| Foto: Chad Batka para The New York Times

O dia de Plácido Domingo começou com um ensaio geral no palco do Metropolitan Opera, onde trocou piadas com o elenco e a equipe técnica do teatro, onde vem cantando há quase meio século. Depois, devidamente trajado no figurino de Netuno, o deus do mar, ele repassou uma ária de Handel que está ensaiando para o revival da ópera "The Enchanted Island". Naquela noite ele continuava a pleno vapor, cantando num evento beneficente com os músicos da New York City Opera, a companhia que impeliu sua carreira e que foi fechada desde então. Tendo sido aplaudido em pé depois de cantar a ária de "Andrea Chénier", o regente George Manahan lhe ofereceu a batuta. Domingo a tomou e comandou a orquestra na abertura de "A Força do Destino", de Verdi.

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É o tipo de ritmo pelo qual Domingo sempre foi conhecido ao longo de toda sua carreira —e que ele vem conseguindo conservar muito depois da idade em que muitos cantores líricos se aposentam dos palcos e passam a dar master classes. Domingo festejou seu 73° aniversário em janeiro, em Viena, onde estava cantando o papel de Francesco Foscari em "I Due Foscari", de Verdi. Comentou, sorrindo, que esse é um dos poucos personagens velhos demais para ele. "Foscari está na casa dos 80 anos. Sou muito jovem para representá-lo."

"Estou nesta vida há tanto tempo —comecei a cantar com senhoras que poderiam ser minhas avós", disse, lembrando quando cantou na ópera "Lucia di Lammermoor", de Donizetti, em 1962, no teatro de ópera de Fort Worth, com Lily Pons, uma grande estrela lírica dos anos 1930. "Hoje canto com minhas netas."

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Plácido Domingo está desafiando a gravidade da idade e continua a comandar os palcos dos maiores teatros de ópera do mundo, graças a uma das transformações mais notáveis na história da ópera. Um dos maiores tenores da história recente, Domingo está tendo uma segunda carreira, cantando papéis de barítono.

Ele já cantou 144 papéis, em um repertório que varia de papéis italianos líricos até os papéis de "heldentenor" (tenor heroico) nas óperas de Wagner. "Sempre tive uma ânsia de procurar coisas interessantes", comentou. No teatro, não é incomum que o maior Hamlet de uma geração torne-se o rei Lear da geração seguinte. Mas evoluções desse tipo são difíceis de realizar na ópera, devido ao desgaste das vozes. Os papéis dos personagens mais velhos com frequência são compostos para vozes mais baixas que as dos heróis jovens.

Mas Plácido Domingo está fazendo isso acontecer e já tem compromissos assumidos para cantar um número crescente de papéis de barítono por anos pela frente. Se alguns críticos observam que faltam à sua voz as cores mais escuras de um barítono verdadeiro, sua capacidade de cantar os papéis com seu brilho inconfundível continua a emocionar muitos fãs pelo mundo afora. Sua mudança de voz nesta fase tardia de sua carreira cria desafios não apenas musicais, mas também de natureza dramática. Domingo nunca gostou de representar vilões, sendo que o repertório dos barítonos contém muitos deles. Ele retorna a algumas das óperas que lhe valeram seus maiores triunfos, incluindo "La Traviata" e "Il Trovatore", de Verdi —não no papel do amante, mas do pai ou do adversário.

Há limites, entretanto, às óperas que ele vai revisitar em registro mais baixo. Visto por muitos como o maior Otelo de sua geração, Domingo disse que jamais cantará o papel de Iago, o vilão responsável pela queda de Otelo. "Não posso trair Otelo", explicou. Ele ainda estuda mais planos para o futuro, observando que já se recuperou da embolia pulmonar que o levou ao hospital no ano passado. Disse que gostaria de representar o papel-título de "Rigoletto", de Verdi, e se sente tentado a cantar o papel de Amfortas em "Parsifal", de Wagner. Espera ainda cantar no Metropolitan Opera para comemorar o cinquentenário de sua estreia, que aconteceu em 1968. "Tenho muitos planos", disse o barítono. "Não sei quantas delas vou conseguir realizar. Mas não é por falta de ideias. É possível que falte tempo."