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O presidente da Bolívia Evo Morales, reeleito para um quarto mandato, 23 de outubro de 2019
O presidente da Bolívia Evo Morales, reeleito para um quarto mandato, 23 de outubro de 2019| Foto: AIZAR RALDES / AFP

O presidente da Bolívia, Evo Morales, foi eleito no primeiro turno para um quarto mandato na noite desta quinta-feira (24), após uma contagem de votos que provocou protestos pelo país. A apuração da eleição presidencial da Bolívia foi alvo de acusações de fraude e de críticas da comunidade internacional.

Com 99,99% dos votos contabilizados, Morales obteve 10,56 pontos de vantagem sobre Carlos Mesa, da aliança Comunidade Cidadã. É uma margem pequena, já que segundo a constituição boliviana, o ganhador precisa de um mínimo de 10 pontos de diferença, se tiver mais de 40% dos votos, para evitar um segundo turno. O Movimento ao Socialismo (MAS) de Morales alcançou 47,07% dos votos; e Mesa ficou com 36,51%.

Mesa classificou o resultado de "fraude". "A decisão é clara, o MAS não quer um segundo turno e não quer aceitar nenhuma modificação desta alteração vergonhosa e grosseira do resultado da nossa votação no domingo passado", afirmou Mesa em vídeo divulgado em redes sociais, referindo-se à suspensão da transmissão da contagem preliminar dos votos na noite de domingo.

A apuração esteve envolvida em controvérsias desde o domingo. A Bolívia conta com duas contagens de votos: uma rápida e uma definitiva. Na noite de domingo, os resultados preliminares da contagem rápida indicavam clara tendência para um segundo turno entre Morales e Mesa. A divulgação dessa contagem foi suspensa na noite de segunda-feira, com mais de 80% de dados apurados, e retomada quase 24 horas depois, com mudança na tendência. Morales aparecia então com a vantagem suficiente para evitar um segundo turno.

Brasil, Argentina, Colômbia e Estados Unidos expressaram preocupação com as "anomalias" na eleição boliviana e apoiaram o pedido por um segundo turno, feito anteriormente pela Organização dos Estados Americanos e pela União Europeia.

Acusações

Morales, de maneira geral popular na Bolívia depois de 13 anos, mas menos do que no passado, comemorou a vitória na quinta-feira. "Boas notícias", disse ele em uma entrevista coletiva ainda pela manhã, antes do fim da apuração. "Nós já vencemos o primeiro turno."

Na noite anterior, ele havia alertado sobre uma tentativa de golpe liderada pela "direita", em coordenação com potências estrangeiras: "Nós a enfrentamos sem violência, mas devo dizer que estamos em estado de emergência para defender a democracia".

Mesa, que uniu partidos de oposição da direita e da esquerda contra Morales, classificou a acusação de "incrível" e acusou Morales de "manobrar uma enorme fraude".

"Se existe alguém que viola sistematicamente o estado de direito constitucional, é Evo Morales", disse Mesa, que foi presidente de 2003 a 2005. "Ele controla e dá ordens a todos os poderes do Estado".

Mesa alertou seus apoiadores de que ele arriscou ser preso por "falsas acusações" de instigar a violência. Ele pediu "mobilizações permanentes" em todo o país.

A Coordenação para a Defesa da Democracia, um comitê formado por Mesa na quarta-feira, outros líderes da oposição e grupos da sociedade civil pediram "protestos pacíficos" até o governo concordar em ir para o segundo turno.

O chefe da missão de observação das eleições para a OEA disse na quarta-feira que as autoridades bolivianas não têm uma explicação válida para a lacuna na publicação das contagens de votos. A OEA, que se reuniu em Washington na quarta-feira para discutir a eleição, chamou a lacuna de "surpreendente" e "preocupante".

Gerardo Icaza, diretor de observação e cooperação eleitoral da OEA, disse que a eleição deveria passar para um segundo turno, independentemente dos resultados do primeiro.

"Dado o contexto e os problemas evidenciados nesse processo eleitoral, ainda seria uma opção melhor ir para uma segunda rodada", afirmou.

Carlos Trujillo, representante dos EUA na OEA, disse, antes da divulgação dos resultados, que os Estados Unidos "rejeitam profundamente as tentativas do Tribunal Eleitoral de subverter a democracia boliviana adiando a contagem de votos e adotando ações que minam a credibilidade das eleições na Bolívia".

"Agora que o presidente Morales e seu partido conhecem sua própria impopularidade, eles trapacearão para vencer", disse Trujillo. "Se ele é tão popular quanto afirma, vencerá no segundo turno."

Morales recebeu apoio de colegas esquerdistas latino-americanos. "O povo boliviano superará a violência dessa tentativa de setores da direita, que querem destruir a democracia boliviana, destruir o presidente Evo Morales e violar a realidade da constituição e das leis", disse o ditador venezuelano Nicolás Maduro em discurso transmitido pela televisão na quarta-feira.

"A esquerda continua no mapa político da América Latina", tuitou o líder cubano Miguel Díaz-Canel. "Apesar da guerra da mídia da direita no continente, Evo venceu pela quarta vez. Parabéns irmão."

Morales, o primeiro presidente indígena da Bolívia, é creditado por trazer um crescimento econômico significativo e reduzir a pobreza e a desigualdade em um dos países mais pobres da região. Ele também foi acusado de enfraquecer a democracia e concentrar o poder. O fato de ele estar concorrendo ao quarto mandato foi controverso: depois de ser derrotado em um referendo em 2016 sobre limites de mandatos, ele garantiu uma decisão judicial que lhe permitiu concorrer novamente.

"Certamente há um 'fadiga de Evo' no país, e os protestos são uma ameaça real para Morales", disse Raúl Madrid, cientista político da Universidade do Texas que estuda política indígena e esquerdista na América Latina. "A Bolívia não é a Venezuela, que é claramente autoritária. Ela tem estado no limite há algum tempo, e acho que seria muito custoso para Morales perder o respeito da comunidade internacional ao trapacear nessas eleições".

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