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Antes de amanhecer, Carlos Garcia Lobo pulava da cama, os olhos brilhantes de expectativa, e perguntava à mãe se já podia ir para a escola. E toda vez ela tinha que dar a mesma resposta ao filho de oito anos: ainda não.

Quatro meses depois de fugir de Honduras com um primo de quinze anos, Carlos alcançou o que parecia ser um obstáculo intransponível: como dezenas de menores desacompanhados entre os 2.500 imigrantes entregues a parentes e/ou patrocinadores em Long Island, Carlos não pôde se matricular na escola – até o fim de outubro, quando finalmente realizou seu sonho.

A dificuldade desconcerta os pais, que afirmam não ter meios para acompanhar a burocracia imposta pelas escolas. E apesar da exigência legal da frequência escolar, muitas crianças tiveram que ficar meses em casa depois do início do ano letivo. Suffolk e Nassau, em Long Island, estão em terceiro e quinto, respectivamente, nos EUA, depois de condados em Houston e Los Angeles, no número de menores desacompanhados absorvidos este ano. Miami-Dade County é o quarto.

Muitos são proibidos de se matricular porque as famílias não podem reunir os documentos exigidos para provar que residem no bairro ou estão sob tutela – dificuldades que contradizem as exigências legais do procedimento de matrícula que o Departamento Estadual de Educação emitiu em Nova York, em setembro.

Depois de sair de Honduras fugindo das gangues que assaltaram a casa de sua avó, Carlos chegou à fronteira em junho com o primo e um guia. No dia dez de julho, se encontrou com a mãe, Yeinni Lobo, que foi para os EUA quando o menino tinha onze meses de idade. Ela diz que, desde então, já foi à secretaria da escola pelo menos umas dez vezes, da última, levando consigo as carteiras de vacinação. E conta que já forneceu endereço e o nome do inquilino que recebe o aluguel do imóvel em que vive para comprovar residência – mas agora a escola exige uma declaração do proprietário.

Yeinni encontrou o endereço no registro da propriedade, que fica no tribunal. A carta que enviou pedindo ajuda foi colocada na sua caixa de correio com o aviso "Retorno ao Remetente". Ao dossiê oficial de Carlos foi juntada uma nota em que se lê: "Aguardando declaração do proprietário".

A cidade de Nova York criou programas para ajudar as crianças sem documentos a preencherem formulários e fornece até representação legal, mas na vizinha Long Island, os advogados dizem que estão abarrotados de novos casos.

Cópias de contratos de locação ou de contas de consumo são pré-requisitos comuns para a matrícula escolar, mas os ativistas reclamam que, quando aplicadas às crianças recém-chegadas, essas normas impedem seu acesso à educação.

A superintendente das escolas de Westbury, Mary A. Lagnado, disse que o bairro acomodou os recém-chegados disponibilizando a papelada em espanhol e oferecendo "todas as alternativas possíveis" quando alguma informação não puder ser obtida – e, com isso, já conseguiu matricular 121 alunos a mais que o ano passado.

Porém, em uma cidade sensível à carga fiscal, a rigidez de certos procedimentos é inevitável. Famílias como a de Carlos, que fazem sublocação, têm que fornecer cópia registrada do contrato de locação ou declaração do proprietário, a escritura do imóvel ou contrato da hipoteca e duas contas de consumo.

"Queremos só garantir que as famílias sejam residentes do bairro. Os impostos são muito altos em Long Island. Temos uma responsabilidade grande perante a nossa comunidade", explica ela.

A pressão nas salas de aula, já lotadas, é maior pelo fato de muitas crianças estrangeiras não falarem inglês e terem pouca experiência escolar, afirma Mary. Integrá-las sem nenhum investimento adicional torna a perpétua competição acadêmica com os bairros próximos ainda mais acirrada.

Para os ativistas, os obstáculos às matrículas em Long Island refletem a desconfiança em relação aos novos moradores que existe nas escolas espalhadas pelo país.

O Departamento Federal de Educação recebeu pelo menos 17 reclamações desde 2011, que levaram escolas distritais à justiça; já o Departamento de Justiça teve que avaliar os procedimentos de matrícula de 200 bairros só na Geórgia.

Em Long Island, onde alguns bairros tentaram expulsar alunos sem documentação, em meados dos anos 90, o ressurgimento dos "obstáculos à matrícula das crianças" dificulta a vida dos pequenos, como explica Patrick Young, do Centro de Refugiados Centro-Americano. "Isso só os isola; jamais vão socializar da mesma forma."

Jorge, de 16 anos, que fugiu de El Salvador em 2012, se enfurece com a lembrança de um professor de Educação Física que mandou dois alunos hispânicos atrasados ‘saírem para fazer 50 flexões cada e voltarem só quando fossem residentes’".

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