paris” no último fim de semana. Dirigido por Clint Eastwood, é a história verídica de três amigos que, durante uma viagem pela Europa como mochileiros, impediram um atirador de cometer um massacre em um trem de Amsterdã a Paris. Os três jovens, representados por eles próprios no filme, eram rapazes comuns de Sacramento, Califórnia. Mas se converteram em heróis graças às suas ações, atacando um atirador que poderia ter matado centenas de pessoas naquele trem.

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O filme foi uma inspiração. Mas as críticas lhe atribuíram escore de apenas 22% no site Rotten Tomatoes, classificando-o como um fracasso. Vasculhei as resenhas, e o máximo que a maioria delas conseguiu dizer foi que os atores não mostram o mesmo nível artístico de um Mark Wahlberg ou Liam Hemsworth.

O mais importante passou despercebido

Infelizmente, parece que os críticos não entenderam o mais importante no filme. Vale a pena, e muito, assistir a “15h17”, porque o filme exemplifica a verdadeira bravura e não a violência desnecessária, o niilismo hedonista ou as tramas rocambolescas geralmente mostradas na telona para divertir as plateias.

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Diferentemente da maioria dos filmes de ficção, esta é a história verídica de três jovens corajosos que fizeram a coisa certa, apesar de não terem a obrigação de fazê-la. Eles poderiam facilmente ter se escondido atrás de seus assentos de passageiro, torcendo para que o atirador passasse por eles sem notá-los. Mas, em vez disso, correram diretamente para o vilão, assumiram responsabilidade e não deixaram que acontecesse algo terrível.

Pense em um exemplo de alguma ocasião em sua própria vida em que você agiu com heroísmo. Agora pense em um momento em que você poderia ter feito a coisa certa, mas não fez. Em cada um desses dois momentos, reflita sobre quem foi responsável pelo que acabou acontecendo em consequência de sua ação ou inação.

Quantos de nós passamos o tempo vivendo superficialmente, tentando fugir de desafios, confrontos ou conflitos? Quantas vezes nos esforçamos para passar ilesos por sofrimentos e dificuldades? Quantas vezes não deixamos de captar lições de vida importantes e depois ficarmos amargurados, cínicos em relação aos males que suportamos na vida e xingando o próprio ser, a própria vida?

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Todos somos o herói, o covarde, o vilão

No dia 1º de outubro de 2017, um homem sem antecedentes criminais atirou em centenas de pessoas num festival de música country em Las Vegas. Ele passou meses se preparando para isso, comprando armas e traçando planos para conseguir matar o maior número possível de pessoas, disparando contra elas a partir do 32º andar de um hotel em Las Vegas.

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“Por que ele fez isso?”, a mídia perguntou. Nós, que assistimos ao massacre horrível, dissemos que tampouco entendemos. Eu mesma não entendi nada. O atirador estaria doente? Seria louco? Psicótico? Os resultados de sua autópsia até hoje não renderam nenhuma pista, nenhum indício de que a causa tenha sido qualquer uma dessas razões.

Frequentemente ocorre um novo massacre trágico numa escola que é divulgado pela mídia em tom sensacionalista (isso é exatamente o que os perpetradores dos massacres querem, mas essa afirmação reflete um argumento inteiramente distinto que terá que ficar para outro momento). O recente massacre especialmente terrível em Parkland, Flórida, não constitui exceção.

As manchetes dos jornais, em geral, descrevem esses atos trágicos como “maldade pura” e questionam superficialmente as motivações dos assassinos, refletindo a perplexidade pela simples existência desses vilões. A isso geralmente se segue uma discussão superficial e polarizada sobre controle de armas de fogo, algo que divide ainda mais os ideólogos fundamentalistas. Mas ninguém parece falar sobre o que de fato motiva esses assassinos.

Com um olhar mais profundo, podemos identificar que o cinismo irrestrito é responsável pela maioria dos males de massa que se manifestam no mundo. O conhecido psicólogo da Universidade de Toronto Jordan Peterson destaca que todos (ou quase todos) já viveram o mesmo niilismo que impele as ações dos assassinos em massa.

Os heróis que salvam vidas, os atiradores em massa que as ceifam e os covardes que fogem de situações de desafio, todos têm algo em comum. Todos sofrem as tragédias da vida.

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O sofrimento é inevitável. A morte é inevitável. São as reações ao sofrimento que se diferenciam, alterando completamente o rumo da vida das pessoas que reagem e a história que as cerca. Dentro de cada um de nós existe um vilão, um covarde e um herói. Qual deles vai prevalecer?

Os assassinos em massa são motivados por um cinismo intensificado. Eles permitem que o niilismo corra solto. Não reconhecem que se tivessem enfrentado sua própria sombra (definida por Carl Jung como o lado escuro e desconhecido da personalidade, algo que cada um de nós possui), assumido responsabilidade por ela e retificado os erros em sua vida poderiam ter sido os heróis que salvam o mundo e conquistam o respeito de muitos. É mais fácil ficar cínico e sentir raiva da própria vida por suas iniquidades e tragédias que reconhecer que você é responsável por arrumar sua própria vida.

Os heróis dão a cara para bater

Revendo o filme “15h17 – Trem para Paris”, vemos que ele faz um relato verdadeiro da jornada do herói. Os três jovens protagonistas do filme não foram perfeitos. Eles eram comuns. Tinham defeitos. Passaram por dificuldades na infância e início da idade adulta.

Mas, em vez de tomar o rumo da resistência menor, em lugar de deixar que o cinismo tomasse conta e lhes permitisse deixar de assumir a responsabilidade por sua própria vida, eles se esforçaram para aprimorar-se mentalmente, fisicamente e interpessoalmente (através da amizade grande que os unia). E, quando se viram diante do desafio que apareceu naquele trem, eles viraram heróis.

Aplaudo Clint Eastwood por exemplificar o ideal do arquétipo do herói nesse filme. Será que “15h17” vai receber prêmios por seu roteiro ou a atuação artística dos personagens? Talvez não, mas não foi para isso que o filme foi feito.

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Ele relata uma história mais profunda, mais verdadeira e mais necessária que nunca nos tempos de hoje: uma história em que o herói vence. Este filme destaca que o herói pode ser qualquer pessoa em qualquer momento. Basta a pessoa não fugir dos desafios e dar a cara para bater.

* Anna-Marieta Moise é neurologista e escritora.

Conteúdo publicado com permissão. Original em inglês.

Tradução: Clara Allain