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O escrivão (Scriptosaura catimbau), descrito por dois brasileiros, em seu ambiente natural | Reprodução
O escrivão (Scriptosaura catimbau), descrito por dois brasileiros, em seu ambiente natural| Foto: Reprodução

Enquanto o sertão não vira mar, uma espécie de lagarto sem patas, recém-descoberta na caatinga, tem de se contentar em nadar na areia mesmo. Essa é uma das características marcantes do Scriptosaura catimbau, réptil de apenas 5 cm de comprimento (sem contar a cauda) nativo do interior de Pernambuco. O bicho, descrito por dois pesquisadores brasileiros, faz parte de uma leva impressionante de novas espécies que estão aparecendo nas areias nordestinas.

"Tudo indica que esses bichos hiperespecializados para a vida em terreno arenoso se diversificaram muito rapidamente, em uns 9 milhões de anos, com as espécies mais recentes tendo se diferenciado há 1 milhão ou 2 milhões de anos", contou ao G1 Miguel Trefaut Rodrigues, pesquisador do Departamento de Zoologia da USP e um dos responsáveis pela descoberta. Junto com sua colega Ednilza Maranhão dos Santos, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Rodrigues publicou a descrição formal do S. catimbau - ou "escrivão", como é conhecido pelos moradores da área onde vive - na revista científica "Zootaxa".

Apesar da grande quantidade de bichos recentemente descobertos nas dunas nordestinas, o S. catimbau é tão diferente das demais que mereceu a denominação não só de uma espécie, mas de um gênero novo (o Scriptosaura; o gênero é a primeira parte do nome oficial de qualquer ser vivo, tal como o gênero Homo, ao qual pertence a nossa espécie, Homo sapiens).

Tanto o nome científico quanto o popular, aliás, são facilmente explicáveis. O réptil foi encontrado no Parque Nacional do Catimbau, e os rastros sinuosos que ele deixa na areia explicam o apelido de escrivão. "Na verdade, ele se desloca por ondulações uns três milímetros debaixo da areia, formando morrinhos. Depois que o bicho passa, esses morrinhos desabam, formando o rastro", conta Rodrigues. "Ele provavelmente também só se alimenta debaixo da terra", diz o pesquisador. Segundo Rodrigues, a alimentação do escrivão provavelmente é composta por pequenos invertebrados, como larvas de besouros e borboletas.

A adaptação para "nadar" na areia e se enterrar é tão completa que restou ao bicho apenas vestígios modestíssimos - dois filetes - das patas de trás e nada das patas da frente. O resto da anatomia, no entanto, deixa claro que esse e os outros bichos do tipo chegaram a essa solução evolutiva de forma independente das cobras, com as quais eles se parecem muito superficialmente. Alguns dos primos do escrivão chegam mesmo a ter uma escama tapando os olhos, sendo completamente cegos, coisa que não se vê na nova espécie.

Criaturas desse tipo estão distribuídas de forma desigual pelos solos arenosos nordestinos, em especial por dunas do curso médio do rio São Francisco. É possível que houvesse há milhões de anos uma região arenosa muito maior, que foi sendo fragmentada pelo rio, por exemplo, o que teria estimulado a formação de novas espécies ao longo do tempo.

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