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Presidente da França, Emmanuel Macron, está com a popularidade em baixa | BERTRAND GUAY/AFP
Presidente da França, Emmanuel Macron, está com a popularidade em baixa| Foto: BERTRAND GUAY/AFP

Quando ainda estava concorrendo à presidência da França, Emmanuel Macron, disse que governaria seu país como o deus supremo da mitologia romana, Júpiter, acima das divisões políticas entre centro, esquerda e direita. Eleito o presidente mais jovem na história da França, então com 39 anos, queria representar a renovação, sem amarras com a velha oligarquia política, e foi o que aconteceu nos seus primeiros meses de mandato. Mas o desgaste causado pelas reformas econômicas impopulares, somado ao desempenho econômico abaixo do esperado e um escândalo com um dos membros de sua equipe, foram aos poucos apagando a imagem jupiteriana do presidente - pelo menos em casa. 

Macron, que chegou a desfrutar a aprovação de 60% dos franceses em julho de 2017, viu a satisfação da população com sua gestão cair para míseros 28% em setembro de 2018. Apesar de esta mudança brusca de opinião pública ser natural entre os franceses depois de um ano de governo, vale notar que Macron foi do céu ao inferno, registrando um índice pior do que François Hollande e Nicolas Sarkozy no mesmo período de suas presidências, segundo a empresa de opinião pública francesa OpinionWay. 

A história não melhora no cenário internacional. Sua defesa do acordo nuclear do Irã não surtiu efeito com o governo americano, que acabou retirando os EUA do pacto. E a recente ascensão de nacionalistas na Europa contrasta fortemente com sua busca pelo multilateralismo e o fez tropeçar nas reformas que ele propôs para a União Europeia. 

A onda do “todos querem ser Macron” saiu de moda ou é apenas uma fase ruim para o presidente francês? 

Os problemas domésticos 

Os problemas internos de Macron ficaram mais visíveis aos olhos do mundo com o caso Benalla, quando, em julho deste ano, foram divulgadas imagens do ex-chefe de segurança do presidente francês, Alexandre Benalla, agredindo um manifestante em um protesto contra a reforma trabalhista proposta por Macron, em Paris. O Palácio do Eliseu foi criticado por tentar acobertar o delito, minimizar o caso e privilegiar Benalla. 

Segundo afirmou o diretor de Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop), Jérôme Fourquet, em entrevista ao Washington Post, Macron baseou sua campanha na promessa de uma república exemplar e prometeu uma "ruptura" entre "o velho mundo da política e um novo mundo que é transparente e apropriado", mas o Caso Benalla sugeriu que sua presidência era como as outras que tinham o antecedido. 

Outros mal entendidos também podem ter contribuído para a queda da popularidade de Macron por passarem a imagem de um presidente arrogante, como quando ele deu um conselho a um jovem desempregado, dando a entender que o homem não estava se esforçando o suficiente para conseguir um trabalho. 

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Mas se fossem apenas esses os problemas de Macron, seria fácil contorná-los – não é o caso. Dezessete meses depois de ter assumido como chefe de Estado da França, ele não conseguiu impulsionar a economia do país como havia prometido em sua campanha. "Quando você tem altas expectativas e nenhum resultado tangível - o que acontece é a frustração popular", disse Christophe de Voogd, professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris, em entrevista à BBC. 

O desemprego registrou uma queda nos seus primeiros meses de governo, chegando a 9,1%, mas voltou a subir para 9,3% em agosto deste ano. Já a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) francês caiu de 1,9% para 1,7% em 2018, segundo o primeiro-ministro Edouard Philippe. Se o número se concretizar, será 0,5 ponto percentual a menos que o PIB registrado em 2017, quando o clima era de entusiasmo no mercado com a agenda reformista de Macron. 

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Uma agenda que, aliás, lhe deu rendeu o apelido de “presidente dos ricos”. Mesmo sob protestos, Macron mudou a legislação trabalhista, facilitando a contratação e demissão com o objetivo de tornar o mercado de trabalho francês mais flexível e dinâmico, e também reformou a lei do imposto sobre fortunas, reduzindo a contribuição a ser paga pelos mais ricos. As mudanças foram possíveis porque ele conta com o apoio da maioria no parlamento. 

Agora ele está enfrentando uma nova onda de manifestações contra sua proposta para mudar a aposentadoria. No dia 9 de outubro, milhares de pessoas foram às ruas em todo o país para contestar a reforma previdenciária, que prevê a extinção dos 42 regimes especiais de aposentadoria que existem na França atualmente, tornando o sistema igual para todos os contribuintes. Ao fazer isso, o presidente diz que não vai aumentar a idade mínima para a aposentadoria, que na França é de 62 anos. 

