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Os resultados das primárias republicanas e democratas nos 15 estados americanos que participaram da "Super Terça" confirmaram o favoritismo do presidente dos EUA, Joe Biden, e seu principal adversário, o ex-presidente Donald Trump, para concorrerem à reeleição por meio de seus respectivos partidos em 5 de novembro.
Enquanto o atual mandatário venceu em todos os estados participantes - perdendo somente na ilha de Samoa Americana, um pequeno território do Pacífico Sul incorporado pelo país - Trump garantiu centenas de delegados em 14 estados, sendo derrotado somente em Vermont para Nikki Haley, que desistiu da corrida na legenda, nesta quarta-feira (6), após o fracasso de campanha.
Mas, apesar dos dois representantes saírem vitoriosos da "Super Terça", nenhum ainda possui a quantidade de delegados necessária para ser oficialmente reconhecido como candidato em seus partidos, portanto a disputa segue nos próximos meses, com desafios expostos dos dois lados nesta importante data do calendário eleitoral americano.
De um lado, o republicano enfrenta quatro processos criminais em diferentes estados do país, com acusações que vão desde suborno, posse ilegal de documentos confidenciais e até interferência eleitoral.
Por outro ângulo, Biden sofre uma investigação de impeachment, proposta pelo Partido Republicano da Câmara, envolvendo ganhos ilegais de empresas estrangeiras com as quais seu filho, Hunter Biden, fazia negócios.
Apesar dos esforços dos dois lados para atrapalhar a campanha do adversário, o professor de Relações Internacionais do Ibmec, Ricardo Caichiolo, acredita que as ações em andamento no Congresso e na justiça dos EUA não devem interferir na continuidade da agenda eleitoral dos políticos.
"Não há previsão de que esses processos possam atrapalhar a corrida eleitoral. Na verdade, a 'Super Terça' até deixou muito claro que a percepção daqueles que apoiam Trump independe dessas 91 acusações criminais, que não impediram sua nomeação como candidato republicano, mas acabaram consolidando o apoio desse eleitorado para sua indicação. Acredito que esses processos contra os dois não vão interferir nas campanhas até novembro".
Para o especialista, mesmo que Biden insista na retórica de preservar as instituições democráticas, como tem feito nos últimos meses fazendo referência ao que aconteceu após sua eleição, na suposta tentativa de interferência de Trump no resultado de 2020, "isso aparentemente não terá impacto nessas eleições e na decisão final do eleitorado".
Uma tendência que cresceu nos últimos dias, após o resultado das primárias democratas do Michigan, foi o voto "descompromissado", quando o eleitor opta pela legenda nas urnas, mas rejeita os candidatos listados. No estado, foram mais de 10 mil votos nesse sentido, o que continuou acontecendo nesta Super Terça, como em Minnesota, onde os votos de protesto chegaram perto de 20%.
"Isso aconteceu sobretudo em Michigan e acabou se espalhando para outros estados, como vimos. Na verdade, esse é um recado de parte da comunidade desses estados que consideram o alinhamento de Biden com Israel equivocado, então existem comunidades importantes dentro dos EUA que são contra esse apoio ao país, principalmente a considerável população árabe-americana".
De acordo com o Phd em Ciências Políticas, esse movimento "é um alerta para Biden de que os eleitores estão com o partido democrata, porque entendem que a outra opção seria um ataque a democracia", seguindo o que o próprio presidente defende, "mas que eles gostariam de enviar essa mensagem ao presidente sobre o descontentamento com a política adotada por Israel e uma forma de protesto no sentido de que o governo americano pressione Tel Aviv por um cessar-fogo e o fim do conflito, se possível, de forma permanente".
Dos 15 estados que realizaram primárias nesta terça (5), os democratas tiveram a possibilidade de votar “sem compromisso com o candidato" no Alabama (6%), Colorado (7,6%), Massachusetts (9,3%), Minnesota (19%), Carolina do Norte (13%), Iowa (3,9%) e Tennessee (8%).
Para o ex-presidente Donald Trump, um dos grandes desafios da corrida eleitoral até novembro também envolve a unificação de seu partido, visto que a adversária da legenda, Nikki Haley, ainda não demonstrou seu apoio a ele, apesar da desistência na corrida.
Segundo Caichiolo, a desistência de Haley na corrida republicana abre caminho para Trump conquistar os delegados que faltam para ser considerado oficialmente candidato.
