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Governo argentino

Milei divulgará novos arquivos da ditadura, apontando crimes de guerrilha como lesa-humanidade

Milei divulgará novos arquivos da ditadura, apontando crimes de guerrilha como lesa-humanidade
O presidente da Argentina, Javier Milei (Foto: EFE/EPA/MICHAEL BUHOLZER)

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O governo da Argentina, liderado pelo presidente Javier Milei, anunciou nesta segunda-feira (24) a desclassificação total dos arquivos secretos da Secretaria de Inteligência do Estado (SIDE) relacionados às atividades das Forças Armadas durante o período da última ditadura militar (1976–1983), bem como documentos de ações guerrilheiras da esquerda no mesmo período. A medida ocorre no Dia Nacional da Memória, da Verdade e da Justiça, data marcada por manifestações organizadas por grupos de direitos humanos e setores da esquerda argentina.

“O presidente instruiu a desclassificação total de toda a informação e documentação relacionada às ações das Forças Armadas durante o período de 1976 a 1983, bem como toda a outra documentação em outro período, mas relacionada às ações das Forças Armadas”, afirmou o porta-voz presidencial Manuel Adorni, em coletiva de imprensa na Casa Rosada, sede do Executivo argentino.

Segundo Adorni, os arquivos atualmente sob controle da SIDE serão transferidos para o Arquivo Geral da Nação, que passará a ser responsável por sua guarda e acesso público.

“Durante décadas, os arquivos em mãos da SIDE permaneceram nas sombras e só os governos de turno tiveram acesso a essa informação secreta. Apesar de propagandas vazias sobre seu compromisso com a verdade, a memória e a justiça, esses documentos foram utilizados como um botim de guerra, vai saber com que objetivo”, afirmou.

A medida cumpre, segundo o governo, o decreto 4/2010, emitido pela ex-presidente Cristina Kirchner, mas que “nunca foi totalmente implementado”. Para Adorni, é hora de “colocar fim à opacidade que envolveu os documentos durante décadas” e garantir que os registros “estejam a serviço da memória e não da manipulação política”.

Além da desclassificação dos arquivos, o governo Milei também anunciou uma mudança de postura em relação a episódios de violência cometidos por organizações armadas de esquerda nos anos 1970. A Casa Rosada passou reconhecer oficialmente como crime de lesa-humanidade o atentado terrorista cometido pelo Exército Revolucionário do Povo (ERP) contra o capitão Humberto Viola e sua família, em 1º de dezembro de 1974, em Tucumán, durante um período democrático.

Na ocasião, o militar foi assassinado junto com sua filha, María Cristina, de apenas três anos. A única sobrevivente do ataque foi María Fernanda Viola, outra filha do capitão. Segundo o governo Milei, o ERP tentou implantar na Argentina um governo “marxista, leninista e guevarista por meio da luta armada”.

“Como se isso fosse pouco, as famílias dos assassinos cobraram indenização de acordo com a lei 2443 por terem estado detidos durante o estado de sítio”, ressaltou Adorni. A lei a que Adorni se referiu na verdade tem o número 24.043 e foi sancionada em 1991. Ela reconhece o direito à indenização para pessoas que foram detidas pelo Estado durante a ditadura militar.

O governo anterior, liderado pelo peronista Alberto Fernández (2019-2023), havia sustentado perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 2022, que o atentado não configurava crime de lesa-humanidade e, portanto, era prescritível. Agora, o governo Milei adotará nova posição no órgão internacional e enviará ao Congresso um projeto de lei para tornar imprescritíveis, no âmbito penal e civil, esse tipo de crime.

“O Gabinete do Presidente destaca a comemoração do Dia Nacional da Memória pela Verdade e da Justiça, fazendo um chamado à reflexão em busca da história completa, sem viés ideológico nem censura às diferentes vozes que analisam e narram o ocorrido na década de 1970”, afirmou um comunicado oficial da Presidência argentina, publicado na manhã desta segunda.

Ainda segundo a nota, o governo fechou um acordo de solução amistosa com a família Viola.

“O presidente Javier Milei tomou a decisão de acompanhar o pedido de justiça da família Viola, instruindo a Secretaria de Culto e Civilização da Chancelaria Argentina para que reconheça perante a CIDH que este crime deve ser considerado um delito de lesa-humanidade, ocorrido no marco de um conflito armado interno.”

O governo comparou a decisão com processos similares em outros países. Adorni mencionou a desclassificação de arquivos nos Estados Unidos sobre o assassinato do presidente John F. Kennedy como exemplo do “valor da transparência histórica”.

“O que ocorreu no passado deve permanecer nos arquivos da história, não na SIDE”, reforçou.

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