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O sistema fiscal do Japão permite que as cidades enviem presentes a doadores de fora, como Shigeki Kanamori | Ko SasakiI/ The New York Times
O sistema fiscal do Japão permite que as cidades enviem presentes a doadores de fora, como Shigeki Kanamori| Foto: Ko SasakiI/ The New York Times

Nesta pequena vila de pescadores, os incentivos fiscais vêm em uma geladeira de isopor. Isso é parte do grande programa de abatimento de impostos que está acontecendo em todo o Japão.

Os contribuintes que doam dinheiro para Hirado, por exemplo, conseguem uma boa dedução e um carregamento de cavaquinhas, de moluscos de casca espiralada e de ostras.

Você não gosta de frutos do mar? Hirado tem centenas de outros presentes de agradecimento, como um mês de fornecimento de vegetais, uma bicicleta elétrica dobrável ou uma foto de casamento com roupas de gala e hospedagem em um hotel.

Os doadores — 36 mil em um ano — hoje ultrapassam os moradores. “Penso neles como novos cidadãos”, diz o prefeito de Hirado, Naruhiko Kuroda.

Explorando uma peculiaridade do sistema fiscal do país, várias cidades onde a população está diminuindo suplementam sua receita cortejando doadores de fora.

Os governos locais oferecem presentes tão diversos quanto carne marmorizada de bois wagyu e férias em estâncias de águas termais. Uma cidade no centro do Japão, Bizen, conseguiu 56 milhões de ienes, ou cerca de 450 mil dólares, com uma oferta de tablets.

O governo dobrou o limite superior da dedução de impostos em 1« de abril para 20 por cento do valor das taxas municipais devidas pelo contribuinte. Isso pode aumentar muito as doações, que chegaram a 14 bilhões de ienes no país todo no ano passado. O Japão vê esse movimento como uma maneira de responder às teimosas disparidades de riqueza entre as cidades e o campo.

Os críticos, no entanto, explicam que o sistema perdeu seu propósito inicial, que era permitir que os moradores das cidades ajudassem as vilas de seus ancestrais. O sistema é conhecido como furusato nozei, ou “imposto da cidade de origem”. Mas os doadores não precisam necessariamente ter qualquer conexão com os lugares, e poucos realmente as têm.

O custo dos presentes de agradecimento também está crescendo sem parar à medida que os governos locais competem para atrair patronos – deixando menos dinheiro para gastar nos projetos públicos. As áreas urbanas, onde a maioria dos doadores mora, acabam arcando com os custos, de acordo com Takero Doi, professor da Universidade Keio, já que os abatimentos nos impostos tiram o rendimento de outras cidades. “No final, é um jogo em que o resultado dá zero.”

Hirado começou a aceitar doações logo depois do início do programa em 2008, mas só recentemente passou a receber uma quantia importante. A cidade colocou no ar um site onde os doadores podem escolher os presentes e usar um sistema de pontos para reivindicar as recompensas. É preciso fazer, por exemplo, uma doação de 10 mil ienes para conseguir a entrega de frutos do mar.

A cidade ganhou 1,46 bilhões de ienes em doações no último ano fiscal, que acabou em março – sete por cento de seu orçamento anual. Foi o maior valor de todos os governos locais do Japão.

“Minha esposa viu algo sobre isso na televisão e disse que seria uma boa maneira de economizar nos impostos”, diz Shigeki Kanamori, um rico incorporador de imóveis de Tóquio.

Kanamori distribuiu três milhões de ienes para cerca de 200 cidades. Em retorno, recebeu presentes que valem cerca de metade desse valor. Ele tirou do bolso apenas dois mil ienes, mais ou menos o valor de um almoço em um restaurante de Tóquio.

“Meu maior problema é que minha geladeira está cheia”, afirma. Ele escreveu um livro sobre onde encontrar os melhores negócios.

Algumas cidades optaram por dar presentes excêntricos como maneira de se destacar. Higashi Kagawa, na ilha de Shikoku, manda aos doadores uma seleção de besouros exóticos.

Os defensores do sistema dizem que seus méritos sobrepassam seus problemas. Algumas regiões do Japão já dependem fortemente de subsídios externos. Mas, afirmam os especialistas, muito do dinheiro é aplicado de maneira obscura ou mal gasto.

Em contraste, o furusato nozei é mais transparente, de acordo com seus defensores. As cidades que recebem as doações propõem uma lista de usos para o dinheiro e deixam que os doadores escolham o que vão pagar. Entre as causas mais populares estão financiamentos para creches e computadores para escolas locais.

Takayuki Fukuoka, agricultor que planta aspargos em Hirado, conta que cerca de 30 por cento de sua renda vêm dos pedidos de presentes. Ele espera que o programa possa abrir os olhos dos fazendeiros para novas maneiras de marquetear seus produtos, ao invés de apostar no sistema de monopólio da venda por atacado, que domina a agricultura japonesa.

“Até agora este tem sido um lugar muito fechado”, diz ele.

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