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Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba. | Albari Rosa/
Gazeta do Povo
Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba.| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

232 mil votos são capazes de decidir uma eleição? Num cenário em que as pesquisas apontam empates técnicos em praticamente todas as simulações de embates no segundo turno, sim. Pois já se sabe de antemão que 232 mil eleitores brasileiros não comparecerão à “festa da democracia” nos dias 7 e 28 de outubro. 

O número corresponde à parcela de presos provisórios que não manifestaram interesse em participar do pleito de 2018, ou se encontram detidos em estabelecimentos prisionais que os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) consideraram sem estrutura ou segurança suficiente para a instalação de urnas eletrônicas. De uma população de aproximadamente 244 mil encarcerados provisoriamente no Brasil, como aponta o sistema Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), somente 12,3 mil vão votar este ano, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). 

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A Constituição Federal prevê, em seu artigo 15, como uma das hipóteses de suspensão de direitos políticos, a condenação criminal transitada em julgado, quando não há mais possibilidade de modificar a sentença por meio de um recurso ou se o réu simplesmente deixou de recorrer no prazo. A duração da suspensão é a mesma da pena, independentemente do tipo de regime que o condenado cumpra – inclusive a prisão domiciliar. O trânsito em julgado da sentença penal deve ser comunicado à Justiça Eleitoral. Assim que a pena for cumprida, um novo comunicado deve ser encaminhado. 

Pelo fato de o texto constitucional falar especificamente em trânsito em julgado, entende-se que os presos provisórios, mesmo encarcerados, podem votar. Nesses casos, o indivíduo está detido por uma questão processual – prisões preventiva e temporária – ou por já ter sido condenado em segunda instância, mesmo que estejam pendentes recursos no STJ e STF. O mesmo se aplica aos jovens maiores de 16 que cumprem medidas socioeducativas de internação. 

“A rigor, deveria ser assegurado o exercício de voto a essas pessoas. Pesquisas apontam, no entanto, que é reduzidíssimo o número de presos provisórios que exercem esse direito, algo em torno de 5%. A alegação mais comum é de que as Secretarias de Segurança dos estados não teriam condições para garantir, com segurança mínima, uma estrutura que possa permitir o direito de voto desses presos”, afirma João Rafael de Oliveira, advogado e professor de Processo Penal no UniBrasil e na Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). 

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Ao mesmo tempo em que é necessário que o indivíduo encarcerado manifeste sua vontade de votar, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estipula que os TREs, junto de órgãos como o Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil e Defensoria pública, devem “promover campanhas informativas com vistas a orientar os presos provisórios e os adolescentes internados quanto à obtenção de documentos de identificação e à opção de voto nas seções eleitorais instaladas nos estabelecimentos”. Não se sabe, porém, quantos tribunais, e de quais estados, realmente o fazem.

A exigência de um número mínimo de eleitores interessados também dificulta o voto nas prisões. Por entendimento também do TSE, é preciso que haja, no mínimo, 20 eleitores aptos a votar na seção especial. A falta de quórum, inclusive, foi uma das justificativas para a negativa do desembargador Luiz Taro Oyama ao pedido do ex-presidente Lula. O petista teria sido o único preso da carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, a manifestar interesse. 

Falta de representatividade e violência 

Para Oliveira, a questão deve ser encarada sob um viés problemático pois “é uma massa significativa de pessoas que não conseguem exercitar o voto, mesmo tendo esse direito garantido”. 

No entendimento do professor, a ausência de representatividade política dos presos provisórios acaba por fomentar as facções criminosas que contaminam o sistema carcerário brasileiro. Isso porque, a partir do momento em que esses presos não encontram alguém que represente seus interesses, partem para uma espécie de proteção paralela, representada nas prisões pelo crime organizado. 

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Ao mesmo tempo, o advogado opina que nenhum político ou candidato vai assumir, ao menos como mote principal de campanha, a efetividade dos direitos dos encarcerados no Brasil, incluindo o de voto. 

“Hoje em dia, é muito ‘antipático’, do ponto de vista do senso comum, sustentar um discurso de que é preciso levar dignidade aos presos e garantir direitos. Cai na ideia de que ‘bandido bom é bandido morto’. Mas isso acaba sendo uma falácia, porque essa ausência de direitos para os presos aumenta o poder das facções criminosas, que por sua vez fomentam a violência urbana. É um círculo vicioso. A resposta à violência é uma pena, que vai ser cumprida num cárcere superlotado, degradante, sem atenção aos presos. Aí eles saem de lá ‘faccionados’, voltam para rua e geram mais violência”, argumenta.

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