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Kevin Spacey em seu traje de captura de movimentos durante a gravação de “Call of Duty: Advanced Warfare” | Activision
Kevin Spacey em seu traje de captura de movimentos durante a gravação de “Call of Duty: Advanced Warfare”| Foto: Activision

Francis Underwood, o desonesto político protagonista da série "House of Cards", frequentemente relaxa jogando videogame no escuro. Mas ele está só fingindo. "Digo sem meias palavras: nunca joguei videogame na vida", revelou Kevin Spacey, que interpreta Underwood.

Mas Spacey atuou em um desses jogos. O novo "Call of Duty", desenvolvido pela Sledgehammer Games e publicado pela Activision, tem Spacey como o vilão Jonathan Irons, presidente de uma empresa privada do setor armamentista, tão grande e poderosa que consegue um assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Atuar em videogames é participar de uma das maiores transformações na curta história desse meio, e a interpretação de Spacey em "Call of Duty" —bilionária produção do gênero "atirador em primeira pessoa"— fornece claras provas de como se dá essa mudança.

Durante anos, a dublagem e a atuação física —os movimentos do corpo de um personagem— eram realizadas separadamente, às vezes por pessoas diferentes. A voz de um ator era gravada em uma cabine, de forma semelhante ao que ocorre nos filmes de animação, e as ações físicas do personagem dos games eram posteriormente registradas em um cenário, usando técnicas de captura de movimentos.

"Aquele processo está ultrapassado e não existe mais", disse Michael Condrey, diretor operacional e de desenvolvimento da Sledgehammer Games. "Voz e corpo se movimentam juntos de uma maneira muito natural." Quando esses elementos são separados e depois remontados, diz ele, o personagem visto na tela pode ter uma aparência bem perturbadora.

A captura de atuação, uma tecnologia que permite ao software gravar simultaneamente voz e movimentos do corpo, é a nova palavra de ordem em atuação para videogames. "Call of Duty: Advanced Warfare" oferece um dos mais sofisticados exemplos dessa técnica. Os atores principais no jogo, incluindo Spacey, trabalharam por dez dias no mesmo estúdio em Los Angeles onde James Cameron grava a sequência de "Avatar".

A nova técnica mistura aspectos físicos e digitais da atuação, mais ou menos da mesma forma como, por exemplo, Andy Serkis pôde interpretar Gollum nos filmes da série "O Senhor dos Anéis", de Peter Jackson. Com a diferença de que, nesse caso, Kevin Spacey foi digitalizado para se parecer exatamente com Kevin Spacey, não com um monstro ou uma criatura mágica.

"Nada de maquiagem, nada de penteado, nada", disse Spacey. "Colocam pontos no seu rosto. Aí você entra numa espécie de macacão, que é extremamente feio. Um monte de bolinhas de borracha por cima de tudo. Eles fazem você entrar numa sala, e você precisa fazer todo tipo de movimento." Spacey se levantou e ficou de cócoras. "Eles querem ter certeza de que seu corpo será mesmo capturado. Então você precisa fazer todas essas coisas, e mexer as pernas, coisas estúpidas que você não faria em uma aula de ioga."

Depois colocam capacetes nos atores e pedem que eles façam várias expressões faciais por algumas horas, capturando os detalhes do rosto de cada pessoa, até os poros. Por fim, é o momento de incluir as falas. "E lá está você num estúdio completamente vazio", disse Spacey.

"É bem chato —é como estar numa caixa de papelão."

Nem todos os atores se saem bem sob essas condições. Muito antes da captura de atuação deslanchar nos últimos anos, as exigências específicas para a atuação em videogames já levavam a uma menor procura por atores de Hollywood, favorecendo especialistas mais anônimos.

"Quando você paga US$ 100 mil para uma celebridade das telas e depois a coloca em uma cabine de dublagem, às vezes acaba com a pior atuação que pode imaginar", disse Lev Chapelsky, gerente-geral da Blindlight, empresa que ajuda estúdios de jogos a contratar atores famosos.

Ou às vezes os famosos não estão interessados. Jack Black, que apareceu em dois videogames, queria muito dinheiro por "Halo 3", segundo Chapelsky. Robin Williams, que gostava de jogar videogame, disse que não apareceria do outro lado da tela por preço nenhum.

Existem importantes técnicas que um ator deve aprender para diferenciar a atuação em videogames da interpretação em filmes ou no teatro, disse Jennifer Hale durante uma aula magna sobre o assunto em agosto. Hale, descrita pela revista "The New Yorker" como "uma espécie de Meryl Streep do formato", é uma das mais conhecidas atrizes de videogame. Os atores de games, disse Hale, raramente têm acesso aos roteiros de antemão, por isso é essencial conseguir lê-los com pouca ou nenhuma preparação.

Quando a animação de videogames era mais caricatural, afirmou a atriz, a técnica exigia um tipo de interpretação "muito teatral". Agora, com visuais mais realísticos que permitem gestos menores e sinais não verbais, como um olhar ou uma careta, o estilo de atuação está mais próximo do que é visto no cinema e na televisão.

Devido à natureza sigilosa desse setor, a Activision escondeu o papel de Spacey dos seus colegas até o dia em que ele apareceu no estúdio, o que chocou os outros atores. "Eu pensei: ‘Por que vocês estão me olhando como se eu tivesse caído de uma árvore?’", disse Spacey.

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