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O escritório do El Universal, jornal que foi vendido a uma empresa desconhecida | Ramon Espinosa/Associated Press
O escritório do El Universal, jornal que foi vendido a uma empresa desconhecida| Foto: Ramon Espinosa/Associated Press

Um dos maiores jornais pró-oposição da Venezuela foi vendido em uma transação cercada de mistério, gerando dúvidas e temores em relação à independência da imprensa.

El Universal é o terceiro maior órgão do setor no país a mudar de mãos desde a morte do presidente socialista Hugo Chávez, em 2013, e a eleição de seu sucessor, Nicolás Maduro.

A Venezuela é uma nação profundamente dividida, onde o doutrinamento e a imprensa há muito fazem parte da guerra política entre um Estado esquerdista poderoso e uma oposição concentrada na classe média e na elite. O governo opera pelo menos dez canais de TV e mais de cem estações de rádio e os críticos afirmam que a imprensa independente sente uma pressão cada vez maior para se calar ou se autocensurar.

As outras duas transações recentes envolveram a Globovisión, estação de TV que promoveu agressivamente a campanha política da oposição, e Cadena Capriles, empresa que publica o Últimas Noticias, um dos diários de maior circulação do país. Sob o comando dos novos donos, as notícias de ambos se tornaram mais favoráveis ao governo.

Muitos aqui temem que o mesmo aconteça ao El Universal, jornal de 105 anos que sempre foi crítico à governança.

Em um post ousado no blog do site da publicação, seu editor-chefe, Elides Rojas, desafiou os novos donos a manter o padrão jornalístico.

"Eventos como os ocorridos no Globovisión ou Cadena Capriles não serão aceitos sob hipótese nenhuma", escreveu Rojas.

Em entrevista, ele disse temer que a compra seja parte de uma tendência na qual o governo passa a ser forte influência na imprensa jornalística.

A nova dona do jornal foi identificada como uma empresa espanhola minúscula, desconhecida por aqui, chamada Epalisticia.

"Acho que por trás dessa transação há ‘laranjas’ ligados a pessoas amigas do governo", afirma Rojas.

Segundo dados do governo espanhol, a Epalisticia foi registrada em Madri em agosto passado como uma companhia no ramo imobiliário e de construção, mas, em outubro, entrou com um novo protocolo declarando que seu objetivo era "investir e administrar meios de comunicação" com foco na América Latina.

O site da empresa foi criado há questão de semanas por um designer de Miami e está funcionando em caráter parcial, mas o suficiente para se saber que tem "capital comprometido de mais de US$1 bilhão", embora não especifique nenhum tipo de investimento.

Os e-mails que enviei ao endereço fornecido pelo site voltaram, com um aviso de que não puderam ser enviados e ninguém atendeu as ligações para o número de telefone da empresa.

Os novos donos nomearam presidente de El Universal um empresário venezuelano, Jesús Abreu, irmão de José Antonio Abreu, fundador de um programa muito famoso de música clássica para jovens pobres chamado El Sistema.

Em entrevista publicada no El Universal, Jesús disse: "Não tenho motivos para crer que haja algum tipo de negociação entre os novos investidores e o governo".

Perguntado sobre a filosofia do jornal, ele respondeu: "Não criticaremos só o governo, mas tudo que precisa ser modificado".

Outras vendas posteriores no setor seguiram o mesmo padrão e em todas há suspeitas de que aliados do governo estejam por trás das aquisições.

Para piorar, a Venezuela tem uma longa tradição desse tipo de negociatas, nas quais indivíduos ricos e poderosos usam outras pessoas como "donos de fachada".

Carlos Correa, diretor executivo da Public Space, uma ONG que cuida da liberdade de imprensa, disse: "O mundo da informação na Venezuela atualmente enfrenta uma pressão política muito forte que afeta sua diversidade e pluralismo".

María Eugenia Díaz e Walt Baranger contribuíram para a reportagem

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