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Apoiadores do ditador venezuelano Nicolás Maduro durante “Marcha Anti-imperialista” em Caracas, 30 de março. Foto: Cristian Hernandez / AFP
Apoiadores do ditador venezuelano Nicolás Maduro durante “Marcha Anti-imperialista” em Caracas, 30 de março. Foto: Cristian Hernandez / AFP| Foto:

Depois de dois aviões militares russos terem desembarcado perto de Caracas este mês, o governo Trump emitiu alertas sobre os laços do ditador Nicolás Maduro com o Kremlin. Mas um navio que chegou às águas da costa caribenha da Venezuela no dia anterior ofereceu um sinal mais revelador de um relacionamento cada vez mais profundo que é muito alarmante para Washington.

A Venezuela tem as maiores reservas de petróleo conhecidas do mundo, com o transporte e as vendas do seu petróleo bruto dependentes de diluentes químicos adquiridos nos Estados Unidos. Depois que Washington proibiu as empresas americanas de vendê-los à Venezuela em janeiro – e advertiu empresas estrangeiras a fazerem o mesmo – Maduro enfrentou uma situação terrível: como ele evitaria o colapso total do setor?

Como maná de Moscou, chegou uma resposta na forma de um petroleiro vermelho e preto, o Serengeti, que se abasteceu com uma carga de diluentes na costa de Malta antes de chegar à Venezuela em 22 de março. A empresa que fretou a embarcação: a estatal russa de petróleo Rosneft.

"As relações entre a Rússia e a Venezuela são excelentes", disse Alexey Seredin, ministro conselheiro da embaixada russa em Caracas, em uma entrevista. "No momento, estamos trabalhando para fortalecer a cooperação."

A chegada de diluentes vitais é apenas uma parte de uma expansão da presença russa na Venezuela. Moscou está despachando militares e equipamentos e está agindo para compensar as sanções dos EUA ao transportar petróleo bruto venezuelano para a Índia para processamento. O Kremlin está pronto para aumentar as vendas de trigo e despachar mais ajuda médica. Neste mês, a Venezuela também anunciou a abertura em Moscou de uma sede regional para a PDVSA, sua gigante estatal de petróleo.

Na próxima semana, disse Seredin, uma delegação do regime de Maduro chegará a Moscou para discutir investimentos russos nos setores de mineração, agricultura e transporte da Venezuela. Seredin acrescentou que a chegada de 99 militares russos em 23 de março foi parte de um esforço para manter o aparato de defesa de Maduro, que inclui caças Sukhoi e sistemas antiaéreos comprados da Rússia.

Em um evento televisionado na sexta-feira, o ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino López, inaugurou um "Centro de Simulações de Voo da Força Armada" para helicópteros russos.

"Este centro, e dizemos humildemente, só pode ser encontrado na Venezuela e na Rússia", disse ele.

Ele também anunciou planos para um simulador russo Sukhoi MK2 na cidade venezuelana de Barcelona, ​​e insistiu que uma planta há muito adiada para a produção de fuzis russos abriria em breve em Maracay.

Relações Washington-Moscou

Em uma era de laços geralmente calorosos entre o governo Trump e Moscou, o envolvimento cada vez mais profundo da Rússia na Venezuela está criando um ponto crítico ao desafiar o esforço dos EUA para forçar Maduro a deixar o cargo.

O presidente Donald Trump disse na sexta-feira que provavelmente conversará com o presidente russo, Vladimir Putin, e o presidente chinês, Xi Jinping, sobre a crise na Venezuela. No início do dia, o conselheiro de segurança nacional John Bolton foi mais crítico, emitindo uma declaração condenando a "introdução de soldados e equipamentos militares russos na Venezuela" como um ato "provocativo" e uma "ameaça direta à paz e segurança internacional na região".

Elliott Abrams, o enviado americano especial para a Venezuela, declinou na sexta-feira comentar a sugestão de Bolton de intervenção militar.

"Há muitas coisas que podemos fazer em termos econômicos, em termos de sanções", disse Abrams a repórteres em Washington. "Temos opções, e seria um erro os russos pensarem que podem fazer de tudo. Eles não podem."

Com mais de 50 nações reconhecendo o líder da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, como líder legítimo da Venezuela, Maduro está administrando o novo status de pária do país, operando em grande parte fora dos sistemas ocidentais de comércio e finanças, enquanto se volta para a Rússia e, em menor escala, para a China e a Índia.

O apoio da Rússia a Maduro em face do esforço dos EUA para depô-lo está sendo cada vez mais comparado à intervenção do Kremlin na Síria em nome do presidente Bashar al-Assad. Em 2015, o envolvimento russo mudou a maré na guerra civil da Síria, preservando o poder de Assad e elevando Moscou a um aparente criador de reis no Oriente Médio.

"Há um entendimento de que a [Venezuela] é um teste bastante sério para a capacidade da Rússia de agir em defesa de seus interesses globalmente", disse Dmitri Trenin, chefe do centro de estudos independente Carnegie Moscow Center.

Não está claro se a intervenção russa será suficiente para combater os apagões em todo o país e a escassez de gasolina que agravam a crise humanitária que deixou milhões sem acesso a alimentos e remédios suficientes. O dinheiro da Rússia, argumentam muitos, não é suficiente para manter Maduro no poder.

