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Vídeo do ditador chinês, Xi Jinping, exibido durante uma visita organizada para a mídia na Zona Internacional de Demonstração de Energia de Hidrogênio de Daxing em Pequim, na China, em maio deste ano
Vídeo do ditador chinês, Xi Jinping, exibido durante uma visita organizada para a mídia na Zona Internacional de Demonstração de Energia de Hidrogênio de Daxing em Pequim, na China, em maio deste ano| Foto: EFE/EPA/MARK R. CRISTINO

O aumento do poder e da influência chinesa ao redor do mundo não passa apenas por pressões econômicas. A China também vem ampliando nos últimos anos suas atividades no campo cibernético, por meio do financiamento de novas ferramentas que são utilizadas pelo país para realizar ataques cibernéticos em massa e para aumento da propaganda do Partido Comunista Chinês (PCC) em redes sociais.

O caso mais recente desse tipo de ataque foi o realizado contra a infraestrutura naval e de comunicações dos Estados Unidos em maio. O secretário da Marinha dos EUA, Carlos Del Toro, confirmou à emissora americana CNBC que a Marinha do país foi "seriamente impactada" pelo ataque e criticou o comportamento da China. No entanto, ele não deu mais detalhes sobre a extensão do dano causado pela invasão.

Em um comunicado divulgado no mesmo mês, a Microsoft afirmou que um dos principais alvos dos hackers chineses durante o ataque cibernético contra a Marinha americana teriam sido os computadores e aparelhos eletrônicos na ilha de Guam, território americano no meio do Oceano Pacífico onde os EUA mantêm importantes bases militares estratégicas.

A Microsoft afirmou que os hackers, chamados de Volt Typhoon, tinham como objetivo coletar informações sobre a infraestrutura crítica de comunicações entre os EUA e a região da Ásia. O objetivo dos hackers era guardar essas informações e utilizá-las no futuro em caso de um possível acirramento da crise envolvendo americanos e chineses. No comunicado, a Microsoft afirmou que "mitigar esse tipo de ataque pode ser um desafio no futuro".

Interferência política

Não é de hoje que os chineses utilizam ataques cibernéticos para coletar informações e interferir em assuntos políticos de outros países. Também em maio, o Serviço Canadense de Inteligência de Segurança (CSIS, sigla em inglês) afirmou que a China teria tentado interferir no resultado das eleições do país em 2019 e 2021.

De acordo com as informações, hackers financiados pelo governo chinês teriam realizando campanhas cibernéticas para ampliar o apoio a candidatos ao parlamento canadense alinhados a Pequim. Além disso, os chineses teriam infiltrado agentes nos escritórios de deputados e lançado campanhas de desinformação contra os críticos do regime comunista.

Um dos alvos da campanha chinesa teria sido Erin O'Toole, ex-líder do Partido Conservador do Canadá e opositor do atual primeiro-ministro Justin Trudeau, do Partido Liberal. O'Toole denunciou que a China havia feito uma campanha para desacreditá-lo e suprimir seus votos antes da eleição de 2021, quando ele perdeu a disputa para Trudeau.

Ele afirmou que sua campanha foi atingida por uma série de ataques cibernéticos, que interromperam suas plataformas online e vazaram informações pessoais. O ex-parlamentar acusou o governo canadense de não transmitir informações sobre a intromissão chinesa nos assuntos dos membros do parlamento e de fazer vista grossa aos ataques contra a democracia do país.

Por sua vez, Trudeau reconheceu que há muito tempo existe uma interferência chinesa nos processos eleitorais do país, mas disse que isso “não prejudicou” a integridade dos resultados das eleições de 2019 e 2021. A China negou as acusações e disse que “não tinha interesse em se intrometer nas eleições canadenses”.

O resultado das eleições foi uma vitória apertada para Trudeau, que garantiu um terceiro mandato como primeiro-ministro com um governo minoritário. O'Toole admitiu a derrota, mas prometeu continuar denunciando Trudeau por suas “políticas favoráveis à China”.

O The New York Times publicou um artigo em 2021 no qual apontava, baseado em um relatório anual de inteligência divulgado em abril daquele ano, que a China é atualmente a maior ameaça para os Estados Unidos e seus aliados e que o país oriental está desafiando os americanos em vários campos, especialmente na área econômica, militar e tecnológica. O relatório divulgado pelo jornal também afirmou que a China está pressionando a política mundial para mudar as normas globais e abrir barreiras entre os EUA e seus aliados.

Jamie Collier, consultor da Mandiant, afirmou ao The Guardian em 2021 que os ataques cibernéticos realizados pelo regime chinês atualmente são “um tipo de ameaça mais grave do que prevíamos anteriormente”.

Além da América

A interferência cibernética chinesa, no entanto, não se limita somente aos EUA e ao Canadá. O governo chinês também foi acusado de usar seus hackers para atacar outros países e regiões que desafiam sua agenda política ou ideológica ou que são alvos dos interesses estratégicos e econômicos de Pequim.

Em 2019, a Austrália foi uma de suas vítimas. Na época, hackers, que especialistas australianos afirmaram ser chineses, lançaram um ataque cibernético em larga escala contra instituições governamentais, empresariais e acadêmicas do país.

O ataque ocorreu em meio ao deterioramento das relações bilaterais entre os países, ocasionado por disputas comerciais, questões de direitos humanos e discussões sobre as origens da Covid-19. A China negou na época qualquer envolvimento no ataque cibernético e acusou a Austrália de “ser uma cúmplice dos EUA na contenção da ascensão do país”.

Já em 2022, um relatório da Recorded Future, uma empresa de segurança cibernética dos EUA, revelou que em 2021 um grupo de hackers chineses, chamado de RedEcho, havia atacado o setor de energia e a infraestrutura crítica da Índia em meio a um impasse que gerou um novo conflito na fronteira entre os dois países.

