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 | Fotos: Pete Muller para The New York Times
| Foto: Fotos: Pete Muller para The New York Times
  • A Galeria Nacional de Arte de Ruanda, em Nyanza, e o Centro Artístico Inema, em Kigali; animado ambiente artístico transformou país em centro de exposições e performances

Após 20 anos de um genocídio que em cem dias matou cerca de 800 mil pessoas —a maioria homens, mulheres e crianças da etnia tutsi—, Ruanda está em ascensão. Sua economia está crescendo, o turismo está aumentando e, inesperadamente, um ambiente artístico está florescendo em Kigali, agradável capital onde 1 milhão de pessoas vivem entre morros verdejantes e árvores floridas.

O animado movimento artístico transformou a cidade outrora pacata e traumatizada em um lugar onde não apenas exposições de arte, mas também saraus literários, apresentações de dança e shows acontecem regularmente. Lá, artistas oferecem palestras na hora do almoço em espaços de trabalho cooperativo. Além disso, várias start-ups de tecnologia e um coletivo de moda fincaram pé no local.

Os artistas daqui são em grande parte autodidatas. Alguns, como Strong Karakire, ainda tentam elaborar as difíceis experiências do passado local. "Eu estou fazendo arte como terapia."

Durante o genocídio realizado por extremistas hutus, entre abril e julho de 1994, o pai de Karakire e dois de seus irmãos mais velhos foram assassinados por vizinhos em Nyamirambo, bairro de Kigali onde mora. Ele tinha oito anos e se escondia em um orfanato com a mãe. Outro irmão estava no exército rebelde que libertou o país, localizado no centro-africano, após mais de três meses de carnificina. Neste ano, Ruanda marca o 20° aniversário do genocídio com uma série de eventos.

Hoje, a crescente cena artística funciona como uma lente para a complexa história do país. Os pontos artísticos se espalham pela moderna capital: desde ateliês independentes em bairros humildes, como Nyamirambo, até sofisticadas galerias em Kacyiru, bairro de embaixadas, passando pelas criativas esculturas metálicas instaladas entre o mato que cresce no jardim de uma cooperativa artística em Kimihurura. Também são realizadas exposições em Kiyovu, no Grand Hôtel des Mille Collines, refúgio durante o genocídio retratado no filme "Hotel Ruanda", de 2004.

Há uma década, nem sequer havia instituições artísticas no país. Mas, em 2006, foi tomada a decisão de converter um antigo palácio no primeiro museu de arte contemporânea do país. O local surpreendeu muita gente: o edifício neoclássico no topo de uma linda colina, onde agora fica a Galeria Nacional de Arte, está na cidade de Nyanza, no sudoeste do país, a cerca de uma hora e meia de carro de Kigali. Ali funcionou, no passado, a imponente sede do Supremo Tribunal de Ruanda.

Os diretores do novo museu enfrentaram um desafio: como se constrói do zero um acervo de arte contemporânea num país com pouquíssimos artistas? A solução à qual chegaram foi a realização de concursos artísticos anuais para ruandeses, em que as obras vencedoras eram adquiridas para o acervo. Cada competição exigia que os artistas apresentassem trabalhos abordando um tema ligado à história do país. O tema de 2006 foi "Paz e Tolerância", e em 2007 artistas trabalharam sob a rubrica "Para Não Esquecer, Para Lembrar". "Ninguém estava ciente da importância da arte em nossa sociedade", disse Lia Gieling, ex-curadora da Galeria Nacional de Arte. "Foi muito importante demonstrar como os artistas podem contribuir para a cura e a reconciliação." Após três edições do concurso e várias doações, o acervo do museu cresceu para cerca de 125 pinturas, esculturas e instalações.

Em Kigali, as galerias e outros espaços expositivos revelam uma profusão de cores e estilos artísticos. As pinturas são muitas vezes penduradas com poucos centímetros de espaço separando umas das outras, ou ficam empilhadas contra a parede. Os artistas trabalham e às vezes moram nos imóveis. Frequentemente, estão disponíveis para explicar o seu trabalho. Em algumas das galerias, o envolvimento comunitário —aulas de arte para órfãos e crianças do bairro, programas voltados para ajudar portadores do HIV ou mulheres desfavorecidas— desempenha um papel importante.

O Centro Artístico Inema foi inaugurado em 2012 numa casa de dois andares. Na parte de trás do imóvel, os 13 artistas residentes espalham suas tintas e montam instalações e as integrantes de uma cooperativa feminina produzem bijuterias e acessórios para serem vendidos na lojinha da galeria.

A atriz e musicista Carole Karemera, muito ativa na cena cultural da cidade, disse ver o mundo da arte em Ruanda como "uma ponte entre o passado e o futuro". "O nosso passado não é glorioso em tudo, mas estamos gloriosamente presentes", disse ela. "Estamos muito animados a respeito de quem poderemos nos tornar."

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