"A saída de Haley deixa Trump livre para disputar as eleições de novembro. Não há, de acordo com o que vimos na imprensa até o momento, previsão imediata de apoio da ex-governadora para Trump, mas existe uma expectativa de que ela o apoie devido à pressão do partido. O próprio Trump disse em seu discurso depois da Super Terça que espera uma união dentro da legenda. Assim, acredito que até novembro haja uma consolidação nesse sentido, esse apoio da Haley deve acontecer até as eleições gerais", disse o especialista.
Os próximos meses prometem acirrar ainda mais a disputa entre a velha política dos democratas e republicanos. Mas, apesar dos candidatos serem os mesmos das últimas eleições, algumas discussões novas devem influenciar o voto do eleitorado americano.
"Apesar dos mesmos candidatos de quatro anos atrás, espera-se uma campanha bem distinta", diz o professor do Ibmec, "visto que estamos vivendo um momento político e econômico diferente das últimas eleições americanas".
Para Ricardo, o momento é inédito por envolver dois representantes que já estiveram no cargo anteriormente, "algo que não vimos em eleições anteriores".
"Biden surgiu como desafiante de Trump. O democrata tinha uma possibilidade maior de críticas, porque não existia o que chamamos de "telhado de vidro", uma vidraça que permite o recebimento de críticas por parte do adversário. Mas agora você tem o Trump com essa possibilidade, tendo sido um ex-presidente, de criticar a atual administração e isso com certeza irá influenciar nas críticas e análises dos dois lados até o final de campanha".
Outra questão de destaque, segundo o especialista, agora em relação ao Trump, é que diferente de quatro anos atrás, ele perdeu um pouco a "áurea intimidadora" que possuía nas primeiras eleições.
"Vejo que as pessoas acabaram se acostumando com o Trump. Ele não diminuiu os ataques em sua retórica, mas ela tem sido barrada por não estar mais tão presente nas redes sociais, sobretudo no Twitter, mas continua com sua verborragia tradicional, de forma limitada. Portanto, muitos eleitores acabam não vendo ele mais como uma ameaça, como poderiam considerar anteriormente", disse.
Imigração, economia e capacidade física dos candidatos no foco das eleições
Nos últimos meses, a imprensa americana divulgou uma série de pesquisas de opinião mostrando quais são as prioridades dos eleitores americanos no momento de escolher um candidato à presidência. Um dos levantamentos, feito pela Fox News, apontou que a economia e crise migratória lideram os pontos de preocupação entre os votantes.
Caichiolo concorda com esses dados, defendendo que eles devem continuar sendo alvos de discussão entre os americanos nos próximos meses.
Além disso, um outro foco de debate que continuará em alta, segundo o especialista, é a capacidade mental e física dos candidatos para cumprir o mandato presidencial. "Biden está com 81 anos e Trump com 77. As confusões mentais têm acontecido dos dois lados. Recentemente, Trump confundiu a Nikki Haley com a Nancy Pelosi - ex-presidente da Câmara. Isso pode ser um problema para os candidatos e deve ser usado nas duas campanhas até novembro".
Para Biden, a questão é muito mais problemática nesse sentido, não só pela diferença de idade, mas porque a percepção do eleitorado americano é de que realmente ele possui uma falta de acuidade mental e física, algo que é mais flagrante do que com o Trump.
A imigração também continuará sendo um ponto importante de discussão ao longo dos meses em meio à atual crise que afunda o país na violência e descontrole governamental. "Isso ficou claro a partir dessa Super Terça em pesquisas internas dos EUA em que essa questão chegou a ser para boa parte dos votantes o ponto mais relevante, até acima da economia. Então a política para imigrantes é uma temática importante que será muito abordada ainda nos próximos meses". A questão econômica também sempre é levada em conta nas eleições americanas.
Outra forte argumentação que deve ser usada por Trump contra Biden é a falta de credibilidade da atual gestão na condução da política externa do país. "Trump já afirmou que se estivesse na presidência a invasão da Rússia na Ucrânia e o conflito Israel-Hamas não teriam acontecido".
O professor ainda lembrou de uma das primeiras ações de Biden na política internacional que deram espaço para críticas internas: a retirada de tropas do Afeganistão que resultou na morte de três militares americanos. "Isso já havia abalado a credibilidade de Biden na política externa e agora a resposta militar de Israel após o ataque do Hamas, que se estende a seis meses, também tem afetado a visão dos eleitores na performance do atual presidente".