De acordo com o relatório, hackers tentaram instalar um malware que poderia interromper o fornecimento de energia em toda a Índia. A Recorded Future também observou que esses hackers estavam ligados a um grande apagão em Mumbai em outubro de 2020, que afetou milhões de pessoas e interrompeu os serviços de transporte e comunicação. Os ataques cibernéticos foram vistos como um sinal de alerta e uma tática de pressão da China contra a Índia por causa da disputa territorial.

Em julho de 2021, a União Europeia (UE) se juntou aos Estados Unidos e outros aliados para condenar a China por seu papel em uma campanha global de espionagem cibernética que explorou vulnerabilidades nos servidores da Microsoft Exchange, que são amplamente utilizados por organizações para serviços de e-mail e calendário.

A UE disse que a campanha havia afetado milhares de computadores e redes em todo o mundo, incluindo os de seus estados-membros e instituições. O bloco também acusou a China de conduzir atividades cibernéticas maliciosas contra indústrias e setores-chave para os europeus, como o programa aeroespacial, sistemas de saúde, biotecnologia, educação e pesquisa.

A China rebateu as acusações, classificou-as como “infundadas e caluniosas” e disse ser uma “vítima” e não uma “perpetradora de ataques cibernéticos”.

Também em 2021, um relatório da Check Point Research, uma empresa de segurança cibernética israelense, expôs um grupo de hackers chineses chamado IndigoZebra. No relatório, a empresa afirmou que esse grupo realizava operações de espionagem contra governos africanos desde 2014.

O documento apontou que o IndigoZebra usou emails falsos e anexos maliciosos para se infiltrar em redes governamentais no Quênia, Libéria, África do Sul, Zimbábue e outros países. O relatório ainda apontou que o grupo hacker roubou informações sensíveis relacionadas a assuntos externos, segurança nacional, finanças e comércio.

Na conclusão, a Check Point Research apontou que o IndigoZebra estava agindo em nome do governo chinês, que financiava o grupo para obter informações em nome dos seus interesses políticos e econômicos no continente africano.

Motivações

Segundo um relatório da consultoria Booz Allen Hamilton, divulgado em 2022, três "interesses centrais" motivam as operações cibernéticas da China: segurança, soberania nacional e desenvolvimento.

Esses interesses estão relacionados à manutenção do sistema político e social liderado pelo regime do Partido Comunista Chinês, à defesa de suas reivindicações territoriais em áreas disputadas e à garantia de suas atividades econômicas em um cenário de competição com o Ocidente.

A China vê como uma ameaça a esses interesses os movimentos pró-democracia, anticorrupção e reformistas, que, de tempos em tempos, começam a se manifestar dentro e fora do país. Além disso, se preocupa também com a desaceleração econômica, os avanços tecnológicos, as restrições ao investimento chinês em outros países e as ameaças físicas a suas rotas marítimas e escritórios no exterior.

Para enfrentar essas “ameaças”, o relatório afirmou que a China usa uma estratégia baseada na “Guerra Psicológica”, que seria o uso ou a ameaça da força para afetar a tomada de decisão de um adversário, usando ciberataques destinados a sinalizar a posição chinesa sobre questões-chave por meio da destruição e da interrupção controlada de alvos específicos.

Além da “Guerra Psicológica”, a China utiliza também a “Guerra Legal”, fazendo uso seletivo do direito internacional para justificar suas ações e deslegitimar as dos seus adversários, com ciberataques destinados a obter informações ou evidências que possam ser usadas para apoiar os argumentos legais da China, e a “Guerra Midiática”, por meio do uso dos meios de comunicação para influenciar a opinião pública doméstica e internacional, com ciberataques destinados a espalhar desinformação, propaganda ou narrativas favoráveis ao regime chinês.

As táticas chinesas

A China faz uso de uma ampla gama de recursos diretos e indiretos para tentar influenciar no processo político e social dos países. Segundo um artigo publicado pelo Council on Foreign Relations (CFR), o arsenal da China inclui o uso da mídia estatal e o controle da mídia em língua chinesa espalhada por outros países. Além disso, o regime chinês utiliza a coerção econômica, como o uso de sanções comerciais, restrições ao investimento ou incentivos financeiros para pressionar ou persuadir os países a adotarem posições favoráveis à China.

O artigo também apontou que o regime de Xi Jinping utiliza a desinformação nas plataformas de mídias socias, com o uso de contas falsas, bots ou trolls para espalhar informações falsas ou enganosas sobre questões sensíveis e controversas relacionadas à China.

Os chineses abusam ainda do poder crescente nos campi universitários, utilizando institutos, bolsas de estudo ou parcerias acadêmicas para promover a “cultura e os valores chineses”. Para a China, quanto mais ela consegue ampliar sua influência no campo acadêmico, mais pessoas terá no futuro para defender suas restrições à liberdade acadêmica e rebater as críticas direcionada por opositores ao Partido Comunista Chinês.

O CFR apontou que a influência política sobre aliados ideológicos que utilizam doações financeiras feitas pelo PCC para se manter, o apoio financeiro a instituições de pesquisa amigáveis e a cooptação de políticos simpáticos à China pelo mundo também são meios adotados por Pequim para avançar com suas pautas e propaganda.

Além disso, a China também usa técnicas sofisticadas e furtivas para realizar seus ciberataques, como explorar vulnerabilidades desconhecidas em softwares amplamente usados, como o realizado contra o serviço de e-mail da Microsoft e os dispositivos de segurança da VPN Pulse. Essas técnicas permitem que os hackers chineses operem sem serem detectados por mais tempo.

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