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Crise econômica e hiperinflação faz com que os venezuelanos troquem mercadorias entre si para que consigam atender às necessidades essenciais | Carlos Becerra/Bloomberg
Crise econômica e hiperinflação faz com que os venezuelanos troquem mercadorias entre si para que consigam atender às necessidades essenciais| Foto: Carlos Becerra/Bloomberg

Outro dia troquei uma baguete por um estacionamento. Funcionou brilhantemente. Eu tinha tempo, mas, como de costume, não tinha bolívares. O atendente do estacionamento só tinha algumas contas, mas não tinha a oportunidade de ir à padaria ali perto nos raros momentos em que ela colocava seu pão favorito à venda. O negócio que fizemos: ele me deixou sair do meu carro e eu voltei com um pão extra, pago com o meu cartão de débito. Ele me reembolsou, dando um bônus de troca.

É assim que fazemos em nossa economia em colapso. Se alguém tem muito de algo e muito pouco de outra, um acordo pode ser feito. Já troquei, com amigos do ensino médio, farinha de milho por arroz; ovos por óleo com minha cunhada, Vendedores de rua também se dedicam às trocas. Por exemplo, um quilo de açúcar como forma de pagamento por um de farinha. Há páginas no Facebook e salas de bate-papo dedicadas à troca de tudo, desde pasta de dente até alimentos infantis. 

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Um barbeiro no campo corta o cabelo por mandiocas, bananas ou ovos. Moto-taxistas vão levar você aonde precisa ir em troca de uma caixa de cigarros. Os donos de um dos meus restaurantes mexicanos favoritos oferecem um prato de burritos, enchiladas, tamales e tacos em troca de alguns pacotes de guardanapos. Num fast-food perto do meu escritório, a pessoa que trabalhava no registro dos pedidos me deixou sair com um de frango, arroz e legumes sem pagar, confiando na minha promessa de voltar no dia seguinte com a promessa de voltar com 800 mil bolívares. 

Agir com este tipo de confiança é inédito, se comparado com a realidade de alguns anos atrás. Caridade é algo novo. Eu não cresci com as tradições de comida enlatada e voluntariado, práticas que são comuns nos Estados Unidos. Agora, pais da escola dos meus filhos reúnem roupas para os mais pobres e vizinhos arrecadam brinquedos para um hospital infantil. Minha amiga Lídia, advogada, entrega sopa caseira aos desabrigados. 

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Eu gosto de pensar que tudo isso é uma nobre expressão de solidariedade, como evidência da decência dos moradores de Caracas em um momento de escassez de produtos básicos e hiperinflação. Sei que na maioria dos casos a motivação é a necessidade e, até mesmo, o desespero. Mas tudo bem, entregar aquela baguete quentinha àquele funcionário do estacionamento nos faz sorrir, mesmo por apenas um segundo.

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