No entanto, juntamente com o apoio da China, os esforços da Rússia parecem ter, pelo menos, aliviado algumas das pressões imediatas. A chegada de militares russos neste mês pareceu sinalizar a disposição de Moscou de aumentar seu apoio a Maduro, bem como preparar sua máquina de guerra em um momento em que a administração Trump não descartou uma intervenção militar.

"É um jogo de xadrez ideológico. A Rússia não precisa do petróleo venezuelano", disse Russ Dallen, sócio-gerente da corretora Caracas Capital Markets, com sede na Flórida. "A Venezuela está longe de suas linhas de suprimentos. Foi mais uma oportunidade de colocar o dedo no olho do Tio Sam no quintal dos EUA."

Apoio moderado

A China – outro benfeitor de Maduro – ofereceu um apoio mais moderado. Na semana passada, Pequim barrou o representante de Guaidó de uma reunião agendada na China do Banco Interamericano de Desenvolvimento, levando o banco a cancelar o evento. No mês passado, a China se juntou à Rússia para vetar uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, elaborada pelos Estados Unidos, pedindo uma nova eleição presidencial na Venezuela.

No entanto, as autoridades chinesas – ávidas por defender seus investimentos na Venezuela – há anos jogam dos dois lados da rede, realizando reuniões regulares com a oposição de Maduro. Em fevereiro, diplomatas chineses conversaram com altos funcionários da oposição em Washington, segundo duas pessoas familiarizadas com as reuniões. O argumento da oposição: Seus investimentos estarão seguros se Maduro cair.

Na sexta-feira, o governo de Maduro anunciou um presente chinês de 65 toneladas de suprimentos médicos. O anúncio foi feito no mesmo dia em que a Cruz Vermelha anunciou que começaria a distribuição neste mês de uma ajuda em grande escala para 650 mil venezuelanos que enfrentam as piores condições.

"Esta ponte aérea que estamos construindo com a China representa um investimento importante em nosso povo", disse Tareck El Aissami, ministro das Indústrias de Maduro, a repórteres em Caracas.

Acordos da era Chávez

A cooperação russa com a Venezuela data de acordos de armas fechados com Hugo Chávez – o antecessor e mentor socialista de Maduro. Entre 2006 e a morte de Chávez em 2013, a Venezuela comprou quase US$ 4 bilhões em equipamentos militares russos, incluindo cerca de 5 mil mísseis terra-ar MANPADS.

A cooperação militar levou a enormes investimentos da Rússia no setor petrolífero da Venezuela e a uma disposição de conceder empréstimos em condições favoráveis. No início de dezembro, dois bombardeiros russos de longo alcance Tu-160 chegaram ao aeroporto internacional na região de Caracas. A aeronave russa depois participou de exercícios conjuntos.

Mas a Rússia tem muito menos poder de fogo para, teoricamente, implantar na Venezuela do que na Síria – em parte porque a Venezuela está tão longe. A Rússia não possui uma base militar de pleno direito na região, e seu único porta-aviões está fora de operação.

"Haverá apoio político e moral", disse Fyodor Lukyanov, analista de política externa russa que assessorou o Kremlin. "Mas a Rússia não pode enviar um contingente armado para lá. Não é realista."

Socorro russo

No entanto, linhas econômicas podem ser mais importantes para a sobrevivência de Maduro. As sanções dos EUA emitidas em janeiro impediram a Venezuela de vender seu petróleo bruto para as refinarias norte-americanas destinadas a processar seu óleo cru de alta viscosidade. Este mês, o embarque e desembarque da Venezuela tem sido caótico em meio a apagões de energia em todo o país. Mas pelo menos um petroleiro deixou a Venezuela para a Índia, transportando petróleo bruto venezuelano para uma refinaria de propriedade da Rússia, disse Dallen, o corretor da Flórida.

Antes das sanções dos EUA, a Venezuela exportava petróleo bruto para os Estados Unidos e importava a gasolina refinada. As sanções deixaram Maduro lutando para resolver uma súbita falta de gasolina. Ivan Freitas, líder sindical da PDVSA, disse que os relatórios dos trabalhadores portuários com acesso aos horários dos navios mostram que a Rosneft entregou pelo menos um carregamento de 300.000 barris de gasolina à Venezuela no mês passado, com cerca de mais 1,6 milhão de barris esperados, mas ainda não confirmados.

"A Rosneft se tornou a salvadora da PDVSA", disse Freitas. "A ajuda da empresa está ganhando tempo para Maduro."

A Rosneft não respondeu a um pedido de comentário.

A assistência russa se estende além da indústria do petróleo. No mês passado, Moscou entregou 7,5 toneladas de suprimentos médicos e prometeu enviar 7,7 toneladas a mais. Apesar da ajuda mínima diante dos problemas imensos enfrentados por hospitais com pessoal insuficiente, poucos recursos e em deterioração em toda a Venezuela, a ajuda russa forneceu a Maduro um golpe de relações públicas.

Dentro do Hospital Ana Francisca Pérez de León, no leste de Caracas, na sexta-feira, sua diretora pró-Maduro, Zayra Medina, disse que a ajuda russa chegou em 23 de fevereiro, escoltada por um russo, um tradutor e um homem com uma câmera de vídeo. Ela disse que o hospital usou o material em cerca de 10 dias.

"Esperamos que eles continuem nos ajudando", disse ela. "Eu me sinto feliz sabendo que não estamos sozinhos. A Rússia está nos ajudando a salvar vidas no meio de uma tempestade."

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