O professor de História Contemporânea da Universidade de Brasília (UnB), Estevão Chaves de Rezende Martins, acredita que a agenda de reformas do presidente influenciou a queda de aprovação de Macron, mas lembra que seus efeitos positivos serão percebidos pela população em longo prazo. “Seus oponentes políticos [de Macron], seja os da extrema-direita ou da extrema-esquerda, vão criticá-lo e dizer que ele perdeu a mão no governo, mas acho que ele manteve o pulso firme”, disse o professor, referindo-se à sustentação das promessas de campanha, que, no fim das contas, colocaram Macron no poder. 

“Macron sabe o que quer, tem um programa seguro e claro de reformas econômicas liberais, não parece ter perdido o controle de nada, sofre ataque das oposições, que no caso dele vêm de todos os lados porque ele é o figurino político que saiu do padrão”. 

A imagem pública de seu governo também foi abalada depois que vários membros de seu gabinete renunciaram, inclusive nomes notórios como o ministro da Ecologia, Nicolas Hulot, e, mais recentemente, Gérard Collomb, do Interior. Ao deixar o governo Hulot disse que as ações de Macron não condiziam com seu discurso quando o assunto era mudança climática - um de seus compromissos políticos. Collomb foi ainda mais crítico ao anunciar sua saída: em sua opinião, os índices de aprovação decrescentes do governo eram resultado de uma "falta de humildade" do presidente. “Quando, em algum momento, você se torna muito seguro de si mesmo, você acredita que vai ganhar todas”, disse Collomb, que oficialmente justificou sua saída do governo para que possa concorrer à prefeitura de Lyon. 

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Depois das baixas, Macron anunciou uma reformulação de seu gabinete nesta semana. Christophe Castaner, que dirigiu o partido político de Macron, República em Marcha, foi nomeado ministro do Interior, um cargo que supervisiona a segurança nacional e é um dos mais importantes do governo francês. Macron também nomeou novos ministros da cultura e da agricultura, enquanto outras posições importantes foram deixadas como estavam. Como notado pelo correspondente do Washington Post na França, James McAuley, as mudanças anunciadas não foram tão extensas quanto alguns analistas políticos anteciparam, gerando dúvidas se seriam suficientes para estabilizar a administração. 

"A magia dos Macron se foi", disse Fourquet. "Ele é visto como normal agora, apenas outro presidente, e será um caminho difícil de volta [para o topo]". 

Mas para Martins, ainda não é possível afirmar que Macron perdeu sua força política. Talvez as eleições municipais de 2019 não sejam tão favoráveis aos seus aliados, devido à agenda de reformas do governo, mas a partir de 2021, a administração provavelmente já terá passado pelos assuntos mais espinhosos e com isso a aprovação do presidente tende a subir. 

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“A partir de 2020 e 2021, a turma [do governo] vai agir de forma mais moderada, já apostando em uma eventual reeleição de Macron em 2022. Mas se a popularidade do presidente continuar lá embaixo, ele corre o risco de levar uma rasteira”. 

Problemas no exterior 

Em 2017, o jovem presidente francês marcou sua estreia na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) ao fazer uma defesa emocionada e triunfante da globalização e do multilateralismo. Imediatamente ele passou a ser visto como a antítese do colega americano Donald Trump e sua política da “América em Primeiro Lugar”, o que para alguns pode ser visto como uma vantagem. Mas como escreveu Ian Bremmer, presidente da consultoria de geopolítica Eurasia Group, em artigo para a revista Time, embora não haja muitas pessoas dispostas a defender a ideia de globalismo nos dias de hoje, ainda não é possível saber o que Macron pode oferecer com sua liderança no palco mundial. 

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O primeiro teste de Macron será nas eleições parlamentares da União Europeia em maio de 2019. Sua campanha já começou: visitou a Dinamarca, a Finlândia, a Espanha, Portugal e Luxemburgo com o objetivo de fazer alianças no combate ao populismo, representado na Europa por figuras como o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban. 

Entre as ambições de Macron para o bloco europeu estão: unir mais fortemente as economias da zona do euro com um único ministro das Finanças, harmonizar os sistemas fiscais e fazer da UE um ator mais coeso na política externa com sua própria força militar. 

A chanceler alemã, Angela Merkel (E) e o presidente da França, Emmanuel Macron, durante uma cúpula de líderes da União EuropeiaEMMANUEL DUNAND/AFP

Mas o presidente francês está cada vez mais solitário nesta empreitada. A aliada mais próxima é a chanceler alemã Angela Merkel, mas enfrentando problemas internos e correndo o risco de perder o cargo, ela decidiu acenar aos seus aliados conservadores e restringir a política de imigração do país. Enquanto isso, cresce a influência de líderes como o ministro do Interior italiano, Matteo Salvini, que fechou uma aliança com Steve Bannon para lançar um movimento nacionalista de extrema direita na Europa. 

“Não há muito que esperar de uma liderança francesa solitária. O governo francês está tolhido pela bagunça política na qual se encontra a União Europeia”, concluiu Martins, professor da UnB, afirmando também que, independentemente do governo, a França, recentemente, perdeu muito da sua posição de liderança.

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