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| Foto: José Cruz/Agência Brasil

Em julgamento desta quinta-feira (10) sobre as normas de acesso à gratuidade na Justiça trabalhista, trazidas pela reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), definiu critérios para o pagamento de honorários de sucumbência para o trabalhador que perde uma ação e é beneficiário da gratuidade.

A discussão é fruto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5766, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Entenda os detalhes do processo, suspenso após a leitura dos votos de Barroso e de Edson Fachin, já que o ministro Luiz Fux pediu vista (mais tempo para análise). 

Barroso, relator da ADI, votou para não derrubar os dispositivos da reforma trabalhista questionados pela PGR, que definiram restrições ao acesso da justiça gratuita. Na visão do ministro, contudo, são necessários alguns limitantes para que a cobrança não afete verbas alimentares e o mínimo para a existência da pessoa. 

A legislação define que a parte vencida parcialmente - ou seja, quando apenas parte da demanda é considerada procedente - na Justiça do Trabalho deve pagar os custos dos honorários de sucumbência em relação aos pedidos que foram negados, ainda que se trate de beneficiário da Justiça gratuita.

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Para Barroso, o pagamento é válido, desde que a cobrança não ultrapasse 30% do valor líquido dos créditos recebidos. 

Outro critério apontado pelo ministro é de que o reclamante só pagará esse 30% das custas se ganhar na causa mais de R$ 5,6 mil, que é o teto do INSS.

"A medida claramente não é excessiva, porque não interfere no acesso à Justiça", disse Barroso sobre as normas definidas na reforma trabalhista. "O sujeito continua a poder ingressar em juízo com sua reclamação trabalhista sem precisar pagar nada. E se ele continuar pobre e não ganhar nada, ele continua sem ter de pagar nada", continuou Barroso.

A PGR questiona essa obrigatoriedade de pagamento, que acabou não derrubada no voto de Barroso, mas limitada. Por outro lado, o ministro votou por manter, como aprovado na lei, a responsabilidade de pagamento de honorários periciais quando a pessoa perde a ação e é beneficiária da justiça gratuita. 

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Sobre os honorários de sucumbência, Barroso disse considerar bastante razoável que um beneficiário da justiça gratuita que perdeu a ação tenha que provar, após dois anos do trânsito em julgado da sentença, que continua numa situação de hipossuficiência, para poder se desvencilhar da cobrança. A reforma traz o seguinte:

“Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.

Barroso também considerou proporcional que o autor da ação trabalhista, quando falta a alguma audiência, fique responsável pelo pagamento dos custos processuais, mesmo quando é beneficiário da justiça gratuita, se não justificar a ausência. 

Excessos 

Antes de votar, Barroso disse que considerava necessário fazer observações sobre a eficiência da Justiça trabalhista. Neste momento, o ministro teceu comentários sobre o excesso de litigiosidade que prejudica o mercado de trabalho, o trabalhador e o empreendedor, em sua visão. 

Para Barroso, a reforma trabalhista enfrentou apenas um dos problemas do mercado de trabalho brasileiro, ao tentar reverter o excesso de ações trabalhistas na justiça.

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"A antiga justiça dava incentivo para os litígios judiciais trabalhistas. Criar ônus para desmotivar litigância fútil é uma boa providência do legislador", comentou Barroso. 

O ministro entende que desincentivos mínimos para o acesso equilibram uma demanda que pode ser excessiva e prejudicial a eficiência da justiça. Barroso citou os custos que o Estado tem para manter a justiça brasileira. 

Ele destacou que, em 2016, o Brasil gastou, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), R$ 85,5 bilhões, sendo que a Justiça do Trabalho ocupou 20% deste orçamento.

Divergência

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF),  por outro lado, entendeu que as limitações impostas pela reforma para o acesso gratuito à Justiça do Trabalho afrontam a Constituição. Em uma fala contundente, Fachin votou na sessão desta quinta-feira para declarar inconstitucionais os dispositivos da reforma trabalhista questionados pela PGR.

"Entendo que a restrição pode conter em si a aniquilação do único caminho de que dispõem esses cidadãos para verem garantidos os seus direitos trabalhistas. O benefício da gratuidade da Justiça é uma dessas garantias fundamentais. É preciso restabelecer a integralidade do direito fundamental de acesso gratuito à Justiça trabalhista", disse Fachin. 

Para o ministro, o desrespeito nas relações no ambiente de trabalho "exige que sejam facilitados e não dificultados" os meios para os trabalhadores verem reconhecidos seus direitos fundamentais.

"A proteção constitucional ao acesso à Justiça e à gratuidade dos serviços judiciários encontra guarida na jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal. A gratuidade da Justiça apresenta-se como pressuposto para o acesso à própria Justiça", frisou. 

Entenda o processo

A PGR quer que seja declarada inconstitucional a responsabilização da parte vencida pelo pagamento de honorários periciais, ainda que a pessoa seja beneficiária da Justiça gratuita. A norma anterior previa que os beneficiários da Justiça gratuita ficassem isentos.

Agora, no entanto, a União custeará a perícia apenas quando o beneficiário não tiver auferido créditos capazes de suportar a despesa, "ainda que em outro processo".

"A mera existência de créditos em outros processos não me parece situação para afastar a condição de pobreza em que se encontrava a parte autora", criticou Fachin.

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Após a leitura do voto de Fachin, o ministro Ricardo Lewandowski - que ainda não se posicionou - pediu a palavra. "Certos princípios constitucionais, como da dignidade humana e cidadania, não podem ser interpretados sob o ponto de vista da eficiência e do utilitarismo. O direito tem de ter uma outra interpretação, um outro viés, que não uma base simplesmente numerológica, de eficiência, de vantagem ou de aumento de riqueza", avaliou Lewandowski. 

O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, apontou que há abusos no número de processos que chegam à Justiça do Trabalho. Para Gilmar, Barroso tem razão ao apontar a necessidade de racionalização do sistema - os dois ministros já trocaram farpas e acusações em sessões no STF, mas a discussão sobre a reforma trabalhista tende a botá-los no mesmo lado. 

"A disfuncionalidade do sistema custa caro para o Estado. A liberdade de litigar sem responsabilidade não causa benefícios e causa um imenso prejuízo a todos os cidadãos carentes de justiça".

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