Estudo analisou coletivas de imprensa de Ronald Reagan; na foto, com George Bush| Foto: Paul Hosefros/The New York Times

Antes mesmo de Ronald Reagan se tornar o homem mais velho a ser eleito para a Presidência dos EUA, seu estado mental era uma questão política. Seus adversários sugeriram várias vezes que sua tendência a dar declarações contraditórias, esquecer nomes e aparentemente se distrair podia ser ligada à demência.

CARREGANDO :)

Em 1980, Reagan me disse que renunciaria à Presidência se os médicos da Casa Branca o avaliassem como mentalmente inapto para o cargo. Anos mais tarde, esses médicos e assessores de Reagan me disseram que não detectaram qualquer mudança em suas capacidades mentais enquanto ele exerceu o cargo.

Agora uma nova análise concluiu que modificações sutis nos padrões de fala de Reagan, ligadas ao advento da demência, manifestaram-se anos antes de os médicos terem diagnosticado o mal de Alzheimer no presidente, em 1994.

Publicidade

Publicadas por pesquisadores da universidade Arizona State no “Journal of Alzheimer’s Disease”, as conclusões sugerem que alterações na fala podem ser usadas para prever o desenvolvimento da doença de Alzheimer e outras condições neurológicas anos antes de os sintomas se tornarem clinicamente perceptíveis.

Especialistas acreditam que tratamentos que ainda não foram desenvolvidos provavelmente serão eficazes para prevenir ou reduzir a progressão da demência, desde que a doença seja detectada antes de ter causado danos cerebrais importantes.

Os métodos usados pelos pesquisadores podem eventualmente ajudar a diferenciar modificações na palavra falada que são associadas ao envelhecimento normal de outras que apontam para a progressão a estágios clínicos do mal de Alzheimer, disse Eric Reiman, diretor do Instituto Banner de Alzheimer, em Phoenix, Arizona, que não participou do estudo.

Visar Berisha e Julie Liss, professores de fonoaudiologia, analisaram transcrições das 46 entrevistas coletivas à imprensa dadas por Reagan para avaliar mudanças em seus padrões de fala, com a ajuda de um algoritmo. Berisha disse que seu objetivo inicial não era estudar Reagan, mas que descobriu que o ex-presidente americano era o único indivíduo com demência progressiva cujos pronunciamentos foram, durante um longo período, transcritos e disponibilizados publicamente.

Os pesquisadores constataram na fala de Reagan que dois fenômenos —o uso de palavras repetitivas e a substituição de substantivos específicos por termos não específicos, como “coisa”— aumentaram perto do final de sua Presidência. Um terceiro fenômeno, o uso de palavras singulares, diminuiu.

Publicidade

Richard Caselli, especialista em Alzheimer da Clínica Mayo, em Scottsdale, Arizona, opinou que, embora o novo estudo seja “muito perspicaz”, são necessárias mais pesquisas, envolvendo um número maior de pessoas, para provar um método que preveja o surgimento de demência.

O declínio cognitivo imperceptível muitas vezes precede em muitos anos a deterioração acelerada que ocorre a partir do momento em que estratégias compensatórias, como o uso de palavras simples e frases bem ensaiadas, fracassam e a pessoa não consegue mais mascarar seu deficit cognitivo.

Berisha quis determinar se algoritmos e o processamento linguístico natural podem ser usados para detectar quaisquer modificações desse tipo em entrevistas coletivas à imprensa, porque respostas espontâneas a perguntas exigem um esforço cognitivo maior que falas previamente ensaiadas. Qualquer dano sofrido em áreas do cérebro que orquestram esses eventos pode gerar dificuldades de fala.

Estudos anteriores mostraram que determinados biomarcadores linguísticos mudam conforme a doença avança.

As dimensões do vocabulário falado diminuem, por exemplo, enquanto cresce o uso de substantivos indefinidos.

Publicidade